sábado, maio 30, 2015

A CBF é a cara do Brasil.









por Claudio Tognolli

Antes, entenda o caso aqui




Em julho de 2011 este blogueiro se encontrou por 3 horas, em São Paulo, com o renomado reporter inglês Andrew Jennings, da BBC. Era por ocasião do congresso internacional de jornalismo da Abraji, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, da qual sou diretor-fundador.

Vou reproduzir abaixo o texto do meu encontro com Jennings. Veja o que o inglês já antecipava sobre a nossa CBF e roubalheiras correlatas…

Relendo o texto, repenso a frase de Parreira: “A CBF é o Brasil que funciona.
Não é isso não, caro Parreira: a CBF funciona como o Brasil…

O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, e o ex-presidente da Fifa João Havelange fizeram um acordo com a Justiça suíça para pararem de ser investigados por corrupção, e assim escaparem de uma condenação. Esse acordo, cujo valor é esimado em 10,5 milhões de reais, foi assinado no ano passado (2010) por Havelange, Teixeira e pela Fifa. As informações foram relatadas com exclusividade pelo jornalista inglês Andrew Jennings, repórter investigativo do programa “Panorama”, da BBC – emissora de tevê britânica sinônimo de credibilidade e equilíbrio.

Jennings é autor da obra “Jogo Sujo – o mundo secreto da Fifa”, que vai ser lançado em São Paulo, às 19h00 desta terça-feira, na livraria Cultura do shopping Bourbon, na zona oeste. O livro foi editado pela Panda Books, de propriedade do jornalista Marcelo Duarte.

Depois de quase três horas de conversa, Andrew Jennings entregou este reporter um documento, datado do dia 24 de maio passado, ajuizado à Corte da cidade de Zuc, na Suíça. Nele, a BBC e um pool de jornalistas suíços, todos capitaneados por Jennings, postulam da Justiça suíça a liberação dos documentos que mostram o acordo judicial de pacificação. Na Justiça suíça, os casos de corrupção são encerrados quando as partes acusadas admitem, em uníssono, que se corromperam ou que ofertaram propostas ilegais. Quando as partes o admitem em juízo, basta que devolvam o dinheiro e a Justiça suíça encerra o caso de vez.

Nesse rito de pacificação judicial, estiveram envolvidas três partes, segundo Jennings. A Fifa, Teixeira e Havelange. Os documentos entregues por Jennings mostram que Havelange é identificado como Z e Teixeira como Y. A BBC e os jornalistas suíços conseguiram vitória na Corte de Zuc, mas as partes envolvidas apelaram pela não-divulgação do acordo de pacificação, conhecido como “settlement”. O pool de jornalistas já apelou para a Suprema Corte suíça, que fica em Lausanne.

“Esses documentos devem ser tornados públicos em 12 meses caso continuemos vencendo. O dinheiro do povo brasileiro foi usado para esquemas de corrupção e a CBF privatizada. O ministro Orlando Silva disse que Teixeira é inocente. Eu digo o contrário. O governo brasileiro tem obrigação de mandar um representante à Zuc e à Lausanne e tornar esses documentos públicos, a bem do interesse do dinheiro dos seus contribuintes. O esquema da CBF acabou virando um esquema igual ao da Fifa, um esquema de máfias”. Andrew Jennings obteve documentos, por exemplo, datados de 3 de março de 1997, que mostram um desvio de 1 milhão de meio de euros a alguém chamado no documento de JH, que segundo Jennings é João Havelange. Já o dinheiro de Teixeira, que supera o de Havelange em pelo menos alguns milhões de euros, teria sido canalizado a uma empresa chamada Sanud, que, segundo Jennings, não passa da empresa montada por Teixeira com as letras dos primeiros nomes de seus filhos, R.L.J.

Para você entender as origens dessa trama, obviamente é necessário ler o livro de Jennings. Por exemplo: à página 261 está escrito: “O magistrado suíço Thomas Hildbrand estava investigando o que os executivos da empresa ISL tinham feito com mais de 50 milhões de libras pagos pela rede Globo de Televisão à ISL pelos direitos de televisão das Copas de 2002 e 2006. O dinheiro deveria ter sido repassado à Fifa. Não foi. Depois que a ISL faliu, na primavera de 2001, já não era mais possível esconder o fato de que o dinheiro tinha sido surrupiado”. É nesse esquema da ISL que a Fifa, Teixeira e Havelange estão metidos até o pescoço.

Jennings explica o trecho. “A TV Globo estava realmente puta da vida com Ricardo Teixeira, e colocou seu melhor repórter investigativo (Marcelo Rezende) para ir atrás dele, e por algum motivo a Globo e Teixeira se tornaram amigos de novo. Estamos tratando apenas de futebol, não de segurança pública. Por acaso o Brasil tem medo de ser invadido por tropas? Claro que não. Nem os Estados Unidos fariam isso para o Brasil, porque eles já o fazem economicamente. É apenas futebol, repito. Mas o senhor Teixeira tem aquilo que na Inglaterra nos chamamos de checked record, ou seja, ele tem o registro de sua carreira, seu histórico, já postos em cheque. As pessoas já olham para Teixeira e dizem ‘nós já conhecemos o seu jeito de fazer negócios, que não é o mais legal’. Ele já tem uma carreira posta em cheque. O que Teixeira deveria fazer, em nome da transparência, é colocar todos os documentos da CBF online, porque não há razão para que não haja transparência no futebol, afinal isso envolve dinheiro de pagadores de impostos, e todos nós temos direito de saber disso. Dê às pessoas o direito delas saberem. Teixeira que dizer que a CBF é privatizada, mas ela não é, ela é publica, é uma organização dos jogos do povo brasileiro. O futebol pertence às pessoas e a CBF não pode ser usada para vender produtos de maneira privada. Me pergunto: se tudo é limpo, legal, por que não tornar transparente? Eu não sei porque os políticos de Brasília e o próprio governo não dizem: precisamos ir até a Suíça dar uma olhada nessa investigação. O Lula já deveria ter dito a ele: senhor Teixeira, o senhor está lidando com o dinheiro do contribuinte. Ainda não é tarde para se colocar esses documentos online. Por que não colocar online todos os gastos da CBF?

CADEIA - Jennings é uma metralhadora giratória. Fala por duas horas maciças, sem parar. “Eu disse uma vez brincando que Ricardo Teixeira deveria ir para a cadeia, mas o mais importante é que ele está sendo investigado. Ele está sendo investigado por detetives especializados em fraude. Eles estão investigando sua longa história de corrupção na Fifa. O Brasil é um país democrático e fez a sua transição dos maus dias. Agora o Brasil é um país organizado, que funciona. Como vocês podem suportar à frente da CBF uma pessoa com tamanha história de corrupção?”, pergunta-se Jennings.

O jornalista inglês avalia que “as Copas do Mundo são criadas para criar empregos para o sistema, típico de gangster da máfia que foi criado pela Fifa. É uma máquina que precisa ter lubrificação. A estrutura da Fifa é uma estrutura do crime mafioso tradicional”

O interesse de Jennings pelo tema começou em 1998. “Foi quando eu li num jornal um perfil do presidente do Comitê Olímpico Internacional, Juan Antonio Samaranch. Aí eu vi que ele tinha feito parte da ditadura espanhola. Você não tem que ser um professor para saber que ele era um fascista. Portanto eu pensei: se ele foi ministro dos Esportes da Espanha nos anos 60, ele esteve, é óbvio, no lado errado durante a Segunda Guerra Mundial e, portanto, ele deveria ter uma natureza discriminatória, como aliás todos os fascistas têm. O fascista é o tipo de pessoa que olha pra você e fala: eu sou muito mais moral que você. Ele era o tipo de pessoa que falava ‘faremos esportes e jogos para vocês para diverti-los e usando da ética’. Ó, Deus, eu não preciso desse tipo de ética, porque eu sei qual é a ética dos fascistas. Logo descobri que por 37 anos Juan Antonio teve uma má visão do sistema democrático. Esse tipo de gente acha que democracia não funciona, é uma coisa má. Aí eu comecei a entender porque ele não deixava nenhuma transparência nos testes de doping dos Jogos Olímpicos. Porque, afinal, quem é fascista não tem código moral. Ele é um homem sem moral. O papel dele foi privatizar os Jogos Olímpicos, e obviamente a Fifa copiou esse modelo de privatização dos esportes. Eu soube que nos últimos 20 anos do fascismo nem um regime fascista foi. Foi uma nação de gangsters. Juan Antonio renunciou e se aposentou em 2001. Mas sua tradição foi seguida por Ricardo Teixeira na Fifa”.

Vale lembrar que Havelange tinha cargos no Comitê Olímpico Internacional desde 1963. E foi o sétimo presidente da Fifa, entre 1974 e 1988. Diz Jennings que a “contaminação” com as “práticas fascistas” de Saramanch começaram nesses cargos.


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