por Floriano Pesaro (*)
Uma das festividades mais ricas e simbólicas do calendário judaico acontece na celebração do Seder de Pessach. É quando comemoramos, ao redor de uma mesa farta e em companhia da família estendida e, por vezes, de vários amigos, a passagem da escravidão para a liberdade e a nossa constituição como comunidade no deserto.
É uma destas ocasiões que nos permite refletir sobre liberdades pessoais, sobre sociedade e sobre como tratar o outro, pois a sabedoria judaica nos insta a que recordemos que nós já fomos o estrangeiro na casa do outro.
Como cientista social, fico imaginando como devemos fazer para não nos esquecermos desta nossa traumática experiência e para que tentemos olhar ao nosso redor e ver se não estamos, por acaso, sendo hoje os egípcios de outras pessoas.
Em nossos dias, a escravidão se manifesta pelo domínio econômico, pela falta de reconhecimento do trabalho da classe mais humilde, daquele que na noite de Pessach talvez esteja apenas passando bandejas e lavando os pratos.
Simbolicamente, podemos todos ser um pouco mais gentis e reconhecer o fruto do labor daquelas pessoas que, ao lavarem nossos pratos e arrumarem nossas mesas junto com nossas famílias, possibilitam de alguma forma que esta celebração tão fundamental de nossa tradição aconteça num clima festivo e farto.
Adicionalmente, no caráter mais universalista, Pessach foi a transição dos antigos israelitas se fortalecendo e tornando-se coletivamente o povo judeu. Como povo, nessa jornada, a responsabilidade social de aceitar e lutar pela liberdade própria e de todos assumiu para sempre uma conotação relevante.
O próprio livro da narrativa de Pessach, a Hagadá, começa com o mandato para que todos os famintos venham e comam.
A fome e a miséria. Estes são temas indissociáveis da política e da sociedade desde a Antiguidade até os dias de hoje. Em Pessach, O povo judeu pode se permitir então repensar questões como estas e reavaliar suas responsabilidades sociais diante da memória de seu passado milenar.
Em nossos dias, infelizmente, ainda persiste a escravidão sexual, o tráfico humano, a opressão econômica, as guerras tribais e outras situações humilhantes que tornam o ser humano ‘o estrangeiro’.
Neste Pessach, sugiro que possamos aproveitar os vários aspectos que estas celebrações nos sugerem e que, além de relembrar nossas conquistas inabaláveis do passado, busquemos outros meios para fazer ainda mais parte desta corrente de liberdade.
Chag Sameach!
(*)Floriano Pesaro
Sociólogo e Vereador por São Paulo
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