por Ricardo Bordin.
Faço desde já o alerta de spoiler para quem ainda não assistiu a este filme, até pelo fato de que, mesmo após a leitura desta análise, ainda valerá (e muito) a pena conferir esta raridade em meio a tantas obras cinematográficas de viés “progressista”. What Happened to Monday(Onde Está Segunda) desafia o padrão predominantemente esquerdista das produções hollywoodianas e lança um olhar crítico sobre o o dirigismo estatal justificado por catástrofes, questiona a prática do aborto e enfatiza o poder da família contra pretensões tirânicas.
Os fatos narrados nesta distopia futurística ocorrem a partir de uma forte escassez alimentícia provocada, supostamente, pelo aumento desenfreado da população mundial e pelo aquecimento global. Têm início, a partir daí, uma política governamental voltada ao controle de natalidade: cada mulher pode dar à luz apenas um filho.
Todos os irmãos dos primogênitos compartilham do mesmo destino: serem congelados por meio de processos criogênicos para que possam ser acordados somente no dia em que os problemas nutricionais na Terra tiverem sido equacionados – o Estado, naquele momento, está investindo pesadamente no desenvolvimento de formas mais avançadas de cultivo e produção de alimentos.
O diretor do filme, intencionalmente, informa aos espectadores sobre esta suposta situação caótica do clima no planeta – e suas consequências nefastas sobre a atividade agropecuária – por meio de reportagens veiculadas pela mídia tradicional. Ou seja, conhecendo o alarmismo infundado difundido por estes meios de comunicação, não há sequer como afirmar se de fato o cenário real seria aquele descrito pela imprensa.
O fato é que, uma vez convencida a opinião pública de que o mundo está desmoronando (tarefa que, na vida real, é empreendida incansavelmente), entra em ação a teoria malthusiana para justificar a criação do CAB (Child Allocation Bureau, ou simplesmente centro de alocação de crianças), órgão estatal que fiscaliza a vida de cada cidadão – inclusive fazendo uso de sistemas eletrônicos subcutâneos – a fim de impor a restrição de nascimentos por mulher.
Algo semelhante, portanto, à política de filho único adotada por Mao Tse-tung, a qual, após décadas de trágicos resultados, precisou ser aliviada por motivos econômicos: a taxa de fertilidade na China estava abaixo do nível de substituição (1,17) em 2013, prestes a gerar uma crise de mão de obra em idade laboral – eis o que Malthus não previu: uma maior quantidade de pessoas possibilita divisão e especialização do trabalho, dando origem a novos métodos mais eficientes de produção (inclusive de alimentos).
A dor de cabeça destes burocratas começa efetivamente quando Karen Settman engravida de sétuplos (todas meninas) e morre durante o parto. O avô das recém nascidas, então, resolve dar um jeito de enganar o governo: dá o nome de um dia da semana para cada uma delas, determina que cada qual só pode sair de casa naquele dia específico, e então elas devem assumir uma única identidade, escapando ilesas de serem capturadas.
E aí entra em cena a capacidade destas sete mulheres, trabalhando em equipe, derrotarem as pretensões estatais. Ela frequentam o colégio, graduam-se, atingem a idade adulta e conseguem destaque no banco onde trabalham, tudo em função da união de suas habilidades em prol de um objetivo comum: sobreviver. Sexta-feira é a mais inteligente, Quinta-feira a mais corajosa, Sábado é a mais sociável, Quarta-feira pratica artes marciais e defesa pessoal, e assim por diante.
Daí fica fácil entender porque regimes totalitários sempre buscam esfacelar os núcleos familiares: a cooperação mútua que os caracteriza é deveras nociva para a pretensão de dominação de cada aspecto da existência dos indivíduos. Orlando Figes, no livro Sussurros: A Vida Privada na Rússia de Stálin, revela:
“A família era o primeiro campo de batalha dos bolcheviques. Nos anos 1920, eles tinham por artigo de fé que a ‘família burguesa’ era socialmente danosa: auto-centrada e conservadora, era vista como um reduto de religião, superstição, ignorância e preconceito; estimularia o egoísmo e o consumismo, oprimindo mulheres e crianças. Os bolcheviques esperavam que a família desaparecesse à medida que a Rússia soviética se tornasse um sistema socialista pleno, no qual o Estado assumiria a responsabilidade por todas as funções domésticas básicas, fornecendo berçários, lavanderias e refeitórios em centros públicos e blocos de apartamentos.”
Não por acaso, a dramaturgia dos dias atuais, quando retrata conflitos familiares (a cada cinco minutos, no caso), privilegia cenas de adolescentes sendo desrespeitosos para com seus pais, e de pais humilhando-se perante seus filhos. Quanto mais instabilidade for gerada, melhor: menos provável que os membros desta família fortaleçam seus laços afetivos e reúnam, assim, condições para opor-se ao Estado (e à elite financeira que com ele anda de braço dado) ou mesmo possa abrir mão de seu auxílio.
Não que arranjos familiares sejam perfeitos e livres de desavenças. Como dizia o refrão do seriado A Grande Família, parentes “brigam por qualquer razão mas acabam pedindo perdão”. No filme em questão, é justamente uma traição da “ovelha negra” das sete gêmeas que revela seu segredo.
Eis que Nicolette Cayman, espécie de ministra responsável pelo controle populacional, ao tomar ciência do caso, resolve assassinar as irmãs, pois sabe que, caso venha a público a informação de que as Settman sobreviveram por tanto tempo valendo-se deste expediente, restará desmoralizada a própria política do filho único.
Claro que as irmãs não deixam barato e partem para o enfrentamento. Em sua luta pela sobrevivência, acabam por deparar-se com a revelação mais chocante do filme: as crianças que, segundo alegava o governo, seriam adormecidas por tempo indeterminado, eram, em verdade, incineradas em escala industrial.
Ou seja, o “Centro de alocação de crianças” é, em verdade, uma gigantesca clínica de eugenia, aos moldes daquelas mantidas (inclusive com dinheiro público) pela Planned Parenthood nos USA – especialmente nos bairros pobres e habitados predominantemente por negros. A instituição criada por Margaret Sanger e apoiada por Hillary Clinton pretende conseguir aprovação no congresso para realizar “abortos pós-nascimento”. Pergunta: qual será a diferença entre tais procedimentos e as cremações executadas no filme?
Aliás, a citada antagonista do enredo repete, em sua defesa, um mantra adotado frequentemente por abortistas: “As crianças não sofreram” (elas eram sedadas antes de serem reduzidas a cinzas). Convenhamos: quem defende o aborto com base neste argumento (de que o “feto” não sofre) precisa concordar com ela e absolvê-la, não? Tudo em nome de “uma sociedade perfeita”, como aquela almejada na Islândia.
Nicolette Cayman, em verdade, fazia-se notar como uma pessoa supostamente interessada no bem da humanidade (inclusive acusando de “egoísmo” quem se atrevia a ter mais de um filho), enquanto articulava, nos bastidores, sua ascensão ao cargo de primeira-ministra. Qualquer semelhança com os políticos que ditam nossos rumos não é mera coincidência.
Ao ser detida por seus crimes e ver sua lei eugenista revogada, ela dirige ao público a questão que mais revela sobre seu caráter (e dos gestores públicos em geral): “Quem vai tomar as decisões difíceis por vocês?”. Ou seja, não interessa a vontade popular (especialmente se ela contrariar os desejos da elite financeira e governamental); os tecnocratas e intelectuais ungidos é que sabem o que é melhor para o povo ignorante – e para ampliar este entendimento, nada melhor que imbecilizar as pessoas cada vez mais.
Faço aqui previsões das mais fáceis e manjadas: esta obra cinematográfica jamais será premiada, na medida em que é puro “gramscismo às avessas” – ou seja, introduz de forma velada conceitos que são a antítese da mentalidade dominante hoje nas universidades e no jornalismo. Receberá duras críticas a quaisquer defeitos de produção. E irá demorar muito até que o diretor Tommy Wirkola limpe sua barra com o politicamente correto…
Publicado no blog do autor – https://bordinburke.wordpress.com/
Nenhum comentário:
Postar um comentário