domingo, setembro 24, 2017

Não precisamos de feminismo, precisamos de cavalheirismo



por Flavio Morgenstern (*).



Feminismo é uma luta de classes aplicada a gêneros. Cavalheirismo é um código de conduta de homens para servir às mulheres.




Uma cidadã que o UOL dignou a alçar à categoria de colunista, chamada Regina Navarro Lins, escreveu uma “coluna” menor do que um textão de Facebook para defender (adivinhe! algo que exige muita coragem nestes dias!) o feminismo e atacar algo do que chamam de “patriarcado”. No episódio de Regina Navarro Lins, o caso foi dizer que “o cavalheirismo é péssimo para as mulheres”.

De acordo com Regina Navarro Lins (Veja o que ela pensa logo ao final deste artigo), gestos de cavalheirismo (como abrir a porta do carro, deixar a mulher andar do lado de dentro da calçada* ou deixá-la entrar primeiro após abrir uma porta) são instados desde a juventude e, em linguagem histérica-feminista-padrão, “[c]omo é comum as pessoas repetirem o que ouviram desde cedo sem refletir!” (aposto que o leitor já sabia que viria um ponto de exclamação e a palavra “refletir”).

Apesar da auto-declaração de propriedade absoluta da capacidade de reflexão, que Regina Navarro Lins crê que fez com ineditismo na história da humanidade, quem menos parece ter refletido sobre o cavalheirismo desde o cavalo de Tróia parece ser nossa heroína, que o UOL faz questão de nos avisar que é psicanalista há 42 anos (alguém surpreso?), palestrante (alguém surpreso?) e participante do programa “Amor & Sexo” da Globo (sério, alguém surpreso?!).

O maior biógrafo de Sigmund Freud na América, Philip Rieff, em sua auto-biografia My Life Among the Deathworks, definiu como “ordem sacra” o conjunto de símbolos e palavras de uma sociedade que são de autoridade pública imediata. São obedecidos sem reflexão, bem antes de se chegar ao nível de premissas. Você não “argumenta” sobre o sinal vermelho significar “pare” e nem gasta seus neurônios pensando por que a letra A tem este formato.

Na sociedade ocidental, que a freudiana Regina Navarro Lins quer tanto criticar, o cavalheirismo é um código de conduta masculino que entope os homens de restrições de comportamento, além de obrigações para com as mulheres. O Leitmotiv do cavalheirismo é a noção de que os homens, na média, possuem mais força física do que as mulheres, mas devem servir às mulheres com sua força.

Assim, enquanto nossa psicanalista de UOL e Amor & Sexo acredita que o cavalheirismo traz imbuída “de forma subliminar, a ideia de que a mulher é frágil e necessita do homem para protegê-la, até nas coisas mais simples como abrir uma porta ou puxar uma cadeira”, o cavalheirismo não se calca na mesquinha noção de necessidade e economia de subsistência do feminismo, e sim em apenas obrigar o homem, e não a mulher, a gestos que indiquem sua subserviência.

Qualquer cavalheiro sabe que uma mulher tem a perícia necessária para abrir a porta do carro operando a sua maçaneta: mas o gesto de abrir a porta para uma mulher indica não a abertura, mas que o homem, além de abrir a porta, está disposto e possui a tendência de comportamento a servi-la.

É curioso notar que a cura para todas as feministas seriam algumas doses de cavalheirismo: homens que, ao invés de se hipersexualizarem (como querem os psicanalistas) e viverem em disputa (como querem os marxistas) de ordem sexual (como querem os foucaultianos), tratassem mulheres como seres completos que também precisam ser servidas.

Perguntar: “Tem algo que eu possa fazer por você?”, talvez seguido de “meu amor”, é um gesto de cavalheirismo. Não chamar a namorada de “linda”, por não querer seguir os padrões de beleza da sociedade patriarcal, é um gesto de femininismo.

Voltássemos às virtudes cavalheirescas e aristocráticas, o feminismo ainda seria uma ideologia ridicularizada pelas mulheres. Mas é este o foco do feminismo: o cavalheirismo que resolve os problemas do mundo sozinho, sem esperar eleger alguém do PSOL para mudar a sociedade.

Curioso notar como uma psicanalista como Regina Navarro Lins, que tanto “reflete”, ao contrário de nós, ignorantes, não refletiu em nada sobre o cavalheirismo além de se deixar tomar pelo seu próprio recalque. Freud explica.

Pela trilionésima vez, vemos que feminismo nada tem a ver com mulheres: tem a ver com política. Amor & Sexo, foucaultianamente, é um programa sobre poder. Tem mais a ver com “Fora Temer!”, eternamente sem vírgula, e “patriarcado”, do que com uma vida sexual saudável.

O que salvaria qualquer feminista de sofrer de feminismo agudo.

Fonte: sensoincomum.org
(*)Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs" (ed. Record). No Twitter: @flaviomorgen
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Veja quem é e o que pensa Regina Navarro Lins; as conclusões são suas:



"A monogamia já era": psicanalista e escritora Regina Navarro Lins prevê que, no futuro, o mundo será bissexual.
Polêmica até entre os colegas mais liberais, ela tem mais de dez livros, 15 mil seguidores no Twitter e dezenas de pacientes no consultório. Crítica ferrenha à moral e aos bons costumes, Regina é feminista assumida: condena o pacto de exclusividade presente nos casamentos e o cavalheirismo.

por Mayra Stachuk e Marina Caruso (Revista Marie Claire)

De segunda a segunda, a carioca Regina Navarro Lins solta frases polêmicas. “As pessoas não amam umas às outras, mas o fato de estar amando”, “Não posso transar com outro homem só porque estou casada?” e “O cavalheirismo é uma forma de oprimir a mulher disfarçada de gentileza” são algumas das máximas que a psicanalista twitta diariamente. E ela, de fato, acredita em todas. Casada pela terceira vez, com o escritor Flávio Braga, 57 anos, Regina, 62, é exemplo de tudo que prega. “Transo com quem quiser e ele também. Está provado que casamentos abertos são mais felizes”, diz. “Só não pode transformar a relação em confessionário!”




Feminista convicta, Regina é tão liberal que faz com que mesmo nós, mulheres modernas, nos sintamos antiquadas em nossos anseios mais íntimos. Sonhar com o príncipe encantado, esperar que ele abra a porta do carro e acreditar que a fidelidade existe são, segundo a psicanalista, crenças antiquadas que só nos aprisionam e angustiam. “Sofremos por acreditar no mito do amor romântico. Como se a mulher não existisse sem o homem”, afirma. Essa e outras defesas estarão na próxima publicação de Regina, O LIVRO DO AMOR, publicado pela editora Best Seller e previsto para chegar ao mercado no início de 2012. Enquanto finalizava os últimos capítulos, a escritora conversou com Marie Claire em seu apartamento, em Copacabana, no Rio. E provou por A + B que quem tem menos medo de quebrar paradigmas é muito mais feliz. Pelo menos no amor.

MARIE CLAIRE Você defende o fim do amor romântico. O que exatamente quer dizer com isso?

Regina Navarro Lins Quando falo em amor romântico, não estou falando de mandar flores, mas de um amor idealizado, irreal. Você conhece uma pessoa, idealiza e lhe atribui características que ela não tem. Passa a vida toda querendo mudá-la e, no fim, percebe que é impossível. Para piorar, o amor romântico prega uma grande mentira, que é “quem ama não sente desejo por mais ninguém”. Nessa concepção enganosa de amor, não nos apaixonamos pelo outro, mas pela própria paixão. O objeto não importa, desde que nos sintamos extasiados. É um amor egoísta, que só gera sofrimento, mas que, na minha opinião, vai acabar.

MC Mas não é esse o amor que sempre existiu?

RNL O conceito de amor mudou muito durante a história. E é essa trajetória que comprova minha teoria de que o amor romântico está saindo de cena. A primeira concepção surgiu no século 12, com o amor cortês. Só em 1940 o casamento por amor virou um fenômeno de massa, com os filmes de Hollywood. Depois da Segunda Guerra Mundial, no entanto, os jovens passaram a questionar os valores dos pais e, ainda que sem saber, a preparar o terreno para a revolução sexual que aconteceria depois. Em 1962, surgiu a pílula anticoncepcional, que foi o que realmente mudou tudo. Graças a ela, o sexo se dissociou da procriação e a mulher passou a ser dona da própria vida. Hoje, estamos no meio de uma mudança enorme de mentalidade que começou lá atrás. Por isso, posso dizer, com toda a segurança, que o casamento é só uma construção social, um modelo que reproduzimos sem saber por quê.

MC A que convenções você se refere? À monogamia, por exemplo?

RNL Claro! Se você acredita que quem ama não transa com mais ninguém mas, de repente, descobre que seu marido ou namorado transou com alguém, você vai se sentir muito sacaneada. Vai querer morrer. Quando, para mim, é muito mais simples: você pode amar profundamente uma pessoa, ter uma ótima vida sexual com ela e eventualmente ter relação com outra pessoa. Isso geraria bem menos sofrimento do que se imagina.

MC Você é contra o casamento?

RNL Não! Sou contra o pacto de exclusividade. Um casamento pode ser ótimo! Estou casada há 11 anos com o Flávio e é muito bom. Nos meus casamentos anteriores, embora eu sempre tenha me sentido livre, havia uma exigência de fidelidade implícita, que me tolhia e tolhia o outro também. Por isso, acho que hoje eu e o Flávio somos muito mais bem resolvidos. É evidente que não vamos contar nada um para o outro, porque casamento não é confessionário. A minha sexualidade é minha, não dele. O problema dos casamentos normais é que, cedo ou tarde, eles deixam as pessoas infelizes. Sabe qual o percentual de pessoas que se declaram desencantadas com o casamento? 80%! Só de 3% a 5% são realmente felizes. O resto oscila. Ou seja, não é à toa que a monogamia já era.(Nota do Blogando: Evidentemente a pesquisa deve ter sido feita pelo DataFolha que sempre é desmentida)

MC Como começou essa exigência de exclusividade sexual?

RNL Até 5 mil anos atrás, os homens não sabiam que tinham participação na geração de uma criança. Para eles, a fertilidade era exclusivamente feminina. Durante milênios, a ideia de casal foi desconhecida. Viviam todos juntos. Quando os homens abandonaram a caça e domesticaram os animais, perceberam que, se as ovelhas se separassem dos carneiros, não geravam cordeiros; porém, após o carneiro cobrir a ovelha, nasciam filhotes. A contribuição do macho para a procriação foi, enfim, descoberta. E ela coincidiu com o surgimento da propriedade privada. O homem passou a dizer “minha terra”, “meu rebanho” e aprisionou a mulher para não correr o risco de deixar a sua herança para o filho de outro, caso ela pulasse cerca. Esse é o início da exigência de exclusividade sexual, mas era válido só para as mulheres. Isso foi quebrado séculos depois, com a pílula. A mulher passou a decidir quando ter ou não filho e a se lançar no mercado de trabalho. Hoje, vivemos o fim desse desmoronamento. Ainda pode durar mais 100 anos, mas está no fim.

MC Então a monogamia está com os dias contados, é isso?

RNL É evidente que eu estou falando de tendências de comportamento, não de mudanças em curto prazo. Hoje, a maioria dos casais pode me achar louca de afirmar que o casamento monogâmico já era. Mas há, no mundo todo, sinais que mostram que casais mais liberais tendem a ser mais felizes. A revista do NEW YORK TIMES deu recentemente a seguinte capa: “INFIDELITY KEEPS US TOGETHER” (A INFIDELIDADE NOS MANTÉM JUNTOS) . É um exemplo disso.

MC E por que isso nos faria mais felizes?

RNL Nada é garantia de nada. Mas já sabemos que esse modelo que inventamos não deixa as pessoas felizes. Quem casa e opta por se reprimir em respeito ao outro pode pagar um preço muito alto. Você pode até controlar o seu desejo, mas ele vai continuar existindo em algum lugar. Daí, anos depois, você descobre que seu marido não fez o mesmo. Pronto, seu mundo caiu. Agora me diga, com toda a sinceridade: por que quando uma pessoa se casa não pode transar com outra? Historicamente, eu sei que era porque o homem não queria que sua herança fosse de outra pessoa. Mas, fisiologicamente, isso não faz sentido. Está mentindo quem diz que nunca teve tesão por outro além do marido. E mais, sexo é feito bateria de carro: se você não usa, descarrega. Por isso, o casamento monogâmico é o relacionamento no qual menos se faz sexo.

MC É possível amar duas pessoas ao mesmo tempo?

RNL Sim. O que gera sofrimento não é a traição, mas a crença no pacto de exclusividade. E o pior é que a maioria dos meus colegas não vê isso. São um bando de caretas, sabia? Todos, sem exceção, justificam a traição dizendo que o casamento vai mal ou que o amor acabou ou porque um deles quer se afirmar. Gente, não é nada disso! As pessoas têm relação extraconjugal porque variar é bom, não porque o amor acabou! Isso vai completamente na contramão do que se busca hoje: a individualidade. As pessoas querem se testar, se conhecer, perceber seus limites. É por isso que o amor romântico tende a acabar, por pregar o fim da individualidade por respeito ao outro.

MC Que outros sinais mostram que essa mudança já começou?

RNL É só ver a quantidade de casas de suingue que tem por aí, mulheres traindo e assumindo casos, buscando sua felicidade sem se colocar como subestimada. E não são mais pessoas procurando salvar relações falidas. São jovens que vão atrás de prazer e ponto. São tendências que apontam a mudança de mentalidade. Cada vez menos pessoas vão querer se fechar numa relação a dois e optar por relacionamentos mais soltos. Se bobear, minha tataraneta (ELA TEM UMA NETA DE 15 ANOS) vai dizer: “Gente, tadinha da minha tataravó, precisava ter um parceiro só para tudo” (RISOS).

MC O que você está propondo é uma espécie de poliamor?

RNL De certa forma, sim. O poliamor implica ter relações sexuais e afetivas com pessoas diferentes. É assim: eu amo meu marido e transo com ele, mas também posso transar com outras pessoas, ir com elas ao cinema, viajar. Fazer o que quiser, com quem quiser, sem obrigação de exclusividade. Eles não amam com o sentimento de posse sobre o outro, por isso não sentem ciúme. Para eles, o ciúme está ligado ao medo da perda.

MC Mas esse amor livre não poderia facilitar o abandono, aumentar a possibilidade da perda? Ou não seria uma forma de se proteger contra ela?

RNL Mas nesse tipo de relação livre não existe a possibilidade de ser trocado, porque as pessoas não precisam escolher. Veja, muitas pessoas são abandonadas, certo? Aposto que 100% delas viviam uma relação supostamente monogâmica. Ou seja, uma relação fechada não é garantia de que você nunca será abandonado. A vida toda nós fomos instruídos a dirigir nossa energia amorosa e sexual para uma pessoa só e é nisso que a gente se apega. Daí, se isso não dá certo, sofremos horrores. Sentimo-nos abandonados, jogados às traças. Mas, na verdade, o abandono acontece já nos primeiros segundos de vida. No momento em que saímos do útero da mãe, já vivemos o sentimento de falta. Aquele conforto e segurança, não teremos nunca mais. Por isso, crescemos tentando reeditar o que tínhamos no útero. E, com essa nossa cultura, a coisa fica ainda pior. Em vez de ensinar o ser humano a viver sozinho, a sociedade prega que é preciso achar alguém que o complete, sua alma gêmea. Isso é a ilusão do amor romântico.

MC Você acha que daqui a 40 ou 50 anos os casais monogâmicos serão minoria? Sofrerão preconceito?

RNL O que eu espero é que haja espaço para tudo, sem preconceitos. Não seria certo que a regra fosse “agora todo mundo vai ter de transar com todo mundo” e que os casais que optaram pela monogamia ficassem excluídos. O importante é que cada pessoa escolha sua forma de viver e não reproduza um modelo por inércia nem medo de sofrer preconceito.

MC A internet ajudou a acelerar essas transformações?

RNL Sem dúvida. Ali, tudo é permitido. Quando criaram os primeiros chats, eu fiquei louca para saber como era o sexo on-line. Em 1998, por pura curiosidade antropológica, passei alguns dias fazendo sexo virtual. Queria muito saber se era possível sentir prazer com uma pessoa a distância, e hoje sei que é. E eu não me masturbava, viu? Não conseguia digitar e me tocar ao mesmo tempo, mas quando acabava a transa me sentia exausta, satisfeita mesmo. Foi uma experiência muito legal.

MC Você já fingiu orgasmo?

RNL Ah, já. Há muito tempo. Devia ter uns 20 anos quando fiz isso pela última vez. Era uma garota ansiosa como tantas outras. Mas acho isso horrível. Sempre digo para minhas pacientes não fingirem, senão elas vão viciar o homem em um modelo errado, acostumá-lo a achar que orgasmo é algo fácil e corriqueiro. E não é! É uma maravilha que custa para ser alcançada. Isso está diretamente ligado à autoestima. A mulher que gosta de si não tem problemas em fazer o homem trabalhar mais e melhor para fazê-la gozar. Agora, a que sofre de baixa autoestima se sente constrangida e finge para acabar logo com isso...

MC Quando garota, você não sonhava com o príncipe encantado?

RNL Não. E minha irmã dizia que eu tinha alma de homem, porque criticava o fato de ela ficar esperando o príncipe dela.

MC Feministas mais radicais não gostam que os homens paguem a conta. É o seu caso?

RNL Hoje eu pago, amanhã ele paga e depois dividimos. Prefiro assim. Cansei de ouvir mulher dizendo: “Ah, só me faltava essa: pagar motel!” ou “Não me incomodo de dividir restaurante, cinema, mas motel quem paga é ele”. Isso me revolta. Se os dois vão ter prazer, não há qualquer problema em dividir a conta. A mulher não é uma prostituta que está ali para servi-lo e por isso cabe a ele pagar por tudo.

MC Mas e se o homem quiser pagar? Qual o problema?

RNL A questão que eu quero colocar é chega de que “homem deve pagar a conta do motel simplesmente por ser homem”. As mulheres querem os benefícios da liberação feminina — tipo casar dez vezes, transar na primeira noite, ganhar bem —, mas não querem o ônus. Se os direitos são iguais, são iguais também os deveres. Isso é puro machismo! Não conheço homens que sustentem a mulher e não usem isso contra ela. O dinheiro confere poder, faz com que a gente se sinta superior. Tanto que eu, se só tivesse duas opções, sustentar ou ser sustentada, ficaria com a primeira. Deus me livre ter de pedir dinheiro para comprar minhas coisas (RISOS).

MC Condena o cavalheirismo?

RNL Não, mas sei que ele é uma herança da cultura patriarcal da Idade Média que se disfarça de gentileza para atestar a força masculina e a fragilidade feminina. Gentileza é uma via de mão dupla. A mulher também pode mandar flores, assim como o homem pode ser gentil cozinhando. É tudo convenção. Que tipo de homem deseja proteger uma mulher? Certamente não um que a veja como uma igual, mas aquele que se sente superior a ela.

MC Por isso o homem está em crise?

RNL Sem dúvida. Para os que não se libertaram do mito da masculinidade (ou seja, a maioria), as mulheres que combatem o cavalheirismo são uma afronta. Eles se sentem ameaçados, pois não conhecem outro papel senão o de guardiões, protetores. Para eles, essa mudança é muito nova. No século 19, o marido tinha o direito de bater na mulher com uma vara do tamanho do seu antebraço e da grossura do seu dedo médio. Parece piada, mas é verdade! Depois me perguntam se eu sou feminista. E dá para não ser? Só não é feminista quem quer continuar vendo a mulher ser oprimida.

MC A febre dos sex shops mudou o padrão dos relacionamentos?

RNL Não. Mas deveria. As mulheres, principais frequentadoras de butiques eróticas, ainda ficam tímidas. Compram, no máximo, pequenos artigos para se masturbar. Não para transar junto com o parceiro, porque os homens entram em competição e acham uma ofensa. Chega disso, gente (GRITA)! Temos de combater o preconceito pelo menos na hora da transa. O sexo com o parceiro e o vibrador ao mesmo tempo é fisiologicamente imbatível. Enquanto o parceiro cuida da penetração, o vibrador estimula o clitóris e o orgasmo é duplo, mil vezes mais intenso. Incomparavelmente melhor.

MC Você e o Flávio usam? Isso não é um problema para ele?

RNL Usamos, claro. O Flávio é superbem resolvido. Uma vez fomos à Praia da Pipa e, quando me dei conta de que tinha esquecido o vibrador, peguei um táxi e rodei Fortaleza inteira atrás de um sex shop. Comprei um novo, grandão. Para que vou me conformar com um orgasmo simples se posso ter um duplo?

MC O que é mais comum: que a pessoa sofra porque foi traída ou que ela sofra porque, depois de traída, foi abandonada?

RNL As pessoas morrem de medo do abandono, e o problema é justamente relacionar isso à traição. Uma coisa não tem a ver com a outra.

MC Nesse caso, estamos falando da traição simplesmente sexual. E quando ela é emocional, quando existe um envolvimento amoroso?

RNL Não usaria a palavra traição em nenhum desses casos. É pejorativo demais! Trair, para mim, é alguém estar comigo por algum interesse e não por amor. Relação extraconjugal não é traição, é a coisa mais banal que existe. As pessoas deveriam se preocupar em responder a duas perguntas: 1) me sinto amada?; 2) me sinto desejada? Se a resposta for sim para as duas, tenho certeza de que está tudo bem na relação. No fundo, isso é o que importa.

Dispensa Legenda na Foto.

MC E se a resposta for não?

RNL Aí a questão não é ter ciúme ou ser traída. É se vale a pena continuar numa relação mesmo sem ser amada. Na minha opinião, quem não se sente amado deve partir para outra. Isso é vida. Tem pessoas infelicíssimas dentro do casamento, se agarrando como náufragos um na perna do outro só para não ficar só. Isso é uma fantasia.

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