Esse artigo foi escrito de forma colaborativa por Bruno Lima, Yair Mau e Marcelo Treistman e não reflete a opinião do Conexão Israel como um todo.
Um dos maiores mitos na narrativa do conflito árabe-israelense é o de que há um genocídio palestino cometido por Israel – uma suposta “limpeza étnica”, como afirmam de forma difamadora. Apesar de não podermos julgar as intenções daqueles que o criaram, podemos definitivamente afirmar que a sua perpetuação é, no melhor dos casos, um ato de ignorância, e muitas vezes pura e simples desonestidade intelectual.
Há cinco aspectos que juntos ajudaram a construir a ideia de que há um genocídio perpetrado por israelenses sobre o povo palestino. O primeiro é legal-jurídico – “Israel comete um genocídio com base nas leis internacionais”. Em relação a esse ponto, nosso colega de Conexão Israel, Claudio Daylac, explica em seu artigo “Análise do direito internacional e das leis da guerra“, porque o termo não se aplica ao que ocorre entre israelenses e palestinos. É uma excelente leitura que rebate em termos jurídicos o argumento de que Israel promove ou possui a intenção de promover um genocídio.
Ainda assim, é importante ressaltar que a disputa pela definição das atitudes de Israel vai muito além da questão conceitual ou terminológica. Em efeito, o termo genocídio é apenas uma representação/síntese de uma ideia que, dependendo das circunstâncias, pode se apresentar como “massacre”, “assassinato sistemático” e outras derivações. Além disso, há uma imensa quantidade de interpretações dadas ao termo genocídio que variam de acordo com a conveniência daquele que o emprega. Portanto, seria um equívoco tornar esse artigo uma discussão sobre terminologias e nomenclaturas – seria interminável e contraproducente. É muito mais frutífero – e por isso optamos por essa direção – desconstruir a ideia que serve de base para toda e qualquer expressão que passe a ideia de que Israel promove uma matança indiscriminada e deliberada de palestinos. Dessa forma, o uso do termo “genocídio” ao longo do texto é inespecífico.
Há quatro outros aspectos que sustentam o mito do “genocídio palestino”. Vejamos quais são eles.
“Israel matou e segue matando deliberadamente milhares de palestinos”
Analisar o número de mortes palestinas requer o entendimento do contexto em que estas ocorreram e da intenção daqueles que as provocaram. Ao longo dos últimos 67 anos, Israel esteve envolvido em guerras e operações militares contra países e grupos que objetivaram (alguns ainda objetivam) a sua destruição. Nessas ofensivas anotaram-se mortes de agressores, terroristas e inocentes civis. Essa é a triste porém real consequência de uma situação de guerra. Portanto, para que entendamos a dimensão do número de mortes no lado palestino é importante esclarecer de antemão que estas não ocorreram de forma deliberada, mas dentro de um contexto marcado pelo conflito.
Para avaliarmos a existência ou não de um “genocídio”, temos que dar base comparativa aos números e colocá-los em perspectiva. É como dizer: “dez é muito”. Em relação a que? Quanto é pouco? Qual é a média? Enfim, a vida, para ser analisada de forma objetiva, deve ser colocada em contexto.
Podemos avaliar a existência de um genocídio com base nas estatíticas tanto de forma absoluta — número de mortos — quanto relativo ao tempo — número de mortos por ano. Para não haver dicussão apresentaremos os dados das duas formas.
Comecemos pelos números de mortos palestinos desde 1948, ano da criação do Estado de Israel. Apesar de haver um intenso debate quanto ao número de vítimas palestinas desde a Guerra de Independência — não há uma clara distinção na literatura entre jordanianos e palestinos até os conflitos mais recentes — tomamos a liberdade de utilizar o mais alto indíce: 30 mil mortos 1. Note que esse é o mais alto número se calcularmos o número de jordanianos e palestinos mortos desde 1948 sem qualquer diferenciação entre os povos. Em uma escala de tempo significa dizer que o Estado de Israel causou a morte de aproximadamente 448 palestinos por ano.
Coloquemos agora os números do “genocídio palestino” em perspectiva. Segue a lista em ordem decrescente — em números absolutos — de algumas das maiores matanças cometidas nos últimos dois séculos.
- Mao-Tsé-Tung (China, 1958-61 e 1966-69, Tibet 1949-50) – 80 milhões de mortos.
- Adolf Hitler (Alemanha, 1939-1945) – 12 milhões de mortos.
- Leopoldo II da Bélgica (Congo, 1886-1908) – 8 milhões de mortos.
- Joseph Stalin (URSS, 1932-1939) – 7 milhões de mortos.
- Hideki Tojo (Japão, 1941-1944) – 5 milhões de mortos.
- Ismail Enver (Império Turco-Otomano,, 1915-1920) – 2.5 milhões de mortos.
- Pol Pot (Cambodia, 1975-79) – 1.7 milhões de mortos.
- Kim Il Sung (Koreia do Norte, 1948-94) – 1.6 milhões de mortos.
- Menghistu (Etiópia, 1975-78) – 1.5 milhões de mortos.
- Yakubu Gowon (Nigéria, 1967-1970) – 1 milhão de mortos.
- Leonid Brezhnev (Afeganistão, 1979-1982) – 900.000 de mortos.
- Jean Kambanda (Ruanda, 1994) – 800.000 de mortos.
- Saddam Hussein (Irã 1980-1990 e Kurdistão 1987-88) – 600.000 de mortos.
- Tito (Iugoslávia, 1945-1980) – 570.000 de mortos.
- Suharto/Soeharto (Indonésia 1965-66) – 500.000 mortos.
- Fumimaro Konoe (Japão, 1937-39) – 500.000 mortos.
- Jonas Savimbi (Angola, 1975-2002) – 400.000 mortos.
- Mullah Omar – Talibã (Afeganistão, 1986-2001) – 400.000 mortos.
- Ante Pavelic (Croácia, 1941-45) – 359.000 mortos.
- Idi Amin (Uganda, 1969-1979) – 300.000 mortos.
- Yahya Khan (Paquistão, Bangladesh 1970-71) – 300.000 mortos.
- Benito Mussolini (Etiópia, 1936; Líbia, 1934-45; Iugoslávia, 1939-1945) – 300.000 mortos.
- Charles Taylor (Libéria, 1989-1996) – 220,000 mortos.
- Foday Sankoh (Serra Leoa, 1991-2000) – 200,000 mortos.
- Suharto (Achém, Timor Leste, Nova Guiné, 1975-98) – 200,000 mortos. 2
Não perdamos de vista os números absolutos do “genocídio palestino” – que estipulamos a título referencial no exagerado número de 30 mil mortos. Não é possível saber ao certo em que posição Israel entraria na lista acima, mas seria plausível supor que não estaria nem entre os 100 primeiros.
De qualquer forma, vejamos agora o número de mortes por ano:
Para entendermos proporcionalmente, coloquemos todas as mortes em genocídios do mundo em um só gráfico e vejamos onde Israel se encontra.
Como podemos observar, há inúmeros conflitos (não concebidos como genocídio) antes de chegarmos tanto nos 30 mil palestinos mortos desde 1948, quanto na média de 448 vítimas anuais. Aliás, se utilizássemos apenas a média anual, não haveria qualquer razão para escrever um artigo como esse —a taxa anual de 448 mortes palestinas (um povo em conflito com Israel) é tão baixa que chega a ser menor do que o número de mortes provocadas por perseguição governamental presente em quase todos os países árabes, que o número de vítimas na guerra civil síria, no combate ao crime nos Estados Unidos, no Brasil e em outros muitos países. Isso sem contar os conflitos em curso na África.
“Israel promove uma limpeza étnica”
Quem utiliza esse argumento deve estar preparado para responder objetivamente a uma pergunta singela: “Como Israel pode promover uma limpeza étnica se a população palestina cresce a uma taxa de 2.9% ao ano?”
Isto significa que, mantendo-se a taxa atual, a população palestina duplicará em apenas 24 anos. Levando-se em conta apenas a população de Gaza (crescimento de 3.4% por ano), a duplicação levaria apenas 20 anos. Comparemos com o Brasil, que cresce 0.9% ao ano (77 anos para duplicar). 3
Como pode um país que sofre ou sofreu um genocídio ter uma taxa de natalidade positiva? Em Gaza, vivem cerca de 1.8 milhão de pessoas. Crianças abaixo de 14 anos representam 45% da população. A taxa de fecundidade é de 4.18 filhos por mulher. 4
Enfim, o ponto está claro — é mais razoável acreditar em Papai Noel do que em uma limpeza étnica. A explosão demográfica palestina não dá base para tal argumento.
“O genocídio deve ser entendido com base no tamanho populacional”
Estima-se que em 1948 havia 1.3 milhão de muçulmanos e cristãos que viviam sob o mandato britânico. Hoje, são mais de 6 milhões de palestinos que vivem entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo (Gaza, Cisjordânia e árabes israelenses).
Se todas as 30 mil pessoas (são menos) tivessem sido mortas ao mesmo tempo (não foram), isto daria 2.3% (30 mil por 1.3 milhão) e 0.5% (30 mil por 6 milhões) da população palestina de 1948 e 2015, respectivamente. Comparemos estes números com alguns genocídios perpetrados no século 20:
Holocausto: 6 milhões de judeus, 78% dos judeus europeus.
Genocídio armênio: 1.5 milhão, 75% dos armênios do Império Otomano.
Genocídio cambojano: entre 1.7 e 3 milhões, de 25% a 33% da população total do Camboja.
Genocídio em Ruanda: entre 0.5 e 1 milhão, 70% da população tutsi. 5
Novamente, os números – quando colocados em perspectiva e analisados de forma objetiva – não corroboram com o mito do “genocídio palestino”. Considere também (apenas como exercício de pensamento) a seguinte questão: Na Guerra de Independência de Israel (1948–49) morreram cerca de 6 mil judeus, um porcento da população judaica local. Houve genocídio por parte dos exércitos árabes contra o povo judeu?
“Israel quer aniquilar o povo palestino”
Esse último aspecto se refere principalmente ao argumento de que “Israel tenta (tem a intenção de) promover um massacre de palestinos, mas não consegue”. Essa ideia é de fácil desconstrução e exige apenas um pouco de lógica.
Israel tem um dos exército mais equipados e desenvolvidos do mundo. Portanto, se o país tivesse a intenção de exterminar o povo palestino, não tardaria a ocorrer. No entanto, como vimos, a taxa de natalidade palestina segue alta e o número de vítimas desde 1948 é relativamente baixo. Diante dessa conjuntura há duas plausíveis conclusões: ou o exército de Israel é um dos mais incompetentes da história da humanidade ou definitivamente nunca houve intenção em promover um genocídio palestino. Como a primeira é pouco razoável, só nos resta crer na segunda. A lógica — em sua forma mais simples — se estrutura da seguinte maneira:
Israel tem a capacidade de matar todo o povo palestino.
O povo palestino segue tendo uma alta taxa de natalidade e apenas uma mínima parte do povo palestino morreu em decorrência do conflito com Israel durante os últimos 67 anos.
Logo, Israel não utiliza sua capacidade de matar todo o povo palestino.
Se Israel não utiliza sua capacidade de matar todos os palestinos, pode-se deduzir que ele não tem e nunca teve a intenção para tal.
Conclusão
A criação de mitos é uma constante no jogo político. Não apenas entre aqueles que se encontram na esfera de poder, mas também entre militantes que visam disseminar falsas representações da realidade para justificar a posição de seus partidos. Mitos políticos são eficientes recursos que tem como objetivo produzir padrões de pensamento, definir bandeiras ideológicas e determinar o comportamento social.
O mito é, no entanto, apenas uma história – esse é o seu significado etimológico do grego mythos. O problema é que nós, seres humanos, somos sedentos por essas histórias, afinal elas nos ajudam a descrever a realidade, preenchendo o insuportável espaço que a dúvida e a incerteza criam. Em efeito, os mitos nos confortam e nos permitem dar fluxo a vida – são mentiras ou meias-verdades que estabelecemos para tornar possível a vida em sociedade.
Ainda assim, não podemos lidar com um mito como se fosse um fato. É responsabilidade nossa entendê-lo e desconstruí-lo sempre que possível. Israel tem, sem dúvida, muito a fazer em relação ao conflito com os palestinos, mas isso não justifica a perpetuação da ideia de que há ou houve qualquer tentativa de genocídio ou massacre palestino. Agora você já sabe porque.
Fonte: conexaoisrael.org
Notes:
- O cálculo foi feito com base nos números publicados no wikipédia e considera todas as vítimas palestinas e jordanianas – sem qualquer diferenciação – entre os anos 1948 e 2015.
- Fonte: http://www.scaruffi.com/politics/dictat.html
- Fonte: http://data.worldbank.org/indicator/SP.POP.GROW
- Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Demographics_of_the_Palestinian_territories#Demographics_of_the_Gaza_Strip
- Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_genocides_by_death_toll
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