terça-feira, setembro 26, 2017

Por que a mídia reclama de Trump?








Trump faz discurso contra ditaduras na ONU. Por que a mídia reclama… de Trump?

por Flávio Morgenstern(*).




Donald Trump, o presidente americano, fez nesta semana seu primeiro discurso na ONU, em Nova York. Fiel a seu estilo, Trump foi muito além da camisa de força do decoro e disparou contra toda sorte de ditaduras pelo mundo. Criticou o fundamentalismo islâmico, o socialismo e o próprio globalismo, encarnado na própria ONU.

A ONU, órgão respeitado e não questionado por praticamente nenhuma autoridade ou jornalista no mundo, usada como argumento de autoridade em questões que variam de saúde e educação a ciência e geopolítica, voltou à baila, agora como alvo, por Donald Trump ser o primeiro presidente americano com discurso e prática abertamente anti-globalista.

O conflito atual surpassou esquerda e direita, e hoje é mal compreendida por jornalistas e analistas como uma discussão entre “nacionalismo e globalização”, usando-se o termo “populismo” para descrever como os assim pejados como “nacionalistas” ganham eleições.


É uma dicotomia que poderia ser muito mais bem descrita como uma disputa entre soberania nacional e a governança global, tendo justamente a ONU como principal legislador, julgador e executor de leis em nível transnacional de maneira integralmente não-eleita, sem consulta popular e representatividade.


É o que Donald Trump e alguns estudiosos do fenômeno denominam como “globalismo”, e jornalistas acostumados a palavras-chave estanques que aprenderam antes de estudos mais profundos ganharem a Academia insistem em denominar como um discurso contra a globalização, que é quase o oposto do globalismo.

Um discurso contrário a ditaduras, chamando terroristas islâmicos de terroristas islâmicos e ainda mais anti-globalista na própria ONU é um dos eventos mais significados da administração Trump, algo a ser lembrado pela História que, até o presente momento, tratou a ONU como a pura verdade, paz, amor, caridade e bondade encarnados.

Trump “chocou” ao afirmar o que sempre afirmou, em plena ONU: “Como presidente dos Estados Unidos, eu sempre colocarei a América em primeiro lugar” [America first], o que jornalistas e analistas preguiçosos tratam como “nacionalismo”. Foi um dos momentos mais aplaudidos.

A continuação de sua fala é reveladora: “tal como vocês, como líderes de seus países, sempre farão e sempre deverão fazer : colocar seus países em primeiro lugar”. Muito antes de um discurso nacionalista (“meu país é melhor do que o seu”), tal como no federalismo americano tão defendido por Trump (em que o poder está dividido pelos estados, e não concentrado no governo federal, chefiado por ele próprio), é um clamor pelo poder do Estado-nação, que Trump reiteradas vezes definiu, ainda em campanha, como o melhor modelo de governança: todos os líderes governam para seu povo, e não para… os burocratas da ONU.

Se ainda não ficou claro, Trump falou que às vezes é preciso trabalhar com “unidade e harmonia”. Porém, acrescentou: “Enquanto eu estiver no cargo, colocarei os interesses americanos sobre todos. Mas, cumprindo nossas obrigações com as outras nações, nós também percebemos que é do interesse de todos buscar um futuro onde todas as nações possam ser soberanas, prósperas e seguras”. A lista de adjetivos começar com “soberanas” em plena ONU é uma declaração que faz os sábios pensarem, e os idiotas concluírem apressadamente com base em sua própria falta de conceitos.
Acordo nuclear com o Irã e Oriente Médio

Trump trouxe a teoria à prática, dizendo que o acordo nuclear com o Irã feito por Barack Obama, que dá 30 dias ao regime dos aiatolás para esconder fabricação de armas nucleares antes das inspeções internacionais, é um “vexame” para a América, e que provavelmente “não ouviremos mais falar dele”. E decretou: “O acordo com o Irã foi uma das piores e assimétricas transações nas quais os Estados Unidos já entraram”, e o líder do país dos aitolás é “exportador de violência, derramamento de sangue e caos”.

America first. Basta comparar ao próprio Barack Obama, que na ONU, reiteradas vezes, falou dos “erros” e “transgressões” (sic) da América diante de países nada errados como Irã, Arábia Saudita, Venezuela e a própria Coréia do Norte. Por que será que o slogan de Trump era “Make America great again“?

Trump ainda assegurou que a América continuará protegendo seus aliados na região, como Israel – postura diametralmente oposta à de seu antecessor.

Mais: a América ajudará a refugiados se instalarem em países próximos aos seus de origem. É muito mais barato e faz todo o sentido para os refugiados e para o Ocidente, se descaracterizando para se entupir de imigrantes, entre eles terroristas e pessoas sem nenhum desejo de adaptação. Além do mais, evita a hégira, que, se o Ocidente conhecesse, ficaria de cabelos em pé.
Coréia do Norte e o “Rocket Man”

Sobre a maior ameaça à paz no mundo hoje, a Coréia do Norte (o Estado Islâmico perdeu 70% do território que controlava no Iraque e na Síria, devido à mudança de posicionamento da América após Hillary Clinton deixar o cargo de Secretária de Estado, municiando grupos rebeldes contra al-Assad, entre eles os que formaram o Estado Islâmico), Donald Trump usou palavras não apenas duras, mas que não vestiram a camisa de força do protocolo:

“Os Estados Unidos têm grande força e paciência, mas se for forçado a se defender ou a defender seus aliados, nós não teremos escolha senão destruir totalmente a Coréia do Norte”. Trump ainda adicionou: “O homem-foguete [Rocket Man] está em uma missão suicida para si próprio e para seu regime”.

A mídia, como sói, tratou o epiteto como um “insulto estranho”. Trump acrescentou, até fazendo uma concessão à ONU: “Os Estados Unidos estão prontos, dispostos e capazes. Mas esperamos que isto não seja necessário. É para isto que serve a ONU. É o que os Estados Unidos defendem. Vamos ver o que eles fazem”.

A animação Team America, dos mesmos criadores de South Park, já havia tirado sarro, em 2004, da inutilidade dos discursos da ONU contra a Coréia do Norte. O diplomata Hans Blix, da Agência Internacional de Energia Atômica, usa o protocolo da ONU com suas “ameaças” assustadoras que deixam Kim Kong Il, o então Kim em chefe, com muito medo de perder o seu poder:

“Deixe-me ver suas armas de destruição em massa, ou então…” Kim 2 responde: “Ou então o quê?” “Ou então nós vamos ficar muito, muito bravos com você. E vamos escrever uma carta te dizendo quanto nós estamos bravos”. É a ONU descrita em um diálogo de 15 segundos.


Socialismo na Venezuela e Cuba

Sem medo de pegar mal para jornalistas que demoraram ao menos 12 anos para perceber que a Venezuela é uma ditadura, Donald Trump, assemelhando-se à descrição do filósofo Roger Scruton, afirmou que “[o] problema na Venezuela não é que o socialismo foi insuficientemente implementado, mas sim que o socialismo foi fielmente implementado”.

E acrescentou que, onde quer que tenha sido implementado, socialismo e comunismo causaram “angústia e devastação e fracasso”, e que são “ideologias desacreditadas”.

E não teve medo de dizer verdades também a Nicolás Maduro: a Venezuela hoje é um “estado selvagem economicamente esgotado”, e seu governo “tem infligido uma dor terrível e sofrimento na boa população do país”.

Trump ainda deixou bem claro, para os olhos estupefatos da ONU tão acostumados a passar a mão na cabeça de Cuba, que a América não irá diminuir as sanções em Cuba enquanto o regime de Raúl Castro não fizer reformas importantes em seu regime corrupto. Algo pode ser mais justo?
Globalismo e ONU

Muito mais do que a distante Coréia do Norte, os aiatolás atômicos ou refugiados que a ONU se preocupa mais como propaganda numérica do que como seres humanos, o que deixou os burocratas globalistas da ONU mais preocupados no discurso de Trump foi a relação da América com a própria ONU, considerada “consolidada” por si há muito.

Países com maior crença em uma governança global, sobretudo para ombrear a América e poder mandar em seu território, dispendem muito menos dinheiro para manter a ONU funcionando em Nova York. Desde 2000, a América aumentou em 140% o seu orçamento para com a ONU e dobrou o seu pessoal. E a mensagem de Trump foi clara neste sentido, até levantando os números no dia anterior.

Mídia

Não há o que Donald Trump possa fazer, incluindo observar o sol ou ajudar vítimas de furacões, que a grande e velha mídia não vá criticar e associar com autoritarismo e nazismo. Exemplos variam de Julian Borger comparando o discurso uma vez a George W. Bush e seu “eixo do mal”, e muito mais a Nikita Khrushchev, Fidel Castro e Hugo Chávez discursando na ONU, por nenhuma outra razão além de irritar, ou David Smith chamando Trump de “escória do planeta” por não seguir o protocolo – e se esquecendo que, nessa toada, acabou também ferindo o protocolo jornalístico, tornando-se uma “escória” quase tão auto-declarada quanto a declaração infeliz de Hillary sobre os eleitores de Trump.

Jornalistas se aboletaram para tratar o discurso de Trump como “belicoso”. Como uma “ameaça” ao mundo, como a manchete mais repetida para anunciar o discurso na ONU: “Em discurso na ONU Trump ameaça destruir Coréia do Norte” e suas variantes.

Para a grande e velha mídia, nenhuma palavra sobre os aliados, sobre o orçamento da ONU que pode marcar o futuro da instituição, sobre a soberania e o Estado nação.

Por exemplo, Sarah Snyder, professora de “direitos humanos” na American University’s School of International Service, afirmou à The Atlantic que é terrível que Trump tenha usado uma linguagem como “terroristas perdedores” [loser terrorists]. Para Sarah Snyder, os terroristas perdedores podem se tornar terroristas perdedores se forem chamados de terroristas perdedores. E então, teremos terroristas perdedores no mundo. Lógica não anda sendo o forte da intelligentsia.

Como pessoas como Sarah Snyder e David Smith podem dizer que Trump está fazendo um mal ao mundo, ao nomear os problemas do mundo e dizer que a América e a ONU precisam lidar com os males do mundo?

Por acaso acreditam que a retórica de Barack Obama, de não dizer quais são os males do mundo, acabou com os males do mundo? Acreditam mesmo que é Trump que está “ameaçando” destruir a Coréia do Norte, como se fosse alguém tão disposto a acabar com a vida dos norte-coreanos como, digamos, Kim Jong-un?

A credibilidade da grande e velha mídia está em queda brusca no mundo exatamente por isso: a mídia é monomaníaca, trata tudo de Trump como algo ruim por coisas que ela própria inventou de dizer sem pesquisar, e se esquece de fazer ao menos um sopesamento. Ora, quem, na vida real, acredita mesmo que Donald Trump seja tão ruim quanto Kim Jong-un? Quem não sabe que pode explodir com uma bomba de pregos na Europa graças ao terrorismo islâmico, e não à política de Trump em relação aos refugiados?

Como seria Donald Trump que “ameaça” o mundo na ONU? Se a ONU conseguiu se manter com uma imagem pública de perfeição na Terra até o ano passado para o mundo, mesmo acreditando em toda manchete sensacionalista com obsessão com Trump, quem acaba, menos lentamente do que parece, ficando melhor perante a opinião pública é o próprio Trump. Ou ao menos a ONU perde seu apelo. E sobretudo a mídia, que se torna insuportavelmente chata e repetitiva.

É possível acreditar em gente que não disfarça seu desgosto em falar, em 2017, que um presidente americano disse que o socialismo deu errado, que o Irã atômico é perigoso e o acordo de Obama foi um desastre, que os terroristas são uns losers?

Podem chamar de “populismo” o quanto for, Trump apenas disse verdades inconvenientes. Populismo não é ganhar eleições justamente com mentiras dóceis? A grande e velha mídia é que anda cumprindo tal papel.



(*)Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs" (ed. Record). No Twitter: @flaviomorgen

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