por Henrique Veltman
Ma Nishtaná a Laila azé micol a leilot?
O que diferencia esta noite de todas as outras noites?
Tradição.
Tradição é isso, costumes que vão se repetindo e viram uma regra a ser seguida. A palavra vem do latim e significa trazer, entregar, transmitir, ensinar. No caso específico desta noite, tradição é a transmissão dos costumes de pais para filhos, no decorrer dos tempos, ao sucederem-se as gerações, Le dor va dor. É a memória cultural de um povo, um conjunto de idéias, usos, memórias, recordações, símbolos conservados pelos tempos, pelas gerações.
Nos últimos dias, uma mensagem tem sido repetida na internet, lembrando um momento vivido, em 1954, por David Ben Gurion, então Primeiro Ministro de Israel. Eu e muitos dos que aqui estão reunidos com certeza lembram do episódio, mas vale a pena relembra-lo. Ben Gurión viajou aos EUA para reunir-se com o presidente Eisenhower e solicitar apoio e ajuda para os momentos difíceis pelos quais passava o jovem Estado de Israel.
Num encontro com o então secretário de estado, John Foster Dulles, conhecido por seu reacionarismo e antissemitismo latente, este o encarou com um alto grau de soberba e perguntou: – “Diga-me, Primeiro Ministro, a quem você e seu Estado representam realmente? Acaso aos judeus da Polônia, Iemen, Romênia, Marrocos, Iraque, da União Soviética ou do Brasil – são todos uma mesma coisa? Depois de 2.000 anos de Diáspora é possível falar de um só povo judeu, de uma única cultura, tradição ou costume judaico?”.
Ben Gurión respondeu, e toda essa conversa está nas memórias do Primeiro Ministro: “Veja Sr. Secretário. Há mais de 300 anos atrás zarpou da Inglaterra o navio Mayflower, que transportava os primeiros colonos que se instalaram no que hoje é a grande potência democrática dos Estados Unidos de América. Te rogo que saias a rua e pergunte a dez meninos norte-americanos o seguinte: – Qual era o nome do capitão do barco? Quanto tempo durou a travessia? O que comeram os tripulantes durante a viagem? E como se comportou o mar durante o trajeto? Seguramente não receberás respostas pontuais”.
“Agora preste atenção. Há mais de 3.000 anos que os judeus saíram do Egito. Te peço que em algumas de suas viagens pelo mundo, trate de encontrar-se com dez meninos judeus em diferentes países e pergunte-lhes como se chamava o capitão desta saída; quanto tempo durou a travessia; o que comeram durante a viagem e como se comportou o mar. Quando tiveres as respostas, e se surpreender, trate de se recordar, refletir e avaliar a pergunta que me acaba de formular”. O Senhor me entende, Secretário?”
Tradição, claro.
Pessach é a maior e mais antiga das festividades judaicas. Também festa da primavera: os frutos saem da casca, como Israel saiu do Egito.
Há alguns dias, enviei para minha mulher e minhas cunhadas uma mensagem de Chag Sameach. Nesse e-mail eu dizia que é uma tradição, recente, enviar votos de Chag Sameach, Boas e Alegres Festas, especialmente em Pessach, a Páscoa. Nesses meus votos eu salientei o espírito libertário que impregna a História por trás da ceia de Pessach.
Em primeiro lugar, é a reunião de familiares e de amigos, sempre na esperança de que a Tradição, como me dizia o meu saudoso sogro Moishe Z’L, nas muitas ocasiões em que conversamos sobre o Judaísmo, não importa sob que forma, a Tradição continue. Nosso sonho libertário estabelece que nossa liberdade só será plena se todos forem livres. Assim, viver a saída do Egito é hoje olhar à nossa volta, criar e fortalecer laços de solidariedade com os que sofrem com a pobreza, o preconceito e todas as formas de violência.
fonte: Pletz
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