João Cesar de Melo(*)
O povão não lê a Folha de São Paulo, nem o Estadão, nem o Globo porque cada exemplar custa o preço de uma passagem de ônibus. Se não tem dinheiro para jornal, obviamente não tem dinheiro para assinar a Veja, ou a Época, ou a Isto É, ou a Piauí. O povão não lê os tantos blogs sobre política e economia que excitam a classe média porque não têm tempo para isso. Não acompanha a Globo News ou a Band News porque trabalha o dia todo. Não assiste o Willian Waack no Jornal da Globo porque o programa vai ao ar tarde demais. O povão tira suas conclusões a partir do que assiste no Jornal Nacional. O Jornal Nacional é a principal fonte de informação da maioria dos brasileiros.
Por muito tempo, não me deixei contaminar pelo frenesi anti-Globo porque sempre respeitei que os meios de comunicação privados tivessem seus posicionamentos em relação aos mais diversos temas. Não me deixava contaminar pelo frenesi anti-Globo porque, mesmo discordando da maioria de suas inclinações, eu reconhecia que a emissora prestava algum serviço público em suas novelas ao abordar temas como transplante de órgãos, câncer de mama, síndrome de down, autismo, racismo, homofobia, religião etc. A verdade é que a Globo contribuiu mais para algumas causas do que todas as iniciativas do governo até hoje. Porém, por trás dessa verdade existe outra verdade. Uma verdade dolorosa. Uma verdade vergonhosa. Uma verdade que vem se transformando num imenso absurdo através do Jornal Nacional.
Estamos num dos momentos mais delicados da história do Brasil. Excluo, só por um momento, a degradação da política brasileira. Refiro-me, nesse texto, apenas ao eminente colapso econômico. Uma situação que interfere diretamente na vida de todo cidadão, principalmente na vida dos mais pobres. Pessoas comuns estão perdendo empregos. Pessoas comuns estão perdendo clientes. Pessoas comuns estão perdendo suas únicas fontes de renda. Os salários de pessoas comuns estão sendo corroídos por uma inflação que sabemos que é muito maior do que o anunciado.
Até uma semana atrás, o Jornal Nacional noticiava tudo isso. Noticiava a duplicação do índice de desemprego e da inflação em um ano. Noticiava que o Brasil perdeu 3% de seu PIB no mesmo período. Noticiava o resultado das pesquisas que indicam o pessimismo do comércio, da indústria, do mercado financeiro e até da dona de casa. Até uma semana atrás, o Jornal Nacional noticiava o desmoronamento da economia brasileira. Parou de noticiar desde quando foi aceito o processo de impeachment contra Dilma.
Desde então, o Jornal Nacional atua como advogado de defesa do atual governo. Reproduz os discursos de Dilma até três vezes num mesmo noticiário. Destaca os aplausos dos militantes petistas, as desculpas esfarrapadas de seus líderes e as falas ultrajantes de Lula. Ontem a noite, o telejornal noticiou que uma manifestação da CUT em favor de Dilma, no Rio de Janeiro, contou com 10 mil pessoas, sendo que as imagens aéreas mostravam que não havia nem um décimo desse número.
As poucas entrevistas com pessoas que pedem o afastamento de Dilma foram editadas com o cuidado necessário para que nenhum argumento fosse exposto de tal forma que um telespectador mais humilde pudesse compreendê-lo. Não foi feita uma única entrevista com os Juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal, autores do pedido de impeachment. O Jornal Nacional não mede esforços para fazer o povão acreditar que o processo de impeachment é obra de Eduardo Cunha, cria situações para mostrar os membros do governo dizendo que tudo não passa de um golpe do PSDB, “inconformado com o resultado das urnas”, oferece todo o espaço necessário para o governo dizer que Dilma resolverá a crise que ela mesma criou.
Desde que o pedido de afastamento de Dilma foi aceito, o maior telejornal brasileiro não se deu trabalho de explicar a relação entre a irresponsabilidade fiscal dos últimos anos com a atual crise econômica. Se o Jornal Nacional tivesse um mínimo de honestidade jornalística, repetiria todos os dias o seguinte: O desrespeito da Lei de Responsabilidade Fiscal pode levar o governo a ficar sem dinheiro para pagar os salários de servidores e pensionistas. Não diz isso porque sabe que, dessa forma, o povão entenderia perfeitamente os crimes que recaem sobre Dilma.
O Jornal Nacional não se importa que um possível arquivamento do pedido de impeachment significaria um duro golpe na moral dos brasileiros – o povo que grita “Fora Dilma” sendo obrigado a ver o desejo dos partidos da extrema-esquerda brasileira prevalecer.
Então, eu me lembro de que, dois dias atrás, num mesmo bloco foi noticiada a “vitória da oposição” na Venezuela e a vitória da “extrema-direita” na França, com direito a carinha de nojo do Willian Bonner. Isso é a Globo. Isso é o Jornal Nacional. Sempre dando conotação pejorativa a tudo o que não é esquerda. Evitando ao máximo relacionar o chavismo com extrema-esquerda. Esforçando-se ao máximo em impedir que as pessoas correlacionem o colapso econômico na Venezuela com as ideias socialistas. Fazendo o diabopara que o telespectador não se dê conta de que o PT é um partido de extrema-esquerda e que desde que assumiu o poder tenta impor sua própria revolução bolivariana.
A verdade: A Rede Globo se tornou o maior veículo de publicidade do socialismo.
Continuo defendendo que todas as empresas privadas de comunicação tenham liberdade para tomar partido sobre qualquer assunto, mas espero que os brasileiros um dia enxerguem a cumplicidade do Jornal Nacional no verdadeiro golpe que está em curso, o golpe do PT contra o Brasil.
A Rede Globo, através do Jornal Nacional, está ajudando o PT a rasgar a Constituição do Brasil. Está tentando tirar de 200 milhões de cidadãos o direito de punir um partido que vem a 13 anos dilapidando a economia do país.
(*)Arquiteto, artista plástico e escritor. Escreveu o livro “Natureza Capital”.
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