sábado, setembro 30, 2017

Sociologia do jornalismo




O episódio do MAM e as criaturas que infestam as redações.
por Cristian Derosa(*).






Comentário do autor, Cristian Derosa:
A “performance” apresentada no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) que expôs um homem nu à apreciação de crianças e adolescentes gerou protestos, mas a jornalista Rita Lisauskas, do Estadão, reagiu, no Twitter, com ironia à justa indignação do público. Em sua mente “jornalisticamente correta”, soa absurdo que alguém tente “cercear” uma “livre expressão”, mesmo que seja criminosa ou pedófila, pelo simples fato dessas expressões representarem, para o meio jornalístico do qual ela faz parte, a mais excelsa e intocável arte. Certamente, para ela, toda a sociedade deve aceitar, em silêncio, abusos de crianças em museus e escolas e o grande vilão que a sua mente jornalística consegue visualizar é o MBL (Movimento Brasil Livre), o maior grau de conservadorismo que ela consegue perceber.

Rita Lisauskas é apenas mais um exemplo, entre centenas de jornalistas, do que aponto no presente artigo.


Redações em espiral: a sociologia do jornalismo

Em uma época em que o reforço psicológico e a auto-afirmação fazem as vezes de valores morais, não há maior apóstolo da credibilidade jornalística do que o próprio jornalista. Ele é, portanto, a vítima mais indefesa e mais submetida às forças psicológicas que se distribuem pela sociedade contemporânea. E, portanto, a quem menos se deve dar crédito.


Toda a vida moderna gira em torno da socialização, do afago a egos cada vez mais sedentos de confirmação, a autoimagens hiper-sensíveis e à beira do pânico diante da possibilidade de rejeições e do medo do isolamento, que representaria a morte social. O autoengano, neste sentido, torna-se uma prática diária de sobrevivência.

O sociólogo David Riesman diagnosticou esse fenômeno em sua obra A multidão solitária, publicado na década de 1950, no qual destacava a ascensão de um novo caráter social que chamou de alterdirigido, isto é, dirigido pelo outro. Desde a época das suas primeiras observações a respeito, o foco no ambiente social aumentou drasticamente. Hoje, ninguém pode estar totalmente imune ao juízo público. Nas palavras da politóloga Elisabeth Noelle-Neumann, quem mostra-se indiferente à opinião pública é ou um louco ou um santo.

Se estamos todos individualmente submetidos a essa pressão latente, um dos principais veículos responsáveis por disseminar a homogeneização das opiniões e crenças é a grande mídia, representada especificamente pelos meios noticiosos ou pretensamente informativos. Esses meios possuem, eles próprios, um ambiente no qual são produzidas as informações como atividade profissional, mas também social. Assim como nas ruas, nas repartições, no ponto de ônibus, na fila do banco ou no caixa do supermercado, as redações dos jornais fornecem um ambiente social especialmente fértil à transmissão de comportamentos e condutas imitativas. O jornalista está sujeito às mesmas forças que o restante da opinião pública, mas carrega consigo muito mais motivos para depositar credibilidade no seu próprio trabalho, pelas mesmas razões psicológicas presentes no restante da sociedade: a auto-afirmação, o desejo mimético de pertencimento à classe dos informadores e a solidariedade da categoria. Mas há algo mais.



Universidade: onde tudo começa
Formado por pessoas oriundas das universidades, locais em que hoje vigora o vício em álcool, drogas como maconha e opiniões superficiais, o jornalista chega à redação com crenças tanto mais firmes e convictas quanto menos fundamentadas em fatos ou experiências. O ambiente universitário, especificamente o do jornalismo, fundamenta-se na disseminação de uma imagem de sociedade que independe de experiências ou vivências reais. Pelo contrário: toda experiência real deve, por força e pressão do pertencimento à nova classe, ser moldada e ressignificada dentro das categorias presentes na imagem ideológica de sociedade que foi aprendida em sala de aula. E a força persuasiva dessa imagem não está de forma alguma na força dos seus postulados, no rigor da observação, tampouco na credibilidade intelectual ou pessoal do professor. A maior força de persuasão está no próprio compartilhamento das crenças pelos membros do grupo, uma vez que isso fortalece, não a crença ou conjunto de crenças em si mesmos, mas o pertencimento do indivíduo àquela comunidade pretensamente pensante.
“O mundo é governado pela opinião”.
Gravura publicada em 1641, representando a opinião pública regada
 pelos jornais, comandada pelo governante.


O fator catalisador das ideias e opções ideológicas e idealistas está, sem sombra de dúvida, na permanente e onipresente socialização a que o estudante universitário se vê submetido desde a entrada às portas daquilo que crê ser o “templo do conhecimento”. Hoje as universidades estão rodeadas de bares e cervejarias, bem o contrário do que um ingênuo observador poderia supor ao imaginar um campus circundado por livrarias, cafés e museus. A vida universitária de nossas cidades foi, já há algumas décadas, reduzida àquilo que antes era reservado aos estratos mais baixos da vida urbana, às periferias não apenas geográficas, mas morais. O mundo ordinário do estudante há muito deixou de ser o das letras e das artes para precipitar-se à mais baixa escala de existência. Uma mudança desse tipo, de graves consequências para milhares de vidas individuais, não pode ser esquecido quando tentamos compreender o conteúdo abjeto de notícias advogando em favor de crimes como pedofilia, uso de drogas e assassinatos. Também não nos deve impressionar uma decadência desse tipo.

Cada vez mais estudos apontam para uma verdadeira epidemia de depressão e ansiedade em estudantes universitários. Até mesmo casos de esquizofrenia e surtos psicóticos não são raros. A exposição a drogas e socialização constante produz evidentemente um aumento nos níveis de ansiedade e demandas maiores por atividade social, o que no meio universitário é facilmente confundido com estudo, atividade social, ativismo e uma gama de coisas vistas hoje somente em seu caráter positivo.

A redação
Chegada a formatura, o jornalista recém formado se crê no direito de ser contratado pelos jornais proeminentes e, tão logo o consiga, sabe que tem o dever de transformar a sociedade naquilo que seus professores o ensinaram. Mas, chegado ao ambiente social da redação, tudo muda. Até mesmo o idealismo universitário pode ser deixado de lado em nome da adaptação social ao novo grupo. O chefe, o colega, os “famosos” da redação, os exemplos dos quais todos falam, aquele repórter premiado que passa na redação distribuindo brincadeiras íntimas sem, no entanto, aceitar muita proximidade. O recém chegado adoraria ser amigo dele. Eis o objetivo profissional inicial e imediato. Tão logo se tornar aceito e integrante daquelas brincadeiras, será notado pelo editor-chefe. Este é o critério inicial e a demora ou incapacidade de perceber isso pode representar a ruína ou o ostracismo editorial: ser relegado à diagramação ou a algum outro setor já previamente estigmatizado como depósito de inúteis sociais. O inútil social é alguém que não foi capaz de conquistar o sorriso do chefe (ou dos colegas que o fizeram) ou não atraiu para si qualquer interesse ou simpatia, o que indicaria a submissão às ordens dadas sempre em tom de confiança. Ordens estas que significam obviamente opções muito claras em direção a políticas editoriais vindas de cima.

Em suma: todos precisam demonstrar afabilidade e flexibilidade extremas, que beiram o puxa-saquismo e a tolerância com humilhações, para comprovar a sua utilidade a um sistema de obediência absurdamente rígido, mas que aparenta ser apenas um jogo social necessário ou inevitável.

O problema por trás do que chamamos muito genericamente de “militância esquerdista nas redações”, não é uma questão ideológica. O que viabiliza toda a transmissão de ideias é, na verdade, a submissão psicológica, a dependência social em que indivíduos são cooptados não em nome de ideais, mas da sua sobrevivência social e profissional. Uma minoria dos jornalistas e repórteres possuem crenças fixas e convictas. A grande massa disforme de profissionais está apenas sujeita a uma rede de ameaças emocionais que forma um sistema psicótico de produção de histéricos em série. Nada disso pode ser possível sem aquela dependência longamente construída na universidade, regada a muito álcool, drogas e uma vida moral pautada pela imitação de comportamentos, incrementos à hipersensibilização, distanciamento da realidade e confusão entre realidade e mundo social abstrato.



Fonte: Midiasemmascara.org

sexta-feira, setembro 29, 2017

NKVD: Assassinos chefiados por Stalin têm seus nomes divulgados




por Luis Dufaur(*).




A partir de 1993, Andrei Zhukov percorreu, pelo menos três dias por semana durante duas décadas, os arquivos de Moscou, vasculhando hora após hora as pilhas de ordens emanadas pela NKVD, a polícia secreta de Joseph Stalin, continuada pela KGB onde se formou Vladimir Putin.

Ele procurou e encontrou muitos nomes de oficiais e seus respectivos cargos hierárquicos na organização.

Foi a primeira pesquisa metódica sobre os homens que executaram o “Grande Terror” de Stalin entre 1937 e 1938.

Nesse período da ditadura socialista foram presas pelos menos 1,5 milhão de pessoas, 700 mil das quais foram friamente fuziladas.

Na verdade, não foi o primeiro estudo sobre os líderes da NKVD e seus monstruosos crimes. Mas sim o primeiro a identificar os investigadores e os algozes que cumpriram a sádica missão.

E na lista há mais de 40 mil nomes!

Zhukov disse que não agiu por motivações políticas:

“Eu sempre fiquei interessado em coisas secretas ou difíceis de achar.”

“Comecei isto apenas com um instinto de colecionador”, disse, segundo o jornal The Guardian, de Londres.”

Mas os historiadores perceberam a importância de seu trabalho.

A organização Memorial, a mais importante em recuperar a lembrança das vítimas chacinadas e dos locais de horror onde passaram seus últimos dias, publicou um CD com o banco de dados dos nomes e o postou na Internet.

Foram anos de meticuloso trabalho porque a polícia secreta tinha uma ampla faixa de atividades além das prisões e execuções.

“Não todos na lista foram açougueiros, até alguns foram assassinados por não executarem os crimes ordenados.

“Mas a vasta maioria estava ligada ao terror”, comentou Yan Rachinsky, co-presidente de Memorial.

Nikita Petrov, outro historiador de Memorial, sublinhou que “trabalhar na NKVD era prestigioso.
Vala comum de vítimas de Stalin em Levashovo, São Petersburgo.
Muitos russos querem saber o destino final de seus antepassados.

“Nos inícios dos anos 1930, marcados pela pobreza e pela fome, recebia-se para comer bem e ganhava-se um belo uniforme.

“Aqueles que entravam não sabiam que dentro de cinco anos estariam sentenciando milhares de pessoas à morte”, acrescentou.

O banco de dados de Memorial sobre as vítimas da repressão socialista soviética contém por volta de 2.700.000 nomes e mais 600 mil devem ser acrescentados ao longo de 2017.

Rachinsky acha que uma lista completa somaria aproximadamente 12 milhões de nomes, incluindo os deportados ou sentenciados por razões políticas.

Acrescenta-se que em algumas regiões os algozes locais nunca confeccionaram listagens das vítimas, enquanto em outras os arquivos permanecem fechados.

O jornalista Sergey Parkhomenko lançou a campanha Endereço Final, instalando alguns milhares de placas onde morreram vítimas do socialismo stalinista para lhes render uma derradeira homenagem.

Grupo de Agentes da NKVD


Dos 40 mil agentes registrados por Zhukov, cerca de 10% acabaram sendo executados, encarcerados ou enviados aos campos de concentração.

Alguns voltaram quando Stalin precisou de homens para combater na II Guerra Mundial. Até ganharam medalhas ou se dedicaram a cometer mais homicídios.

Fonte: midiasemmascara.org
(*)Luis Dufaur é editor do Blog Flagelo Russo



Comunismo = Morte! O genocídio dos 
Ucranianos pelos Comunistas

Josef Stalin - Dez Vezes Pior que Hitler - Tirano 
Sanguinolento e Psicopata - Historia

quinta-feira, setembro 28, 2017

Funciona bem, agrada aos consumidores e não é regulado? O governo tem de proibir












por Jeffrey Tucker(*).




Nota do editor: o artigo abaixo foi originalmente publicado no dia 19 de abril de 2017. Todavia as novas tentativas de Regulamentação por parte de Parlamentares fazem com que o artigo volte a ser publicado



Faz poucos anos que estamos vivenciando o surgimento de uma nova e inesperada forma de liberdade de mercado.

Em nosso mercado extremamente regulado, estático e burocratizado, amarrado por calhamaços de regras e imposições governamentais, algo belo e inovador surgiu. Por vezes chamada de "economia digital" ou "economia compartilhada", mas também chamada pejorativamente de "economia freelancer" ou mesmo "economia dos bicos", trata-se de um arranjo puramente voluntário em que aplicativos de smartphone são utilizados para conectar diretamente produtores e consumidores.

Este arranjo conseguiu fazer com que bilhões em recursos físicos e humanos até então ociosos fossem repentinamente transformados em ativos geradores de riqueza, trazendo grande satisfação ao consumidor. E, inevitavelmente, gerando grande insatisfação para governos e sindicatos protegidos por eles.

A principal empresa deste setor é a Uber, que oferece um serviço — em nível global — de transporte de passageiros que concorre com os taxis. Por meio de seu aplicativo, qualquer pessoa comum pode transformar seu bem de consumo (automóvel, que não gera renda) em um bem de capital (que gera renda e aumenta a riqueza). A Uber faz com que aquele indivíduo que normalmente utilizaria seu carro apenas para uso pessoal possa agora utilizá-lo de modo a ganhar dinheiro: prestando serviços para consumidores. A Uber transforma um bem de consumo básico (um carro) em um bem de capital (um instrumento que gera renda e aumenta a riqueza).

Em sua folha de pagamento, a empresa possui apenas 7.000 funcionários fixos (que são aqueles que trabalham nas instalações físicas da empresa), mas ela concede poder a milhões de motoristas e passageiros.

Assim como a Uber, há milhares de outros aplicativos, tanto no setor de caronas (Cabify, Lyft etc.) quanto em várias outras áreas, como AirBnb (que concorre com as grandes redes hoteleiras), Instacart (serviço que entrega compras de supermercado em casa em uma hora), Handy (que faz serviços de faxina e afazeres domésticos sob demanda), Kiva e Give Well (pelos quais você respectivamente empresta e doa dinheiro aos pobres dos lugares mais pobres do mundo), Kickstarter e Indiegogo (pelos quais você pode tanto financiar empresas ao redor do mundo como também pode ser financiado, driblando todo o sistema bancário controlado e regulado pelo estado), e OpenBazaar (pelo qual qualquer indivíduo de qualquer lugar do mundo pode virar empreendedor, sem ter de depender de permissões do governo).

Essas criações são incrivelmente animadoras. Oportunidades econômicas estão sendo criadas e disponibilizadas para milhões de pessoas, e tais mercados realmente representam uma esperança para o futuro.

A grade ironia é que estes aplicativos estão entregando o controle do capital aos próprios trabalhadores, exatamente como os socialistas dizem que deveria ser. Os aplicativos geraram uma mudança nas relações de produção, permitindo que cada vez mais indivíduos se tornassem proprietários dos meios de produção em vez de ter de trabalhar para terceiros que detêm todo o capital físico necessário para fazer seu trabalho. Mas tudo isso esta acontecendo por meio de um processo capitalista.

(Sim, a Uber é a proprietária da plataforma do software que torna possível a conexão entre vendedores (motoristas) e compradores, mas os motoristas da Uber detêm seu próprio capital. Eles são livres para escolher os dias e as horas em que querem trabalhar.)

Seria de se imaginar que o surgimento deste tipo mercado — totalmente voluntário — fosse aclamado com um grande e universal entusiasmo, principalmente pela esquerda progressista. Mas, obviamente, nenhuma criação tão inovadora quanto essa é recebida com aplausos ubíquos.

O jornal The New York Times, o grande bastião da esquerda chique, arrogou par si a tarefa de liderar violentos ataques àquilo que ele chama de "economia dos bicos". A escrita do jornal segue todas as características do gênero: encontre algo que funciona e que ainda não está regulado, e exija que o governo faça algo imediatamente. Encontre algum setor que está em processo de melhorias, e trate-o como algo que o governo deve esmagar incontinenti. Pouco importa se os consumidores deste serviço o aprovam e querem que ele continue.

Um editorial tão ruim quanto este merece uma resposta detalhada:


Não há utopia em empresas como Uber, Lyft, Instacart e Handy. Seus trabalhadores são frequentemente manipulados a trabalhar longas jornadas em troca de baixos salários, ao mesmo tempo em que estão continuamente à procura de novas corridas e tarefas.

"Utopia" é um padrão muito alto contra o qual comparar qualquer realidade existente. Qualquer coisa que seja comparada a uma utopia irá necessariamente perder. O editorial, portanto, já começa com um erro básico de lógica.

Adicionalmente, é o ápice da presunção e arrogância presumir que indivíduos estão sendo "manipulados" pelo fato de terem escolhido trabalhar duro. Várias pessoas, inclusive jornalistas, apenas almejam o sucesso por meio do trabalho.


Estas empresas descobriram que podem transformar modernidades e evoluções tecnológicas em antiquadas explorações trabalhistas — de acordo com várias evidências —, pois seus empregados não usufruem os mesmos direitos trabalhistas que o resto da população.

Imagine um motorista da Uber que, sentado no sofá de sua casa assistindo à Netflix por horas seguidas, repentinamente constata: "Eu poderia estar ganhando dinheiro transportando pessoas pela cidade, conversando cordialmente com elas, satisfazendo seus desejos, e até mesmo levando bêbados para casa em segurança. Vou fazer isso!" E então ele se levanta do sofá e vai trabalhar. (Motorista da Uber trabalha quando quer).

É isso que o The New York Times chama de "exploração trabalhista"


Os trabalhadores dessa "economia dos bicos" tendem a ser mais pobres e são majoritariamente formados por minorias. ... A maioria disse que o dinheiro que ganham com seu trabalho foi essencial para suas famílias.

O Times está condenando a solução e dizendo que ela é, na verdade, um problema. Pessoas mais pobres e que precisam de uma segunda fonte de renda agora têm uma, graças à economia digital. Será que tais pessoas estariam em melhor situação sem esta oportunidade? (Sim, estou constrangido em ter de recorrer a argumentos tão básicos, mas estou apenas mantendo o mesmo nível do The New York Times).


Dado que os trabalhadores destas empresas que atuam na economia digital são considerados prestadores de serviços autônomos e independentes, e não empregados fixos, eles não usufruem proteções básicas, como salário mínimo, [encargos sociais e trabalhistas, no caso do Brasil], e adicional de horas extras. Isso ajudou a Uber, que surgiu em 2009 e rapidamente chegou a 700.000 motoristas cadastrados e ativos apenas nos EUA. Isso é praticamente o triplo do número de taxistas e motoristas particulares que havia no país em 2014.

Que a Uber tenha crescido tão rápido sob este arranjo é um fenômeno particularmente elucidativo. O mercado de trabalho convencional não mais está funcionando exatamente por causa destas "proteções básicas" que, na realidade, representam fardos onerosos que não ajudam nem os patrões e nem os empregados.

Tais regulações conseguem apenas diminuir a concorrência em cada setor, restringindo tanto o número de novos empreendedores quanto o de novos empregados. Mas funcionam como uma ótima reserva de mercado para quem já está estabelecido.

O sucesso da economia digital é a prova inconteste de que o mercado — ou seja, o público consumidor — está implorando por menos obstáculos e por fardos menos onerosos. Quando você obtém sucesso operando sob regime concorrencial, isso é uma evidência de que você está fazendo bem feito (de novo, peço desculpas ao leitor por ser obrigado a falar obviedades).


Em número crescente, trabalhadores e agências reguladoras do governo estão reagindo.

Acione o seu decodificador: na frase acima, o termo "trabalhadores" significa "sindicatos", cujo único interesse é fechar o mercado de trabalho em benefício próprio e à custa de todos os outros trabalhadores não-sindicalizados. Sindicatos cartelizam o mercado de trabalho ao estipular valores salariais mínimos para suas respectivas profissões, proibindo todos os não-sindicalizados de trabalhar por valores menores do que o estipulado pelo sindicato. (Pela terceira vez, peço desculpas por ter de repetir obviedades).

Quanto às agências reguladoras do governo, é óbvio que elas estão preparadas e ávidas para destruir qualquer coisa que prospere no mercado sem sua permissão. É para isso que elas existem. Este sempre foi o seu histórico.


Porém, até o momento, a experiência com estas empresas mostra que, sem as proteções legais e as normas éticas que outrora eram amplamente aceitas, os trabalhadores descobrirão que a economia do futuro será um lugar ainda mais inóspito.

Olha só: se o Times está dizendo que Uber, Lyft, Instacart, Handy e todas as milhares de outras empresas da economia compartilhada irão se dar mal no mercado e serão substituídas por algo diferente, ótimo. Deixe o mercado (os consumidores) determinar os ganhadores e os perdedores. Se os trabalhadores encontrarem opções melhores, eles irão naturalmente em direção a elas.

No entanto, e até o momento, tudo indica que o campo gravitacional tanto no mercado de trabalho quanto no mercado consumidor está indo para a direção oposta: para arranjos que transferem direitos de propriedade e de escolha para os trabalhadores, e contornando barreiras governamentais.

O mercado já está falando, gritando, berrando: vamos tentar algo diferente.

O que a mídia progressista está realmente exigindo é que haja mais decretos e regulamentações que esmaguem empresas inovadoras. Não podemos deixar que isso seja bem-sucedido.

Conclusão

Há um motivo por que as inovações quase sempre se concentram nos setores de alta tecnologia: este é um setor (ainda) relativamente pouco regulado. Burocratas, por definição, são lentos e tendem à inércia. Eles não conseguem criar regulações na mesma velocidade que o mercado cria inovações. Havendo pouca regulação, há poucas barreiras artificiais ao empreendedorismo, aos investimentos e às descobertas. O grande beneficiado acaba sendo o consumidor.

Já os outros setores da economia — mais antigos e, por isso, mais regulados — seguem engessados. Raramente surgirão inovações dali. O estado impede.

Toda a nossa esperança de uma contínua melhoria em nosso bem-estar virá do setor tecnológico. E é este que o estado agora quer regular com mais intensidade. Burocratas podem não ser rápidos o bastante para perceber o que realmente está acontecendo em termos de evolução tecnológica; mas, eventualmente, eles podem recorrer ao poder da caneta tentar abolir tudo. Eles detêm todo o poder destruidor do governo.

É imperativo oferecermos resistência.



Nota do IMB (de Adriano Gianturco)

No Brasil, nos últimos 3 anos, a economia piorou, o desemprego aumentou, a dívida pública disparou, e os preços subiram quase 30%. No setor de transportes, os preços das passagens de avião subiram, o número de voos diminuiu (a oferta de vôos voltou ao patamar de 2010) e a passagem de ônibus aumentou. Tudo piorou e encareceu.

As únicas coisas que melhoraram, e muito, foram a sua mobilidade e a sua liberdade de escolha, graças a Uber e Cabify. E os preços caíram. Hoje, você se locomove nas grandes cidades pagando bem menos do que pagava há 3 anos (mesmo com a inflação de preços chegando a quase 30% neste período).

O que então o estado decidiu fazer? A única coisa que ele sabe fazer: usar seu poder destrutivo para tentar abolir esta melhoria e, com isso, piorar a nossa vida. Querem agora proibir Uber e Cabify.


quarta-feira, setembro 27, 2017

O que é Direito e Privilégio








por Lawrence W.Reed (*).



Você sabe definir o que seria um direito? E um privilégio?

Não é um direito aquilo que duas pessoas não podem ter ao mesmo tempo


"Eu tenho esse direito!"

Várias pessoas fazem essa afirmação sem nem sequer pensar na natureza e na fonte dos direitos. O que são direitos? De onde eles vêm?

A visão progressista ou intervencionista diz que, desde que a legislação seja criada de acordo com as regras do devido processo legal, o governo tem o poder de criar e extinguir direitos. 

Por exemplo, o governo pode, por meio dos votos do legislativo, criar ou extinguir o direito a um emprego, a uma educação "gratuita", a um tratamento de saúde "gratuito", ou até mesmo a receber comida "de graça".

Quando os progressistas querem expandir os tentáculos do governo, eles frequentemente inventam uma distinção bastante peculiar entre "privilégio" e "direito". De acordo com eles, está ocorrendo um privilégio quando uma pessoa pode adquirir um bem ou serviço por meio de suas próprias posses; já quando o governo usa o dinheiro de impostos ou outros poderes coercitivos para fornecer esse bem ou serviço para indivíduos, independentemente de quais sejam as posses desses indivíduos, isso seria apenas um direito.

Coisas realmente importantes, dizem os progressistas, devem ser direitos, e não privilégios. Por exemplo, acesso a serviços de saúde já foi um privilégio, mas agora é louvado, tanto na retórica quanto na lei, como um direito. O mesmo é dito sobre educação e moradia.

O que realmente são direitos

De fato, a natureza dotou os seres humanos de alguns direitos. Tais direitos são chamados de "direitos naturais" — isto é, direitos que são inerentes à natureza humana; direitos que todos nós como seres humanos usufruímos pela simples virtude de sermos humanos. 

Esses direitos não podem ser negados, pois, se isso ocorrer, a pessoa que os nega estará caindo em contradição, pois estará negando sua própria condição de ser humano. 

Esses direitos naturais, por essa sua natureza, são logicamente anteriores à existência do governo. Caso estivéssemos em um mundo sem nenhum governo, ainda assim tais direitos existiriam. Eles não dependem de nenhum governo para existir. E o governo não tem nenhuma autoridade legítima para acrescentar ou subtrair direitos. No máximo, ele pode apenas protegê-los.

Se quisermos avaliar se um determinado direito, um suposto direito, é de fato um direito genuinamente válido, então é necessário fazermos um teste crítico e logicamente irrefutável, a saber: todos nós temos de ser capazes de usufruir esse mesmo direito, ao mesmo tempo e da mesma maneira.

Apenas assim esse direito pode ser natural, ou seja, inerente ao fato de sermos humanos.

A obviedade dessa afirmação vem do fato de que, para um direito ser natural, seu usufruto não pode levar a nenhum conflito ou a nenhuma contradição lógica.

Se algo é um direito natural, então ele se aplica a todos os indivíduos simplesmente pela virtude de serem humanos. Se uma pessoa tem um determinado direito, então todos os outros seres humanos devem logicamente ter esse mesmo direito. Não pode haver conflito. Um indivíduo não pode, sem cair em contradição, alegar que possui um direito humano e, ao mesmo tempo, negar esse direito para terceiros. Fazer isso seria o equivalente a admitir que esse direito não é realmente um direito "humano", mas, aí sim, um privilégio.

Adicionalmente, tem de ser possível que todos os indivíduos possam usufruir esse suposto direito simultaneamente, sem nenhuma contradição lógica. Se, quando eu exerço um direito que alego possuir, estou fazendo com que seja impossível outra pessoa exercer esse mesmo direito ao mesmo tempo, então minha ação implica que este suposto direito não é inerente à natureza humana. Minha ação implica que tal direito é apenas meu, e não de outra pessoa.

Exemplos práticos

Suponha que eu alegue ter o direito de receber serviços de saúde ou de educação gratuitos.

Se tal alegação significa que eu terei acesso a estes serviços sempre que eu quiser ou necessitar (e o que mais ela significaria?), então tem de haver outra pessoa com o dever de me fornecer estes serviços. Ou então, ainda mais realisticamente, tem de haver outra pessoa com o dever de pagar para que eu receba estes serviços.

Médicos e professores não trabalham de graça. E nem deveriam. Logo, se eu quero que eles me forneçam serviços gratuitos, então uma terceira pessoa tem de ter sua renda (propriedade) confiscada para bancar os serviços destes médicos e professores.

E aí começa a contradição: essa outra pessoa não mais tem o mesmo direito que eu tenho. Meu direito é receber serviços gratuitos; o "direito" dela é me fornecer — ou financiar — estes serviços. Meu direito criou um dever para essa pessoa: ela agora é obrigada a efetuar uma ação que ela não necessariamente queria efetuar. Embora nós dois sejamos humanos, a liberdade de escolha dessa pessoa foi subordinada à minha liberdade de escolha. Aquele direito que concedi a mim (saúde e educação gratuitos) está sendo negado a esta outra pessoa, pois ela, ao ficar com o fardo de pagar pela minha saúde e educação, perdeu seu "direito" à educação e saúde gratuitos.

Para que eu adquirisse um direito, essa pessoa teve de arcar com uma obrigação.

Pior ainda: ela teve sua propriedade espoliada, o que seria uma flagrante agressão ao seu direito de propriedade.

Aplique esse mesmo raciocínio a coisas como moradia, transporte, alimentação, lazer, seguro-desemprego etc. Ao dizer que você tem o direito de usufruir estes bens e serviços gratuitamente, você está necessariamente dizendo que terceiros têm a obrigação de fornecer (ou financiar) tais coisas a você.

Você pode acreditar que tem o direito à moradia, mas você não tem o direito de obrigar terceiros a pagar por sua moradia.

Você pode acreditar que tem o direito ao transporte gratuito, mas você não tem o direito de obrigar terceiros a pagar pela sua locomoção.

Você pode acreditar que tem o direito ao lazer, mas você não tem o direito de obrigar terceiros a bancar — ou subsidiar — o seu lazer.

Você pode acreditar que tem o direito à saúde, mas você não tem o direito de obrigar terceiros a pagar pelos seus serviços de saúde.

Você pode acreditar que tem o direito à educação, mas você não tem o direito de obrigar terceiros a pagar pela sua escola ou faculdade.

Todos esses "direitos" exigem que haja uma transferência forçada de recursos (propriedade) de alguns pagadores de impostos para outros cidadãos.

Nenhum desses "direitos" configura um direito humano. Dado que eles significam que indivíduos irão receber saúde, educação, moradia, comida e lazer independentemente do desejo das outras pessoas, então eles não representam direitos humanos fundamentais. 

Todos nós temos o direito fundamental de nos oferecermos para comprar ou vender serviços de saúde, educação, moradia, comida e lazer nos termos que quisermos; porém, se não encontrarmos terceiros dispostos a aceitar nossas ofertas, então não temos o direito de forçá-los a aceitá-las.

Outros direitos

O mesmo raciocínio pode ser aplicado aos seguintes direitos: liberdade religiosa, liberdade de associação, liberdade de expressão, e liberdade de imprensa. 

Todos estes, por si sós, são direitos genuínos e naturais, mas somente quando não configuram agressão a terceiros.

Cada um de nós pode exercitar nosso livre arbítrio em termos de religião sem ao mesmo tempo negarmos esse mesmo direito a terceiros. No entanto, não temos o direito de nos afiliarmos a uma organização religiosa que não queira nos aceitar. Igualmente, não podemos obrigar que determinadas religiões aceitem práticas contrárias às suas crenças.

Todos nós podemos nos associar a qualquer outro indivíduo ou grupo de indivíduos, mas somente desde que eles estejam dispostos a se associar a nós. Exercer esse direito não impede que outros façam exatamente o mesmo.

Todos nós podemos dizer o que quisermos, pois isso, por si só, não impede que outras pessoas façam o mesmo. No entanto, não temos o direito de obrigar outras pessoas a nos ouvir ou a nos fornecer um espaço para nos expressarmos. Não temos o direito, por exemplo, de publicarmos nossas opiniões em um veículo ou em um website que não as queira. Isso é uma mera questão de direitos de propriedade. Todos nós somos livres para tentar angariar os recursos necessários, por meio de acordos voluntários com terceiros, para publicar um jornal ou uma revista (ou criar um blog na internet). Porém, não temos nenhum direito de obrigar outras pessoas a nos fornecer os recursos necessários para nos expressarmos. 

Visões em choque

Ambas as visões — a progressista e a dos direitos naturais — não são apenas diferentes; elas são incompatíveis. 

Sempre que um suposto direito reivindicado por alguém impõe uma obrigação sobre outra pessoa, a qual agora será obrigada a efetuar uma ação, este suposto direito é uma fraude. Na realidade, ele é um privilégio. Ele não pode ser efetuado simultaneamente por ambas as partes sem que haja uma contradição lógica.

Essa visão progressista sobre direitos é normalmente chamada de "visão positivista", pois tais direitos necessariamente impõem a terceiros a obrigação de efetuar ações positivas. Faz parte de uma filosofia mais ampla chamada de positivismo legal, a qual afirma que direitos são determinados pelo governo. Qualquer coisa que o governo determine como sendo um direito se torna um direito.

Já os direitos naturais são frequentemente chamados de "direitos negativos", pois a única obrigação que tais direitos impõem a terceiros é a de não efetuar uma determinada ação. Assim, o indivíduo tem o direito de que não tirem sua vida, não restrinjam sua liberdade, e não confisquem sua propriedade honestamente adquirida.

Ou seja, o direito negativo simplesmente impõe a terceiros o dever de não iniciar coerção contra inocentes, seja na forma de violência bruta, seja na forma furtiva obrigá-lo a pagar por bens e serviços que serão ofertados a terceiros. 

De acordo com esta visão, o próprio governo deveria estar restringido e limitado pelos direitos humanos universais de todo e qualquer indivíduo. Consequentemente, aquele indivíduo que não reconhece a legitimidade de um governo não deveria ser submisso a ele.

Conclusão

Da próxima vez que você gritar "Eu tenho esse direito!", faça a si mesmo a seguinte pergunta: "E de quem é a obrigação?" 

Se houver um fardo recaindo sobre um terceiro, o qual agora terá a obrigação de fazer qualquer outra coisa que não seja não coagir você, pergunte-se: "Por que teria eu o direito de subordinar aquela pessoa aos meus caprichos?"




(*) Lawrence W. Reed é o presidente da Foundation for Economic Education

Fonte: mises.org.br

terça-feira, setembro 26, 2017

Por que a mídia reclama de Trump?








Trump faz discurso contra ditaduras na ONU. Por que a mídia reclama… de Trump?

por Flávio Morgenstern(*).




Donald Trump, o presidente americano, fez nesta semana seu primeiro discurso na ONU, em Nova York. Fiel a seu estilo, Trump foi muito além da camisa de força do decoro e disparou contra toda sorte de ditaduras pelo mundo. Criticou o fundamentalismo islâmico, o socialismo e o próprio globalismo, encarnado na própria ONU.

A ONU, órgão respeitado e não questionado por praticamente nenhuma autoridade ou jornalista no mundo, usada como argumento de autoridade em questões que variam de saúde e educação a ciência e geopolítica, voltou à baila, agora como alvo, por Donald Trump ser o primeiro presidente americano com discurso e prática abertamente anti-globalista.

O conflito atual surpassou esquerda e direita, e hoje é mal compreendida por jornalistas e analistas como uma discussão entre “nacionalismo e globalização”, usando-se o termo “populismo” para descrever como os assim pejados como “nacionalistas” ganham eleições.


É uma dicotomia que poderia ser muito mais bem descrita como uma disputa entre soberania nacional e a governança global, tendo justamente a ONU como principal legislador, julgador e executor de leis em nível transnacional de maneira integralmente não-eleita, sem consulta popular e representatividade.


É o que Donald Trump e alguns estudiosos do fenômeno denominam como “globalismo”, e jornalistas acostumados a palavras-chave estanques que aprenderam antes de estudos mais profundos ganharem a Academia insistem em denominar como um discurso contra a globalização, que é quase o oposto do globalismo.

Um discurso contrário a ditaduras, chamando terroristas islâmicos de terroristas islâmicos e ainda mais anti-globalista na própria ONU é um dos eventos mais significados da administração Trump, algo a ser lembrado pela História que, até o presente momento, tratou a ONU como a pura verdade, paz, amor, caridade e bondade encarnados.

Trump “chocou” ao afirmar o que sempre afirmou, em plena ONU: “Como presidente dos Estados Unidos, eu sempre colocarei a América em primeiro lugar” [America first], o que jornalistas e analistas preguiçosos tratam como “nacionalismo”. Foi um dos momentos mais aplaudidos.

A continuação de sua fala é reveladora: “tal como vocês, como líderes de seus países, sempre farão e sempre deverão fazer : colocar seus países em primeiro lugar”. Muito antes de um discurso nacionalista (“meu país é melhor do que o seu”), tal como no federalismo americano tão defendido por Trump (em que o poder está dividido pelos estados, e não concentrado no governo federal, chefiado por ele próprio), é um clamor pelo poder do Estado-nação, que Trump reiteradas vezes definiu, ainda em campanha, como o melhor modelo de governança: todos os líderes governam para seu povo, e não para… os burocratas da ONU.

Se ainda não ficou claro, Trump falou que às vezes é preciso trabalhar com “unidade e harmonia”. Porém, acrescentou: “Enquanto eu estiver no cargo, colocarei os interesses americanos sobre todos. Mas, cumprindo nossas obrigações com as outras nações, nós também percebemos que é do interesse de todos buscar um futuro onde todas as nações possam ser soberanas, prósperas e seguras”. A lista de adjetivos começar com “soberanas” em plena ONU é uma declaração que faz os sábios pensarem, e os idiotas concluírem apressadamente com base em sua própria falta de conceitos.
Acordo nuclear com o Irã e Oriente Médio

Trump trouxe a teoria à prática, dizendo que o acordo nuclear com o Irã feito por Barack Obama, que dá 30 dias ao regime dos aiatolás para esconder fabricação de armas nucleares antes das inspeções internacionais, é um “vexame” para a América, e que provavelmente “não ouviremos mais falar dele”. E decretou: “O acordo com o Irã foi uma das piores e assimétricas transações nas quais os Estados Unidos já entraram”, e o líder do país dos aitolás é “exportador de violência, derramamento de sangue e caos”.

America first. Basta comparar ao próprio Barack Obama, que na ONU, reiteradas vezes, falou dos “erros” e “transgressões” (sic) da América diante de países nada errados como Irã, Arábia Saudita, Venezuela e a própria Coréia do Norte. Por que será que o slogan de Trump era “Make America great again“?

Trump ainda assegurou que a América continuará protegendo seus aliados na região, como Israel – postura diametralmente oposta à de seu antecessor.

Mais: a América ajudará a refugiados se instalarem em países próximos aos seus de origem. É muito mais barato e faz todo o sentido para os refugiados e para o Ocidente, se descaracterizando para se entupir de imigrantes, entre eles terroristas e pessoas sem nenhum desejo de adaptação. Além do mais, evita a hégira, que, se o Ocidente conhecesse, ficaria de cabelos em pé.
Coréia do Norte e o “Rocket Man”

Sobre a maior ameaça à paz no mundo hoje, a Coréia do Norte (o Estado Islâmico perdeu 70% do território que controlava no Iraque e na Síria, devido à mudança de posicionamento da América após Hillary Clinton deixar o cargo de Secretária de Estado, municiando grupos rebeldes contra al-Assad, entre eles os que formaram o Estado Islâmico), Donald Trump usou palavras não apenas duras, mas que não vestiram a camisa de força do protocolo:

“Os Estados Unidos têm grande força e paciência, mas se for forçado a se defender ou a defender seus aliados, nós não teremos escolha senão destruir totalmente a Coréia do Norte”. Trump ainda adicionou: “O homem-foguete [Rocket Man] está em uma missão suicida para si próprio e para seu regime”.

A mídia, como sói, tratou o epiteto como um “insulto estranho”. Trump acrescentou, até fazendo uma concessão à ONU: “Os Estados Unidos estão prontos, dispostos e capazes. Mas esperamos que isto não seja necessário. É para isto que serve a ONU. É o que os Estados Unidos defendem. Vamos ver o que eles fazem”.

A animação Team America, dos mesmos criadores de South Park, já havia tirado sarro, em 2004, da inutilidade dos discursos da ONU contra a Coréia do Norte. O diplomata Hans Blix, da Agência Internacional de Energia Atômica, usa o protocolo da ONU com suas “ameaças” assustadoras que deixam Kim Kong Il, o então Kim em chefe, com muito medo de perder o seu poder:

“Deixe-me ver suas armas de destruição em massa, ou então…” Kim 2 responde: “Ou então o quê?” “Ou então nós vamos ficar muito, muito bravos com você. E vamos escrever uma carta te dizendo quanto nós estamos bravos”. É a ONU descrita em um diálogo de 15 segundos.


Socialismo na Venezuela e Cuba

Sem medo de pegar mal para jornalistas que demoraram ao menos 12 anos para perceber que a Venezuela é uma ditadura, Donald Trump, assemelhando-se à descrição do filósofo Roger Scruton, afirmou que “[o] problema na Venezuela não é que o socialismo foi insuficientemente implementado, mas sim que o socialismo foi fielmente implementado”.

E acrescentou que, onde quer que tenha sido implementado, socialismo e comunismo causaram “angústia e devastação e fracasso”, e que são “ideologias desacreditadas”.

E não teve medo de dizer verdades também a Nicolás Maduro: a Venezuela hoje é um “estado selvagem economicamente esgotado”, e seu governo “tem infligido uma dor terrível e sofrimento na boa população do país”.

Trump ainda deixou bem claro, para os olhos estupefatos da ONU tão acostumados a passar a mão na cabeça de Cuba, que a América não irá diminuir as sanções em Cuba enquanto o regime de Raúl Castro não fizer reformas importantes em seu regime corrupto. Algo pode ser mais justo?
Globalismo e ONU

Muito mais do que a distante Coréia do Norte, os aiatolás atômicos ou refugiados que a ONU se preocupa mais como propaganda numérica do que como seres humanos, o que deixou os burocratas globalistas da ONU mais preocupados no discurso de Trump foi a relação da América com a própria ONU, considerada “consolidada” por si há muito.

Países com maior crença em uma governança global, sobretudo para ombrear a América e poder mandar em seu território, dispendem muito menos dinheiro para manter a ONU funcionando em Nova York. Desde 2000, a América aumentou em 140% o seu orçamento para com a ONU e dobrou o seu pessoal. E a mensagem de Trump foi clara neste sentido, até levantando os números no dia anterior.

Mídia

Não há o que Donald Trump possa fazer, incluindo observar o sol ou ajudar vítimas de furacões, que a grande e velha mídia não vá criticar e associar com autoritarismo e nazismo. Exemplos variam de Julian Borger comparando o discurso uma vez a George W. Bush e seu “eixo do mal”, e muito mais a Nikita Khrushchev, Fidel Castro e Hugo Chávez discursando na ONU, por nenhuma outra razão além de irritar, ou David Smith chamando Trump de “escória do planeta” por não seguir o protocolo – e se esquecendo que, nessa toada, acabou também ferindo o protocolo jornalístico, tornando-se uma “escória” quase tão auto-declarada quanto a declaração infeliz de Hillary sobre os eleitores de Trump.

Jornalistas se aboletaram para tratar o discurso de Trump como “belicoso”. Como uma “ameaça” ao mundo, como a manchete mais repetida para anunciar o discurso na ONU: “Em discurso na ONU Trump ameaça destruir Coréia do Norte” e suas variantes.

Para a grande e velha mídia, nenhuma palavra sobre os aliados, sobre o orçamento da ONU que pode marcar o futuro da instituição, sobre a soberania e o Estado nação.

Por exemplo, Sarah Snyder, professora de “direitos humanos” na American University’s School of International Service, afirmou à The Atlantic que é terrível que Trump tenha usado uma linguagem como “terroristas perdedores” [loser terrorists]. Para Sarah Snyder, os terroristas perdedores podem se tornar terroristas perdedores se forem chamados de terroristas perdedores. E então, teremos terroristas perdedores no mundo. Lógica não anda sendo o forte da intelligentsia.

Como pessoas como Sarah Snyder e David Smith podem dizer que Trump está fazendo um mal ao mundo, ao nomear os problemas do mundo e dizer que a América e a ONU precisam lidar com os males do mundo?

Por acaso acreditam que a retórica de Barack Obama, de não dizer quais são os males do mundo, acabou com os males do mundo? Acreditam mesmo que é Trump que está “ameaçando” destruir a Coréia do Norte, como se fosse alguém tão disposto a acabar com a vida dos norte-coreanos como, digamos, Kim Jong-un?

A credibilidade da grande e velha mídia está em queda brusca no mundo exatamente por isso: a mídia é monomaníaca, trata tudo de Trump como algo ruim por coisas que ela própria inventou de dizer sem pesquisar, e se esquece de fazer ao menos um sopesamento. Ora, quem, na vida real, acredita mesmo que Donald Trump seja tão ruim quanto Kim Jong-un? Quem não sabe que pode explodir com uma bomba de pregos na Europa graças ao terrorismo islâmico, e não à política de Trump em relação aos refugiados?

Como seria Donald Trump que “ameaça” o mundo na ONU? Se a ONU conseguiu se manter com uma imagem pública de perfeição na Terra até o ano passado para o mundo, mesmo acreditando em toda manchete sensacionalista com obsessão com Trump, quem acaba, menos lentamente do que parece, ficando melhor perante a opinião pública é o próprio Trump. Ou ao menos a ONU perde seu apelo. E sobretudo a mídia, que se torna insuportavelmente chata e repetitiva.

É possível acreditar em gente que não disfarça seu desgosto em falar, em 2017, que um presidente americano disse que o socialismo deu errado, que o Irã atômico é perigoso e o acordo de Obama foi um desastre, que os terroristas são uns losers?

Podem chamar de “populismo” o quanto for, Trump apenas disse verdades inconvenientes. Populismo não é ganhar eleições justamente com mentiras dóceis? A grande e velha mídia é que anda cumprindo tal papel.



(*)Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs" (ed. Record). No Twitter: @flaviomorgen

domingo, setembro 24, 2017

Não precisamos de feminismo, precisamos de cavalheirismo



por Flavio Morgenstern (*).



Feminismo é uma luta de classes aplicada a gêneros. Cavalheirismo é um código de conduta de homens para servir às mulheres.




Uma cidadã que o UOL dignou a alçar à categoria de colunista, chamada Regina Navarro Lins, escreveu uma “coluna” menor do que um textão de Facebook para defender (adivinhe! algo que exige muita coragem nestes dias!) o feminismo e atacar algo do que chamam de “patriarcado”. No episódio de Regina Navarro Lins, o caso foi dizer que “o cavalheirismo é péssimo para as mulheres”.

De acordo com Regina Navarro Lins (Veja o que ela pensa logo ao final deste artigo), gestos de cavalheirismo (como abrir a porta do carro, deixar a mulher andar do lado de dentro da calçada* ou deixá-la entrar primeiro após abrir uma porta) são instados desde a juventude e, em linguagem histérica-feminista-padrão, “[c]omo é comum as pessoas repetirem o que ouviram desde cedo sem refletir!” (aposto que o leitor já sabia que viria um ponto de exclamação e a palavra “refletir”).

Apesar da auto-declaração de propriedade absoluta da capacidade de reflexão, que Regina Navarro Lins crê que fez com ineditismo na história da humanidade, quem menos parece ter refletido sobre o cavalheirismo desde o cavalo de Tróia parece ser nossa heroína, que o UOL faz questão de nos avisar que é psicanalista há 42 anos (alguém surpreso?), palestrante (alguém surpreso?) e participante do programa “Amor & Sexo” da Globo (sério, alguém surpreso?!).

O maior biógrafo de Sigmund Freud na América, Philip Rieff, em sua auto-biografia My Life Among the Deathworks, definiu como “ordem sacra” o conjunto de símbolos e palavras de uma sociedade que são de autoridade pública imediata. São obedecidos sem reflexão, bem antes de se chegar ao nível de premissas. Você não “argumenta” sobre o sinal vermelho significar “pare” e nem gasta seus neurônios pensando por que a letra A tem este formato.

Na sociedade ocidental, que a freudiana Regina Navarro Lins quer tanto criticar, o cavalheirismo é um código de conduta masculino que entope os homens de restrições de comportamento, além de obrigações para com as mulheres. O Leitmotiv do cavalheirismo é a noção de que os homens, na média, possuem mais força física do que as mulheres, mas devem servir às mulheres com sua força.

Assim, enquanto nossa psicanalista de UOL e Amor & Sexo acredita que o cavalheirismo traz imbuída “de forma subliminar, a ideia de que a mulher é frágil e necessita do homem para protegê-la, até nas coisas mais simples como abrir uma porta ou puxar uma cadeira”, o cavalheirismo não se calca na mesquinha noção de necessidade e economia de subsistência do feminismo, e sim em apenas obrigar o homem, e não a mulher, a gestos que indiquem sua subserviência.

Qualquer cavalheiro sabe que uma mulher tem a perícia necessária para abrir a porta do carro operando a sua maçaneta: mas o gesto de abrir a porta para uma mulher indica não a abertura, mas que o homem, além de abrir a porta, está disposto e possui a tendência de comportamento a servi-la.

É curioso notar que a cura para todas as feministas seriam algumas doses de cavalheirismo: homens que, ao invés de se hipersexualizarem (como querem os psicanalistas) e viverem em disputa (como querem os marxistas) de ordem sexual (como querem os foucaultianos), tratassem mulheres como seres completos que também precisam ser servidas.

Perguntar: “Tem algo que eu possa fazer por você?”, talvez seguido de “meu amor”, é um gesto de cavalheirismo. Não chamar a namorada de “linda”, por não querer seguir os padrões de beleza da sociedade patriarcal, é um gesto de femininismo.

Voltássemos às virtudes cavalheirescas e aristocráticas, o feminismo ainda seria uma ideologia ridicularizada pelas mulheres. Mas é este o foco do feminismo: o cavalheirismo que resolve os problemas do mundo sozinho, sem esperar eleger alguém do PSOL para mudar a sociedade.

Curioso notar como uma psicanalista como Regina Navarro Lins, que tanto “reflete”, ao contrário de nós, ignorantes, não refletiu em nada sobre o cavalheirismo além de se deixar tomar pelo seu próprio recalque. Freud explica.

Pela trilionésima vez, vemos que feminismo nada tem a ver com mulheres: tem a ver com política. Amor & Sexo, foucaultianamente, é um programa sobre poder. Tem mais a ver com “Fora Temer!”, eternamente sem vírgula, e “patriarcado”, do que com uma vida sexual saudável.

O que salvaria qualquer feminista de sofrer de feminismo agudo.

Fonte: sensoincomum.org
(*)Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs" (ed. Record). No Twitter: @flaviomorgen
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Veja quem é e o que pensa Regina Navarro Lins; as conclusões são suas:



"A monogamia já era": psicanalista e escritora Regina Navarro Lins prevê que, no futuro, o mundo será bissexual.
Polêmica até entre os colegas mais liberais, ela tem mais de dez livros, 15 mil seguidores no Twitter e dezenas de pacientes no consultório. Crítica ferrenha à moral e aos bons costumes, Regina é feminista assumida: condena o pacto de exclusividade presente nos casamentos e o cavalheirismo.

por Mayra Stachuk e Marina Caruso (Revista Marie Claire)

De segunda a segunda, a carioca Regina Navarro Lins solta frases polêmicas. “As pessoas não amam umas às outras, mas o fato de estar amando”, “Não posso transar com outro homem só porque estou casada?” e “O cavalheirismo é uma forma de oprimir a mulher disfarçada de gentileza” são algumas das máximas que a psicanalista twitta diariamente. E ela, de fato, acredita em todas. Casada pela terceira vez, com o escritor Flávio Braga, 57 anos, Regina, 62, é exemplo de tudo que prega. “Transo com quem quiser e ele também. Está provado que casamentos abertos são mais felizes”, diz. “Só não pode transformar a relação em confessionário!”




Feminista convicta, Regina é tão liberal que faz com que mesmo nós, mulheres modernas, nos sintamos antiquadas em nossos anseios mais íntimos. Sonhar com o príncipe encantado, esperar que ele abra a porta do carro e acreditar que a fidelidade existe são, segundo a psicanalista, crenças antiquadas que só nos aprisionam e angustiam. “Sofremos por acreditar no mito do amor romântico. Como se a mulher não existisse sem o homem”, afirma. Essa e outras defesas estarão na próxima publicação de Regina, O LIVRO DO AMOR, publicado pela editora Best Seller e previsto para chegar ao mercado no início de 2012. Enquanto finalizava os últimos capítulos, a escritora conversou com Marie Claire em seu apartamento, em Copacabana, no Rio. E provou por A + B que quem tem menos medo de quebrar paradigmas é muito mais feliz. Pelo menos no amor.

MARIE CLAIRE Você defende o fim do amor romântico. O que exatamente quer dizer com isso?

Regina Navarro Lins Quando falo em amor romântico, não estou falando de mandar flores, mas de um amor idealizado, irreal. Você conhece uma pessoa, idealiza e lhe atribui características que ela não tem. Passa a vida toda querendo mudá-la e, no fim, percebe que é impossível. Para piorar, o amor romântico prega uma grande mentira, que é “quem ama não sente desejo por mais ninguém”. Nessa concepção enganosa de amor, não nos apaixonamos pelo outro, mas pela própria paixão. O objeto não importa, desde que nos sintamos extasiados. É um amor egoísta, que só gera sofrimento, mas que, na minha opinião, vai acabar.

MC Mas não é esse o amor que sempre existiu?

RNL O conceito de amor mudou muito durante a história. E é essa trajetória que comprova minha teoria de que o amor romântico está saindo de cena. A primeira concepção surgiu no século 12, com o amor cortês. Só em 1940 o casamento por amor virou um fenômeno de massa, com os filmes de Hollywood. Depois da Segunda Guerra Mundial, no entanto, os jovens passaram a questionar os valores dos pais e, ainda que sem saber, a preparar o terreno para a revolução sexual que aconteceria depois. Em 1962, surgiu a pílula anticoncepcional, que foi o que realmente mudou tudo. Graças a ela, o sexo se dissociou da procriação e a mulher passou a ser dona da própria vida. Hoje, estamos no meio de uma mudança enorme de mentalidade que começou lá atrás. Por isso, posso dizer, com toda a segurança, que o casamento é só uma construção social, um modelo que reproduzimos sem saber por quê.

MC A que convenções você se refere? À monogamia, por exemplo?

RNL Claro! Se você acredita que quem ama não transa com mais ninguém mas, de repente, descobre que seu marido ou namorado transou com alguém, você vai se sentir muito sacaneada. Vai querer morrer. Quando, para mim, é muito mais simples: você pode amar profundamente uma pessoa, ter uma ótima vida sexual com ela e eventualmente ter relação com outra pessoa. Isso geraria bem menos sofrimento do que se imagina.

MC Você é contra o casamento?

RNL Não! Sou contra o pacto de exclusividade. Um casamento pode ser ótimo! Estou casada há 11 anos com o Flávio e é muito bom. Nos meus casamentos anteriores, embora eu sempre tenha me sentido livre, havia uma exigência de fidelidade implícita, que me tolhia e tolhia o outro também. Por isso, acho que hoje eu e o Flávio somos muito mais bem resolvidos. É evidente que não vamos contar nada um para o outro, porque casamento não é confessionário. A minha sexualidade é minha, não dele. O problema dos casamentos normais é que, cedo ou tarde, eles deixam as pessoas infelizes. Sabe qual o percentual de pessoas que se declaram desencantadas com o casamento? 80%! Só de 3% a 5% são realmente felizes. O resto oscila. Ou seja, não é à toa que a monogamia já era.(Nota do Blogando: Evidentemente a pesquisa deve ter sido feita pelo DataFolha que sempre é desmentida)

MC Como começou essa exigência de exclusividade sexual?

RNL Até 5 mil anos atrás, os homens não sabiam que tinham participação na geração de uma criança. Para eles, a fertilidade era exclusivamente feminina. Durante milênios, a ideia de casal foi desconhecida. Viviam todos juntos. Quando os homens abandonaram a caça e domesticaram os animais, perceberam que, se as ovelhas se separassem dos carneiros, não geravam cordeiros; porém, após o carneiro cobrir a ovelha, nasciam filhotes. A contribuição do macho para a procriação foi, enfim, descoberta. E ela coincidiu com o surgimento da propriedade privada. O homem passou a dizer “minha terra”, “meu rebanho” e aprisionou a mulher para não correr o risco de deixar a sua herança para o filho de outro, caso ela pulasse cerca. Esse é o início da exigência de exclusividade sexual, mas era válido só para as mulheres. Isso foi quebrado séculos depois, com a pílula. A mulher passou a decidir quando ter ou não filho e a se lançar no mercado de trabalho. Hoje, vivemos o fim desse desmoronamento. Ainda pode durar mais 100 anos, mas está no fim.

MC Então a monogamia está com os dias contados, é isso?

RNL É evidente que eu estou falando de tendências de comportamento, não de mudanças em curto prazo. Hoje, a maioria dos casais pode me achar louca de afirmar que o casamento monogâmico já era. Mas há, no mundo todo, sinais que mostram que casais mais liberais tendem a ser mais felizes. A revista do NEW YORK TIMES deu recentemente a seguinte capa: “INFIDELITY KEEPS US TOGETHER” (A INFIDELIDADE NOS MANTÉM JUNTOS) . É um exemplo disso.

MC E por que isso nos faria mais felizes?

RNL Nada é garantia de nada. Mas já sabemos que esse modelo que inventamos não deixa as pessoas felizes. Quem casa e opta por se reprimir em respeito ao outro pode pagar um preço muito alto. Você pode até controlar o seu desejo, mas ele vai continuar existindo em algum lugar. Daí, anos depois, você descobre que seu marido não fez o mesmo. Pronto, seu mundo caiu. Agora me diga, com toda a sinceridade: por que quando uma pessoa se casa não pode transar com outra? Historicamente, eu sei que era porque o homem não queria que sua herança fosse de outra pessoa. Mas, fisiologicamente, isso não faz sentido. Está mentindo quem diz que nunca teve tesão por outro além do marido. E mais, sexo é feito bateria de carro: se você não usa, descarrega. Por isso, o casamento monogâmico é o relacionamento no qual menos se faz sexo.

MC É possível amar duas pessoas ao mesmo tempo?

RNL Sim. O que gera sofrimento não é a traição, mas a crença no pacto de exclusividade. E o pior é que a maioria dos meus colegas não vê isso. São um bando de caretas, sabia? Todos, sem exceção, justificam a traição dizendo que o casamento vai mal ou que o amor acabou ou porque um deles quer se afirmar. Gente, não é nada disso! As pessoas têm relação extraconjugal porque variar é bom, não porque o amor acabou! Isso vai completamente na contramão do que se busca hoje: a individualidade. As pessoas querem se testar, se conhecer, perceber seus limites. É por isso que o amor romântico tende a acabar, por pregar o fim da individualidade por respeito ao outro.

MC Que outros sinais mostram que essa mudança já começou?

RNL É só ver a quantidade de casas de suingue que tem por aí, mulheres traindo e assumindo casos, buscando sua felicidade sem se colocar como subestimada. E não são mais pessoas procurando salvar relações falidas. São jovens que vão atrás de prazer e ponto. São tendências que apontam a mudança de mentalidade. Cada vez menos pessoas vão querer se fechar numa relação a dois e optar por relacionamentos mais soltos. Se bobear, minha tataraneta (ELA TEM UMA NETA DE 15 ANOS) vai dizer: “Gente, tadinha da minha tataravó, precisava ter um parceiro só para tudo” (RISOS).

MC O que você está propondo é uma espécie de poliamor?

RNL De certa forma, sim. O poliamor implica ter relações sexuais e afetivas com pessoas diferentes. É assim: eu amo meu marido e transo com ele, mas também posso transar com outras pessoas, ir com elas ao cinema, viajar. Fazer o que quiser, com quem quiser, sem obrigação de exclusividade. Eles não amam com o sentimento de posse sobre o outro, por isso não sentem ciúme. Para eles, o ciúme está ligado ao medo da perda.

MC Mas esse amor livre não poderia facilitar o abandono, aumentar a possibilidade da perda? Ou não seria uma forma de se proteger contra ela?

RNL Mas nesse tipo de relação livre não existe a possibilidade de ser trocado, porque as pessoas não precisam escolher. Veja, muitas pessoas são abandonadas, certo? Aposto que 100% delas viviam uma relação supostamente monogâmica. Ou seja, uma relação fechada não é garantia de que você nunca será abandonado. A vida toda nós fomos instruídos a dirigir nossa energia amorosa e sexual para uma pessoa só e é nisso que a gente se apega. Daí, se isso não dá certo, sofremos horrores. Sentimo-nos abandonados, jogados às traças. Mas, na verdade, o abandono acontece já nos primeiros segundos de vida. No momento em que saímos do útero da mãe, já vivemos o sentimento de falta. Aquele conforto e segurança, não teremos nunca mais. Por isso, crescemos tentando reeditar o que tínhamos no útero. E, com essa nossa cultura, a coisa fica ainda pior. Em vez de ensinar o ser humano a viver sozinho, a sociedade prega que é preciso achar alguém que o complete, sua alma gêmea. Isso é a ilusão do amor romântico.

MC Você acha que daqui a 40 ou 50 anos os casais monogâmicos serão minoria? Sofrerão preconceito?

RNL O que eu espero é que haja espaço para tudo, sem preconceitos. Não seria certo que a regra fosse “agora todo mundo vai ter de transar com todo mundo” e que os casais que optaram pela monogamia ficassem excluídos. O importante é que cada pessoa escolha sua forma de viver e não reproduza um modelo por inércia nem medo de sofrer preconceito.

MC A internet ajudou a acelerar essas transformações?

RNL Sem dúvida. Ali, tudo é permitido. Quando criaram os primeiros chats, eu fiquei louca para saber como era o sexo on-line. Em 1998, por pura curiosidade antropológica, passei alguns dias fazendo sexo virtual. Queria muito saber se era possível sentir prazer com uma pessoa a distância, e hoje sei que é. E eu não me masturbava, viu? Não conseguia digitar e me tocar ao mesmo tempo, mas quando acabava a transa me sentia exausta, satisfeita mesmo. Foi uma experiência muito legal.

MC Você já fingiu orgasmo?

RNL Ah, já. Há muito tempo. Devia ter uns 20 anos quando fiz isso pela última vez. Era uma garota ansiosa como tantas outras. Mas acho isso horrível. Sempre digo para minhas pacientes não fingirem, senão elas vão viciar o homem em um modelo errado, acostumá-lo a achar que orgasmo é algo fácil e corriqueiro. E não é! É uma maravilha que custa para ser alcançada. Isso está diretamente ligado à autoestima. A mulher que gosta de si não tem problemas em fazer o homem trabalhar mais e melhor para fazê-la gozar. Agora, a que sofre de baixa autoestima se sente constrangida e finge para acabar logo com isso...

MC Quando garota, você não sonhava com o príncipe encantado?

RNL Não. E minha irmã dizia que eu tinha alma de homem, porque criticava o fato de ela ficar esperando o príncipe dela.

MC Feministas mais radicais não gostam que os homens paguem a conta. É o seu caso?

RNL Hoje eu pago, amanhã ele paga e depois dividimos. Prefiro assim. Cansei de ouvir mulher dizendo: “Ah, só me faltava essa: pagar motel!” ou “Não me incomodo de dividir restaurante, cinema, mas motel quem paga é ele”. Isso me revolta. Se os dois vão ter prazer, não há qualquer problema em dividir a conta. A mulher não é uma prostituta que está ali para servi-lo e por isso cabe a ele pagar por tudo.

MC Mas e se o homem quiser pagar? Qual o problema?

RNL A questão que eu quero colocar é chega de que “homem deve pagar a conta do motel simplesmente por ser homem”. As mulheres querem os benefícios da liberação feminina — tipo casar dez vezes, transar na primeira noite, ganhar bem —, mas não querem o ônus. Se os direitos são iguais, são iguais também os deveres. Isso é puro machismo! Não conheço homens que sustentem a mulher e não usem isso contra ela. O dinheiro confere poder, faz com que a gente se sinta superior. Tanto que eu, se só tivesse duas opções, sustentar ou ser sustentada, ficaria com a primeira. Deus me livre ter de pedir dinheiro para comprar minhas coisas (RISOS).

MC Condena o cavalheirismo?

RNL Não, mas sei que ele é uma herança da cultura patriarcal da Idade Média que se disfarça de gentileza para atestar a força masculina e a fragilidade feminina. Gentileza é uma via de mão dupla. A mulher também pode mandar flores, assim como o homem pode ser gentil cozinhando. É tudo convenção. Que tipo de homem deseja proteger uma mulher? Certamente não um que a veja como uma igual, mas aquele que se sente superior a ela.

MC Por isso o homem está em crise?

RNL Sem dúvida. Para os que não se libertaram do mito da masculinidade (ou seja, a maioria), as mulheres que combatem o cavalheirismo são uma afronta. Eles se sentem ameaçados, pois não conhecem outro papel senão o de guardiões, protetores. Para eles, essa mudança é muito nova. No século 19, o marido tinha o direito de bater na mulher com uma vara do tamanho do seu antebraço e da grossura do seu dedo médio. Parece piada, mas é verdade! Depois me perguntam se eu sou feminista. E dá para não ser? Só não é feminista quem quer continuar vendo a mulher ser oprimida.

MC A febre dos sex shops mudou o padrão dos relacionamentos?

RNL Não. Mas deveria. As mulheres, principais frequentadoras de butiques eróticas, ainda ficam tímidas. Compram, no máximo, pequenos artigos para se masturbar. Não para transar junto com o parceiro, porque os homens entram em competição e acham uma ofensa. Chega disso, gente (GRITA)! Temos de combater o preconceito pelo menos na hora da transa. O sexo com o parceiro e o vibrador ao mesmo tempo é fisiologicamente imbatível. Enquanto o parceiro cuida da penetração, o vibrador estimula o clitóris e o orgasmo é duplo, mil vezes mais intenso. Incomparavelmente melhor.

MC Você e o Flávio usam? Isso não é um problema para ele?

RNL Usamos, claro. O Flávio é superbem resolvido. Uma vez fomos à Praia da Pipa e, quando me dei conta de que tinha esquecido o vibrador, peguei um táxi e rodei Fortaleza inteira atrás de um sex shop. Comprei um novo, grandão. Para que vou me conformar com um orgasmo simples se posso ter um duplo?

MC O que é mais comum: que a pessoa sofra porque foi traída ou que ela sofra porque, depois de traída, foi abandonada?

RNL As pessoas morrem de medo do abandono, e o problema é justamente relacionar isso à traição. Uma coisa não tem a ver com a outra.

MC Nesse caso, estamos falando da traição simplesmente sexual. E quando ela é emocional, quando existe um envolvimento amoroso?

RNL Não usaria a palavra traição em nenhum desses casos. É pejorativo demais! Trair, para mim, é alguém estar comigo por algum interesse e não por amor. Relação extraconjugal não é traição, é a coisa mais banal que existe. As pessoas deveriam se preocupar em responder a duas perguntas: 1) me sinto amada?; 2) me sinto desejada? Se a resposta for sim para as duas, tenho certeza de que está tudo bem na relação. No fundo, isso é o que importa.

Dispensa Legenda na Foto.

MC E se a resposta for não?

RNL Aí a questão não é ter ciúme ou ser traída. É se vale a pena continuar numa relação mesmo sem ser amada. Na minha opinião, quem não se sente amado deve partir para outra. Isso é vida. Tem pessoas infelicíssimas dentro do casamento, se agarrando como náufragos um na perna do outro só para não ficar só. Isso é uma fantasia.