domingo, junho 29, 2014

Governo abre saco de bondades às vésperas das eleições: o empresariado vai abocanhar a isca?.











O governo federal abriu seu saco de bondades: Reintegra, Refis, PSI, ampliação das margens de preferências de produtos nacionais em licitações, novo acordo automotivo com a Argentina, isenção de IR para abertura de capitais por empresas de médio porte e desoneração da folha de pagamentos estão entre as medidas mais relevantes. Tudo às vésperas das eleições. Vai colar?


Não posso afirmar que isto garantirá a apoio dos empresários, mesmo porque o PT tem um longo histórico de desapreço à sua palavra, embora reconheça que, segundo eles próprios, tenham saído satisfeitos com tais medidas. Convém, no entanto, analisar o seu alcance e demonstrar aos leitores se atendem às condições para o estabelecimento de um cenário estável, atraente e confiável para os investimentos por parte da indústria.


Primeiramente, vou esclarecer aos leitores do que trata cada um dos itens desse pacote e comentar sobre eles ao final: 


Começando com o Reintegra, o modelo que o governo alega que será permanente manterá uma amplitude de devolução de parte do valor exportado entre 0,1% e 3%, sendo que atualmente é de 0,3%. Enquanto chegar a 3%, por enquanto ao menos não passa de promessa, o mais esperável é que se mantenha nesta faixazinha insignificante, com o risco mais real de cair a 0,1%.


O caso do Refis é o mais significativo do desespero do governo em fazer caixa, pois o seu uso abusivo já tem criado uma cultura simpática à sonegação fiscal, por empresários que sempre contam com novas edições do programa, fazendo de palhaços os que pagam impostos em dia. Na verdade, o prejuízo é bem maior do que apenas botar-lhes um nariz vermelho, pois estes, relativamente descapitalizados, acabam sofrendo uma concorrência desleal com os sonegadores. 


Por sua vez, o PSI - Programa de Sustentação do Investimento, ganhará neste ano uma nova modalidade, para que as fábricas possam comprar ou contratar por meio leasing máquinas e equipamentos, com juros subsidiados pelo BNDES. A medida satisfez o empresariado que reivindicou tal facilidade por meio do Forum Nacional da Indústria. 


No campo das licitações públicas, o governo unificou em 25% a margem de preferência para as compras públicas, percentual que será a aplicado até 2020 nas licitações federais para produtos manufaturados e serviços nacionais. Isto significa que produtos e serviços nacionais que sejam até 25% mais caros que os importados terão preferência nas licitações. 



Quanto à questão da renegociação do acordo automotivo entre Brasil e Argentina, é sintomático do dirigismo estatal sobre a economia, mormente por estabelecer o privilégio para um setor em detrimento de outros e de forma mais acentuada, ao estabelecer cotas de participação nos mercados um do outro (participação mínima nos respectivos mercados de veículos, de 11% de automóveis argentinos no Brasil e 44,3% de brasileiros na Argentina), cujo acompanhamento é uma tarefa difícil de realizar e que sempre acabará em pretextos para que especialmente a Argentina, como tem feito amiúde, denuncie o alcance de tais limites como forma de bloquear novas importações. O só fato de tais cotas existirem cria um artifício broxante para o mercado, especialmente para os participantes minoritários.


Sobre a isenção de IR para a abertura de capital das empresas de médio porte, a ideia em si não é má, a não ser pelo efeito injusto de escolher quem pode ou não ser agraciado com a nova medida. Segundo a Agência Brasil:


A isenção de Imposto de Renda sobre ganho de capital, que hoje está em 15%, é uma das ações previstas até 2023. A medida é válida para empresas com valor de mercado inferior a R$ 700 milhões. “Queremos permitir a expansão dessas empresas no Brasil”, declarou, durante a cerimônia na Bolsa de Mercadorias e Futuros - BM&F Bovespa.


Mantega estima que o impacto fiscal dessas medidas seja pequeno, tendo em vista que, atualmente, 11 empresas desse porte atuam na bolsa. “Novas empresas não entrariam, ou entrariam muito devagar, se não fizéssemos essas medidas. Praticamente, estamos falando de algumas dezenas de milhões”, apontou, sem definir valor exato, que ainda será calculado. De acordo com a Bovespa, o potencial é que 15 mil empresas possam se habilitar a abrir capitais. “É uma forma de financiamento mais barato: a capitalização das empresas, adquirindo um sócio”, destacou.


Por fim, a desoneração da folha de pagamentos vai contemplar 56 setores da economia em percentuais que vão de "expressivos" 1 a 2% (Veja aqui a casuísta tabela). Como diz a música: “por que não eu, oh oh, por que não eu?”


Vamos agora aos comentários:

Cumpre primeiramente esclarecer que nem na União Soviética, o experimento socialista mais radical da história, conseguiu-se implementar um modelo produtivo 100% estatal. Sempre houve um número mínimo de empresas privadas formalmente estabelecidas, além de um mercado negro do qual dependia crucialmente a própria sobrevivência do regime, razão pela qual era frequentemente tolerado, de forma que a alta burocracia sempre soltava mais o torniquete quando um estado de colapso vinha se aproximando.


Isto parece ser exatamente o caso brasileiro, ou de outra forma não teríamos todas estas medidas sendo implementadas às vésperas de eleições justamente em um momento em que a popularidade da presidente Dilma Rousseff e a reputação do PT vem rolando morro abaixo. 


Tratasse de uma convicção, objeto improvável de se encontrar nas bagunçadas gavetas mentais da cabeça do ministro Guido Mantega, certamente teriam sido aplicadas há muito mais tempo. 


Isto, porém, não significa de minha parte uma aprovação entusiasmada, embora possivelmente venham a produzir algum resultado um pouco melhor do que a política econômica que vinha sendo mantida. Explico:


Pra começar, todas estas alterações foram implementadas por atos administrativos, mormente por decreto, e já isto denuncia o caráter precário das decisões, já que não foram firmadas por lei.


Ademais, nada garante que o PT venha a ser laureado com mais um mandato presidencial, de modo que um novo presidente possivelmente venha a revogá-los (Mesmo que venha a construir uma política econômica mais benéfica aos empresários). Assim sendo, o PT faz como aquele promesseiro esperto que põe um de seus parentes para subir as escadarias de joelhos em seu lugar. 


Outro fator importante é que em todas estas medidas o poder sobre o direito de propriedade sempre continua com o governo, que pode atenuar ou agravar conforme as suas conveniências, que são antes políticas do que econômicas. 


Confiram: o Reitegra é um programa de devolução de parte do valor exportado; o Refis é um programa de parcelamento de dívidas tributárias, sobre as quais rolam juros, ainda que subsidiados (com o nosso dinheiro - é bom salientar), o PSI, da mesma forma, financia com juros subsidiados provenientes dos nossos impostos e em concorrência com o setor bancário privado a compra dirigida de máquinas e acessórios; e assim também a política absurda de licitações públicas que privilegia preços até mesmo 25% mais altos para produtos nacionais, que no caso desperdiçam dinheiro público a troco de proteger empresários incompetentes. 


O que eu quero dizer aqui é que uma autêntica economia de livre mercado cria condições de re-investimento por meio do acúmulo de sua própria poupança, enquanto que o que vemos aqui são meras concessões precárias do governo em dispor temporariamente de sua arrecadação que nada mais é do que fruto do confisco do capital privado por meio de uma pesada tributação. 


O filósofo Hans Hermann-Hoppe explica como uma economia em que o direito de propriedade é submetido aos humores do momento por parte dos estados não consegue se desenvolver por falta de previsibilidade, pois a possibilidade de um empresário ser tungado justamente na hora em que começa a colher os primeiros frutos do seu investimento estará sempre lá, como um urubu à espreita. 


Além disso, como diz um ditado, o uso frequente do cachimbo deixa a boca torta: em nenhum momento dos três mandatos petistas, houve diminuição da arrecadação tributária, que ao contrário, veio mês a mês alcançando recordes. Isto porque o governo petista, ao mesmo tempo em que dava uma mão para cumprimentar por alguma pseudo-bondade, esticava a outra até os bolsos alheios para se compensar. Um caso célebre foi o expressivo aumento de IPI para bebidas alcoólicas e refrigerantes para servir como pagamento pela temporária redução das tarifas de energia elétrica. 


Neste campo, faz-se muito pior do que trocar seis por meia dúzia, especialmente quando se privilegiam alguns setores em detrimento de outros; Quem pode explicar isto de forma bastante didática é o impressionante artigo de Leonard Reed, intitulado "Eu, o lápis", no qual ele descreve uma infinita rede de colaboração entre agentes de vários países para que apenas um lápis venha a ser produzido. Para quem quiser assistir, há também uma versão animada:





Assim, um programa como o PSI, ao dirigir por meio de incentivos a compra de máquinas e equipamentos, despreza um fato tão banal quanto óbvio de que uma fábrica depende para produzir do preço do leite, das diárias de hotéis, das fraldas descartáveis, dos planos de saúde e enfim, da integração com toda a economia. 


Programas de incentivo dirigidos costumam criar uma abundância em alguns setores que não será plenamente aproveitada, bem como uma carência em outros que será sentida, e o que é pior, inviabilizará de alguma maneira até mesmo o consumo ou aproveitamento daqueles que foram aquinhoados com privilégios. É o caso de termos uma fartura de cadernos simultaneamente a uma falta de lápis, a título de exemplo.


Direito de propriedade, leis e tributos estáveis e iguais para todos e impostos módicos que favoreçam o autofinanciamento por meio do acúmulo da poupança privada - e não por mais endividamento com o governo que já prejudicou a economia por meio de pesados tributos - isto, sinceramente, é o que mantenho como uma consistente e verdadeiramente sustentável política econômica, mas que não consigo contemplar em praticamente nenhum item deste saco de bondades convenientemente lançado às vésperas de eleições.


sexta-feira, junho 27, 2014

Stephen Hawking e Mlodinow erram e dão mais evidências para a existência de Deus.


Stephen Hawking e Mlodinow erram e dão mais evidências para a existência de Deus.


por JOE HESCHMEYER






Há um velho ditado que diz “dê muita corda a alguém e ele vai se enforcar”. A ideia é que, se alguém está errado ou mentindo, quanto mais o tempo passa, mais óbvio isso se torna presente. Bem, a Bantam Books deu a Stephen Hawking e Leonard Mlodinow toda a corda que eles queriam, e o resultado é The Grand Design (O grande projeto), um novo livro no qual eles argumentam contra a necessidade (e a existência) de Deus. Aqui está o núcleo de seu argumento:

[Assim], como Darwin e Wallace explicaram como o projeto aparentemente milagroso de formas de vida poderiam aparecer sem a intervenção de um ser supremo, o conceito do multiverso pode explicar o ajuste fino das leis físicas, sem a necessidade de um Criador benevolente que fez o universo para o nosso beneficio. Como existe a lei da gravidade, o universo pode e vai criar a si mesmo do nada. A criação espontânea é a razão pela qual existe algo em vez de nada, por que o universo existe, porque nós existimos.

Eles, então, explicam a teoria básica por trás do “multiverso”, que pressupõe a existência de múltiplos universos:

De acordo com a teoria-M, o nosso não é o único universo. Em vez disso, a teoria-M prevê que muitos universos foram criados do nada. A sua criação não requer a intervenção de algum ser ou deus sobrenatural. Antes, essas múltiplos universos surgem naturalmente pelas leis físicas.

Vamos deixar de lado a questão da teoria do “multiverso”, que John Haldane aborda em First Things. Hawking e Mlodinow fizeram um trabalho completamente suficiente de derrotar seu próprio argumento. Vamos simplesmente delinear suas três principais afirmações acima:


  1. Afirmação 1: a criação espontânea é a razão pela qual existe algo em vez de nada, inclusive o universo; (“a criação espontânea é a razão pela qual existe algo em vez de nada, por que o universo existe”). Isso se aplica a todos os universos, o que significa que se aplica a todo o multiverso.
  2. Afirmação 2: a criação espontânea exige a lei da gravidade; (“como existe a lei da gravidade, o universo pode e vai criar a si mesmo do nada”, “Antes, essas múltiplos universos surgem naturalmente pelas leis físicas”).
  3. Afirmação 3: A multidão de universos são responsáveis ​​pela produção de afinadas leis físicas (“O conceito do multiverso pode explicar o ajuste fino das leis físicas”)


Reduzido a seu núcleo, o argumento se parece com isso:
a



O problema, é claro, é que isso é circular. Você não pode ter um universo sem que seja criado, você não pode ter criação espontânea sem as leis físicas, e você não pode ter as leis físicas sem um universo.

Como Hawking e Mlodinow admitiram, sem criação, não há nada. Para se ter qualquer coisa – um universo, um multiverso, a lei da gravidade “bem afinados” pelas leis da física, qualquer coisa – você tem de primeiro ter a Criação. E eles mostraram de forma bastante eficaz que a criação “espontânea” é impossível, uma vez que exige as leis físicas, como a lei da gravidade. Então, eles mesmos estabelecem que houve uma Criação, e que o universo/multiverso não pode (e não podia) criar a si mesmo.

Deste ponto de vista, parece que as duas únicas possibilidades são “Deus” ou o “um absurdo e irracional argumento circular”. Hawking e Mlodinow podem ser físicos brilhantes, mas pelo menos neste livro se apresentam como filósofos e lógicos pobres. Seus esforços fúteis para delinear uma história da criação ateísta dá mais credibilidade ao teísmo do que o ateísmo.



Publicado no Logos Apologética.

Tradução: Emerson de Oliveira


segunda-feira, junho 23, 2014

A ficção indígena desafia o bom senso e é puro artificialismo.





A ficção indígena desafia o bom senso e é puro artificialismo.
por Leo Danielle

O falso índio Paulo Apurinã foi estagiário da Fundação Nacional do Índio, no setor de expedição de Ranis. Foi lá que ele falsificou a identidade indígena dele e de vários familiares.


Megaron Txucarramãe  é cacique e um dos mais respeitados atuais líderes caiapós, de Mato Grosso. Falou e disse:

“Nós não vivemos mais como nos meus tempos de infância. A nova geração compreende a vantagem de ter um emprego, uma renda. Ela quer ter roupa de homem branco, celular e essas coisas de gente jovem”. (1)

E acrescentou:


"Os governantes precisam aprender que nossos filhos querem ter tudo o que os filhos do homem branco têm. Falar português, ir para a universidade e ser reconhecidos como brasileiros e índios”.

Entre índios e não índios, as diferenças vão se tornando fictícias. Muitos silvícolas têm uma vida semelhante aos não índios, com televisão, geladeira, fogão a gás e celulares, quando não motosserras. Os rapazes, se podem, vão ser universitários.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), encomendou uma pesquisa à Datafolha, a qual se realizou entre os dias 7 de junho e 11 de julho do corrente. Foram realizadas 1.222 entrevistas, em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do País. Segundo a pesquisa, 63% dos índios têm televisão, 37% têm aparelho de DVD e 51%, geladeira, 66% usam o próprio fogão a gás e 36% já ligam do próprio celular. Índios estão integrados ao modo de vida urbano, afirma pesquisa.

Mas, quando necessário, alguns se fantasiam de índios com vistosos cocares e arco e flecha.
Vemos que eles geralmente são tratados com artificialismo pelas autoridades. Eles são vistos como eles não são. Karl Marx tem uma explicação para isso!

Os índios brasileiros estão integrados ao modo de vida urbano. Televisão, DVD, geladeira, fogão a gás e celulares são bens de consumo que já foram incorporados à rotina de muitas aldeias. A formação universitária é um sonho da maioria deles.

Mas o artificialismo da questão indígena como é visto pelo CIMI e pela FUNAI não para aí. Antigamente muitos homens comuns faziam–se passar por nobres para obter o prestígio e as benesses desse status, hoje é o contrário: alguns brancos se fazem passar por índios para usufruírem dos benefícios de estarem ligados ao CIMI ou à FUNAI e assim ganharem terras. É forte. Será verdade? Veja a notícia abaixo: “Centenas de moradores são coagidos a fazer cadastro na Funai (Fundação Nacional de Índios) como se fossem índios para engrossar invasões de terra no sul da Bahia. A região vive um conflito permanente por causa da expulsão de agricultores dessas propriedades”.2

Irra! Que é demais! Mas esta é que é a verdade verdadeira. Alguns leitores se recordarão de que o cacique e deputado Juruna (1942 ou 1943-2003) denunciou a presença de brancos fazendo-se de índios na Bahia.

Para que fins? é a pergunta. Não é por mero diletantismo. Mas para obter terras da reservas indígenas, estando no fundo de quadro, deles ou de seus orientadores, engrossar as hostes da esquerda no Brasil.

__________
1 – Matheus Leitão (Folha de S. Paulo, 10 de novembro de 2012).


Fonte: IPCO

domingo, junho 22, 2014

O uso de crianças na guerra do Hamas.









por Deborah Srour




Em Outubro de 2011 estávamos todos unidos e emocionados assistindo ao vivo a soltura do soldado israelense Gilad Shalit das mãos do Hamas. Depois de 5 anos e 4 meses de angústia, preces e promessas, vimos o soldado magro, vestido como um palestino ser devolvido à sua família e ao seu país. Em troca, Israel soltou milhares de prisioneiros palestinos, o que fez o Hamas prometer continuar com os sequestros para obter mais solturas e quem sabe, outras vantagens dos israelenses.




Desde então, dezenas de tentativas de sequestros, não só de soldados mas de civis inclusive de mulheres, crianças, ocorreram. A mídia não considera tentativas mal-sucedidas notícia mas desde o ano passado foram 44 tentativas de sequestro de judeus. E finalmente, o que mais temíamos desde Outubro de 2011 aconteceu. Três estudantes judeus, dois de 16 e um de 19 anos foram sequestrados na quinta à noite. Um deles cidadão americano. O sequestro teria acontecido na região de Gush Etzion na Judeia.

Imediatamente ao ser noticiado, uma festa irrompeu em Gaza, com doces distribuidos nas ruas. Na sexta-feira e sábado Israel estava em preces e à busca dos três. No sábado a noite o Primeiro-ministro Benjamin Netanyahu acusou os palestinos do sequestro e responsabilizou o governo de união da Autoridade Palestina que junto com o Hamas são os principais promotores de incitação e ódio dos palestinos contra Israel.

Já na quarta-feira passada, choveram mísseis vindos de Gaza. Israel tentou responsabilizar o governo palestino de União, lembrando que Abbas havia afirmado que o novo governo iria honrar todos os acordos anteriores. Imediatamente e infelizmente, o governo de Obama disse que a Autoridade Palestina não era responsável pelo ataque já que a realidade é que a Faixa de Gaza estava ainda nas mãos do Hamas. Então aonde está a união? Aonde está a desculpa para negociar com o Hamas?

A posição americana foi confirmada pela Comunidade Européia e o resultado? O sequestro dos três estudantes no dia seguinte. Abbas disse que não poderia ser responsável já que a região do sequestro na Judeia estava sob o controle de segurança de Israel. Isto é o mesmo que dizer que os palestinos não são responsáveis por suicidas que se explodem em Tel Aviv. A identidade dos terroristas ainda não é conhecida mas hoje Netanyahu afirmou que eles são afiliados ao Hamas e portanto, este crime é diretamente resultante deste governo de união. Os esforços agora para achar os três depende sobretudo da inteligência interna de Israel, ou o Shabak.

Mas a questão que está queimando o lábio de todos é se estes meninos estão vivos ou não. O problema é que a demora da coordenação entre a polícia e o exército pode ter dado tempo aos sequestradores para levar os três para Gaza e aí teremos o mesmo cenário de Gilad Shalit que não pode ser resgatado pelas forças de Israel. No entanto, não é fácil levar 3 reféns de uma vez através de fronteiras. A suposição é que eles ainda estejam na Judeia e Samaria, em algum lugar secreto, provavelmente subterrâneo.

Nunca em toda a história sangrenta do conflito entre Israel e os palestinos tivemos 3 israelenses sequestrados no mesmo evento. Isto indica uma operação bem planejada e executada de modo profissional. Os terroristas provavelmente convenceram ou forçaram os meninos a entrarem em seu carro como ocorreu várias vezes no passado. Em tentativas anteriores, os palestinos se diziam israelenses, falando hebraico fluentemente, vestindo-se até como judeus ortodoxos. A idade dos meninos pode também ter sido um fator.

Este sequestro não aconteceu num vácuo. Além de todo o reconhecimento e legitimidade dados ao Hamas nas últimas semanas nesta suposta reconciliação e governo de União, há o fato de que mais de 200 palestinos condenados em Israel por crimes contra a segurança do estado, estão fazendo intermitentes greves de fome, gerando protestos diários nas comunidades palestinas. Tudo isso, junto com as próximas eleições para a liderança da Autoridade Palestina, leva o Hamas a atos ousados para conquistar a opinião pública palestina na Judeia e Samaria.

Nos últimos 30 anos, o sequestro de soldados e civis se mostrou o melhor método para soltar prisioneiros. Todos os governos de Israel juraram nunca se render aos terroristas, somente para capitularem e soltarem milhares deles inclusive aqueles com sangue de vítimas israelenses nas mãos. Isso levou o governo de Israel a instaurar um comitê especial que ao final recomendou limitar o número de prisioneiros a serem trocados. Mas o gabinete de Netanyahu nunca adotou a recomendação pois tiraria a flexibilidade do seu governo em negociar.

Agora parece que chegou a hora da verdade para Bibi. O seu gabinete prefere uma operação militar para libertar os meninos sequestrados em vez de se render mais uma vez às exigências dos terroristas. Mas isso irá depender das informações de inteligência que Israel conseguir, o que até agora não parece ser muita. Mas se uma operação militar não for viável, Netanyahu terá que tomar uma decisão muito difícil sob pressão das famílias e do público para mais uma vez libertar centenas de terroristas. E Netanyahu sabe que a cada soltura, os terroristas ficam mais incentivados para promoverem outros sequestros e a colocarem as vidas de outros israelenses em perigo.

Ninguém pode negar o sofrimento destas famílias. Não há uma só casa em Israel ou um só lar judaico no mundo que não simpatize com sua causa e angústia. Como judeus, nosso conceito de responsabilidade mútua é algo impregnado em nossa consciência. O sofrimento destas famílias é o nosso sofrimento coletivo.

Desde os acordos de Oslo em 1993, quase 2 mil israelenses perderam suas vidas, pagando o ultimo preço pela liberdade do povo judeu. Os Israelenses lidam com ameaças todos os dias. Há tentativas constantes de infligir dano seja com mísseis, sequestro, ou até pedras jogadas contra carros em movimentos. Algumas são evitadas por atos da inteligência, outras por cidadãos alertas, muitas por pura sorte.

Então sim, a liberdade tem um preço. Vamos rezar e esperar que neste caso estes meninos possam ser localizados em vida e que no domingo que vem possamos fazer um editorial comemorando os milagres com os quais Deus abençoa seu povo e seu mensageiro, o exército de Israel.

Fonte: Pletz

sábado, junho 21, 2014

Grandes jogos nos esperam









por Fernando Gabeira





Fiquei triste em 50 e pensei em torcer contra o Brasil em 70. Inutilmente.

Tenho várias Copas na bagagem. Esta é realizada no Brasil sem que os brasileiros fossem consultados. Mesmo assim nos envolve. Resistir é tão difícil como distribuir panfletos políticos nas vésperas do Natal – essa lição aprendi em dezembro de 68, protestando contra o AI-5.

Sigo a Copa como torcedor apaixonado, mas com uma ponta de razão anoto meus limites. Força, Brasil! Porém não posso comprar tudo o que o Neymar anuncia porque estaria quebrado em pouco tempo. Tampouco posso comer os frangos e lasanhas que o Felipão nos oferece na TV porque engordaria uns dois quilos nesta Copa.

Também sou brasileiro, mas não consigo achar, como os locutores de TV, ter sido uma indelicadeza escalar um árbitro japonês para apitar Brasil x Croácia. Afinal, ele expulsara Felipe Melo em 2010 na partida contra a Holanda, e o fez com absoluta correção. Por que despertaria más lembranças, por que deveria ser evitado? Yuichi Nishimura marcou um pênalti duvidoso a favor do Brasil. Agora consideram uma delicadeza escalá-lo para apitar nossos jogos.

Moreno como vocês, não posso embarcar nessa. Muito menos nos insultos a Dilma.

Sou oposição desde cedo, meio de 2003. Mas acho que as circunstâncias eram especiais. Uma abertura de Copa do Mundo revela um pouco o País. Não precisava uma festa tão mixuruca. Nem, por mais ásperos que sejam os estádios, dizer aquilo a uma senhora, em voz alta, diante de bilhões de espectadores.

Capitão do time que trouxe a Copa ao Brasil, Lula assistiu ao jogo diante de uma televisão, possivelmente na tranquilidade do lar, ou num refúgio petista.

Não se xinga uma senhora, mas também é preciso alguma eficácia para executar a tarefa de enfrentar um estádio num momento em que o País está enfurecido com a política. Dilma foi xingada em três estádios no início da Copa. No ano passado houve apenas o que chamamos de uma vaia básica. Ninguém notou gradação, a passagem de uma etapa para outra, que, aliás, já estava aparecendo em alguns shows musicais.

Tenho insistido na tese da separação radical entre políticos e a sociedade. O Brasil é um carro sem as molas da mediação parlamentar, sem o lubrificante do diálogo democrático: marcha aos solavancos. Mostramos isso ao mundo, ao vivo e em cores.

Em Brasília os políticos querem que o povo se estrepe, com um verbo começado com f. Nos estádios parcela do povo quer que os políticos tomem naquele lugar. É simples assim, apesar da vulgaridade do enunciado.

Pelos descaminhos da nossa História recente passamos a nos detestar. E pelos labirintos da nossa cultura erotizamos nossa antipatia recíproca. Supondo que os repórteres tenham o hábito de traduzir as coisas (era assim no passado), grande parte do mundo ficará sabendo a que ponto chegamos. E lamentará, como muitos brasileiros lamentam, que para tanto futebol tão pouco avanço político.

Quando um governante abraça a ideia da Copa do Mundo em seu país, pensa na sua própria glória. É irônico ser hostilizado na abertura do evento. Lula soube tirar o corpo da reta, deixando Dilma ouvindo frases que não se podem dizer diante das crianças. O ideal seria fingir que não houve nada, seguir com a festa. Nas minhas análises, a explosão de parte do público é o resultado de um longo processo de desgaste. Outros políticos que ali se apresentassem teriam destino semelhante ao de Dilma.

Lula e o PT não interpretam assim. Continuam se achando populares e bem-amados. Tanto que pretendem radicalizar, a julgar pelas notícias, caso vençam as eleições de novo. Eles acham, como Lula declarou, que os palavrões contra Dilma foram estimulados pela imprensa. Num momento de sua fala menciona o PT na oposição e diz que nunca fez o que fizeram com Dilma. Ora, a imprensa jamais defendeu xingar alguém, apenas despertou a curiosidade para a roubalheira entre o governo e aliados. E os gritos no estádio não podem ser atribuídos a algo organizado pela oposição.

Lula usou o episódio para fortalecer sua vontade de controlar a mídia e isolar a oposição. É uma reação clássica: supor que as coisas não andam bem por falta de mais repressão e controle.

A partir dessa lógica, é possível prever dias piores. O PT escolheu os culpados pela reação a Dilma e, como sempre, vai partir para cima. Não se pode dizer que seja uma saída brilhante. Mas foi Isaac Deutscher, na sua trilogia sobre Trotsky, que lembrou bem: as pessoas parecem burras, mas não são; apenas não têm mais margem de manobra.

Criar conselhos populares numa época informatizada, em que todos podem participar, faria Lenin mexer-se no túmulo, apesar de sua rigidez de corpo e alma. Em pleno século 21, estabelecer o controle da mídia e cair de pau na oposição vai ser muito difícil: pede quadros dispostos a matar ou morrer. Conheço apenas alguns no PT, assim mesmo sobreviventes dos anos 60. Será que a maioria deles, perdida em seus empreguinhos, seus gadgets, suas escapadas à Disneylândia, vai encarar essa tarefa, quase impossível hoje em dia?

No futebol temos visto a derrota de alguns favoritos, algumas zebras e até a humilhação de grandes times, como o da Espanha. Na política, o ano eleitoral está só começando. Com tantas Copas na bagagem e a lembrança das revoluções do século 20, é preciso sempre cantar para os detentores do poder o verso de Jimmy Cliff: “Ooh, the harder they come, the harder they fall, one and all”. Quanto mais forte vierem, mais forte eles cairão, todos e cada um. O que a muitos pareceu um episódio marginal, o clima da abertura da Copa, com as pessoas cantando apaixonadamente o Hino Nacional e insultando a presidente, é um grande sintoma de mal-estar na vida cotidiana brasileira.

Vinicius falava da grande ilusão do carnaval: a gente trabalha o ano inteiro por um momento de sonho e tudo acaba na quarta-feira. Como no carnaval, tudo acaba com o apito encerrando a Copa. Aí virão os duros meses da ressaca e, lamento prever, o jogo feio e sujo do poder a qualquer custo. Quem seremos no final disso tudo, como revigorar a terra arrasada da nossa convivência política?

Grandes jogos nos esperam.

Artigo publicado no Estado de São Paulo em 20/06/2014

sábado, junho 07, 2014

Livre arbítrio?.







Livre arbítrio?.
por Paulo Rosenbaum 




A neurociência vaticinou por aí: é finda toda especulação filosófica. Somos governados por condicionamentos neurais e, sendo os neuroescaneamentos quase inquestionáveis, não há espaço para decidir mais nada. Hoje, imagens falam mais alto. Nossas escolhas, todas, já estão predefinidas via interconexões químicas, e o quer que venhamos a decidir não passa de um reflexo sináptico previsível.

Mas, se a liberdade para arbitrar está predefinida, alguém poderia responder: onde está a graça?

Estamos então numa espécie de vão. Um vão que indica tempo, mas talvez indique também, ou principalmente, uma espécie de espaço descontínuo. Penso nas manifestações e em toda a energia desperdiçada no ralo. Na falta de diretriz. Num país que não consegue enxergar que a potência real está mais nos habitantes do que nos bilhões de recursos.

Se até este discurso pode estar quimicamente predefinido, por que insisto, persisto, e, mesmo contra as evidências, não desistimos? Isso também pode estar catalogado na lei geral da evolução, uma espécie de ilusão alimentada para que continuemos a acreditar na preservação da espécie – não duvido de Darwin, apenas suspeito de uma mensagem incompleta. E como escaparemos das garras dos deterministas?

Sempre que ouço gente discorrer – do púlpito, teclado ou nas plaquinhas de manifestantes – com convicção e resolutividade, fico deprimido. Deve ser também alguma falha axonial, esta de natureza melancólica. Isso não significa inveja, desejo de compartilhar o sentimento de gente com certezas absolutas. Confesso que meu problema principal está na hesitação. E esta tendência, ainda que potencialmente paralisante, é o que permite se cogitem outras formas de perguntar.

Parece mesmo que há um vão.

Um vazio que precisa ser preenchido com incertezas. É que a certeza nos traumatiza. A dúvida nos salva. Nos salva da ideologia. Devia haver uma reza que pedisse para nos livrar de gente com opinião formada. Não seria heresia, espero, incluir nos afastar dos formadores de opinião. Basta breve rodada na grade da programação da TV para julgar se exagero. Precisamos pedir férias das posições sólidas. Exonerações de alinhamentos automáticos. É que isso pode nos resgatar do mais grave dos efeitos colaterais já inventados: a morte da criatividade.

E é essa disposição a recusar o que pedem para pensar que poderia nos liberar para um diálogo mais livre, sem formatação, liberto dos formalismos. Pensei na intenção dos velhos filósofos e em sua insistência no regime tutorial, e, ao mesmo tempo, o ensino realizado nos espaços abertos. As caminhadas peripatéticas, uma forma simbólica de induzir abertura e porosidade na mente das pessoas. Os filósofos que admiro não buscavam discípulos obedientes, mas gente que podia dissentir, arguir e, se possível, criar contrapontos aos lugares sem saída. Becos que encaixotaram cabeças.

Desde quando não surgem cabeças estratégicas, não ideológicas, que apresentem soluções mais razoáveis para os problemas crônicos que nos castigam? A hipótese é que morrem no berço. Nas escolas e nas panelinhas. Sobra espaço para correligionários, companheiros e amigões.

É raro que um dissidente sobreviva na área educacional. Um docente de universidade precisa de uma rede de apoio político, senão sucumbe rapidamente. Piora bem se o ambiente for público, estadual ou federal. O mérito hoje reside na avaliação da capacidade para criar networks. A instrumentalização política do saber é problema antigo, porém nas proporções atuais precisa ser chamado de escândalo. Pode ser muito humano, mas isso não é álibi para abonar o desanimo.

Chega de euforia e lamúrias, o déficit é de gente que preza mais a criação que a repetição e fórmulas bem sucedidas. Meus neurônios provavelmente podem até não gostar da ideia. Tanto faz. Já aprendi a discordar deles.

segunda-feira, junho 02, 2014

Decreto 8243: você já é um marxista sem saber.

















Em síntese: "você está autorizado a expressar a opinião que quiser, desde que alinhada com o marxismo".



Introdução

O maior problema do estado é que, tal qual um paciente de hospício, ele acredita possuir superpoderes, podendo violar as regras da natureza como bem entender. Dois exemplos bem conhecidos pelos liberais: ele considera ser capaz de ler mentes de milhares de pessoas ao mesmo tempo com uma precisão incrível e ter uma superinteligência capaz de fazer milhões de cálculos econômicos por segundo. Um roteirista de história em quadrinhos não faria melhor.

O estado brasileiro, no entanto, não está satisfeito com seus delírios atuais, e pretende aumentar o espectro dos seus poderes sobrenaturais para dois campos que a Física considera praticamente inalcançáveis. E parece estar conseguindo: a partir de 26/05/2014, viagem no tempo e teletransporte passaram a ser oferecidos de graça a todo e qualquer cidadão brasileiro.

Obviamente, a tecnologia está nos seus primórdios e ainda tem suas limitações, de tal modo que você, pretenso candidato a Marty McFly, pode escolher apenas um destino para suas aventuras: a Rússia de abril de 1917. Em compensação, prepare-se: graças ao estado brasileiro, você está prestes a enfrentar a experiência soviética em todo o seu esplendor.


A “máquina do tempo” que nos leva de volta a 1917 tem um nome no mínimo inusitado: chama-se Decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014. Aqui a denominaremos apenas de “Decreto 8.243”, ou “Decreto”.

Este artigo se destina a investigar o seu funcionamento – ou, mais especificamente, quais as modificações que esse decreto introduz na administração pública. Também farei algumas breves considerações a respeito da analogia que se pode fazer entre o modelo por ele instituído e aquele que levou à instauração do socialismo na Rússia: trata-se, no entanto, apenas de uma introdução ao tema, que, pela importância que tem, com certeza ainda gerará discussões muito mais aprofundadas.
O Decreto 8.243/2014

Chamado por um editorial do Estadão de “um conjunto de barbaridades jurídicas” e por Reinaldo Azevedo de “a instalação da ditadura petista por decreto”, o Decreto8.243/2014 foi editado pela Presidência da república em 23/05/14, tendo sido publicado no Diário Oficial no dia 26 e entrado em vigor na mesma data.

Entender qual o real significado do Decreto exige ler pacientemente todo o seu texto, tarefa relativamente ingrata. Como todo bom decreto governamental, trata-se de um emaranhado de regras cuja formulação chega a ser medonha de tão vaga, sendo complicado interpretá-lo sistematicamente e de uma forma coerente. Tentarei, aqui, fazê-lo da forma mais didática possível, sempre considerando que grande parte do público leitor dessa página não é especialista na área jurídica (a propósito: que sorte a de vocês.).

Iniciemos do início, pois. Como o nome diz, trata-se de um “decreto”. “Decreto”, no mundo jurídico, é o nome que se dá a uma ordem emanada de uma autoridade – geralmente do Poder Executivo – que tem por objetivo dar detalhes a respeito do cumprimento de uma lei. Um decreto se limita a isso – detalhar uma lei já existente, ou, em latinório jurídico, ser “secundum legem”. Ao elaborá-lo, a autoridade não pode ir contra uma lei (“contra legem”) ou criar uma lei nova (“præter legem”). Se isso ocorrer, o Poder Executivo estará legislando por conta própria, o que é o exato conceito de “ditadura”. Ou seja: um decreto emitido em contrariedade a uma lei já existente deve ser considerado um ato ditatorial.

É exatamente esse o caso do Decreto 8.243/2014. Logo no início, vemos que ele teria sido emitido com base no "art. 84, incisos IV e VI, alínea a, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. , inciso I, e no art. 17 da Lei nº 10.683”. Traduzindo para o português, tratam-se de alguns artigos relacionados à organização da administração pública, dentre os quais o mais importante é o art. 84, VI da Constituição – o qual estabelece que o Presidente pode emitir decretos sobre a “organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nemcriação ou extinção de órgãos públicos”.

Guarde essa última frase. Como veremos adiante, o que o Decreto 8.243 faz, na prática, é integrar à Administração Pública vários órgãos novos – às vezes implícita, às vezes explicitamente –, algo que é constitucionalmente vedado ao Presidente da República. Portanto, logo de cara percebe-se que se trata de algo inconstitucional – o Executivo está criando órgãos públicos mesmo sendo proibido a fazer tal coisa.

Os absurdos jurídicos, contudo, não param por aí.
A “sociedade civil”


Analisemos o texto do Decreto, para entender quais exatamente as modificações que ele introduz no sistema governamental brasileiro.

Em princípio, e para quem não está acostumado com a linguagem de textos legais, a coisa toda parece de uma inocência singular. Seu art. 1º esclarece tratar-se de uma nova política pública, “a Política Nacional de Participação Social”, que possui “o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”. Ou seja: tratar-se-ia apenas de uma singela tentativa de aproximar a “administração pública federal” – leia-se, o estado – da “sociedade civil”.

O problema começa exatamente nesse ponto, ou seja, na expressão “sociedade civil”. Quando usado em linguagem corrente, não se trata de um termo de definição unívoca: prova disso é que sobre ele já se debruçaram inúmeros pensadores desde o século XVIII. Tais variações não são o tema deste artigo, mas, para quem se interessar, sugiro sobre o assunto a leitura deste texto de Roberto Campos, ainda atualíssimo.

Para o Decreto, contudo, “sociedade civil” tem um sentido bem determinado, exposto em seu art. 2º, I: dá-se esse nome aos “cidadãos, coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”.

Muita atenção a esse ponto, que é de extrema importância. O Decreto tem um conceito preciso daquilo que é considerado como “sociedade civil”. Dela fazem parte não só o “cidadão” – eu e você, como pessoas físicas – mas também “coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”. Ou seja: todos aqueles que promovem manifestações, quebra-quebras, passeatas, protestos, e saem por aí reivindicando terra, “direitos” trabalhistas, passe livre, saúde e educação – MST, MTST, MPL, CUT, UNE, sindicatos… Pior: há uma brecha que permite a participação de movimentos “não institucionalizados” – conceito que, na prática, pode abranger absolutamente qualquer coisa.

Em resumo: “sociedade civil”, para o Decreto, significa “movimentos sociais”. Aqueles mesmos que, como todos sabemos, são controlados pelos partidos de esquerda – em especial, pelo próprio PT. Não se enganem: a intenção do Decreto 8.243 é justamente abrir espaço para a participação política de tais movimentos e “coletivos”. O “cidadão” em nada é beneficiado – em primeiro lugar, porque já tem e sempre teve direito de petição aos órgãos públicos - art. , XXXIV, “a” da Constituição -; em segundo lugar, porque o Decreto não traz nenhuma disposição a respeito da sua “participação popular” – aliás, a palavra “cidadão” nem é citada no restante do texto, excetuando-se um princípio extremamente genérico no art. 3º.

Podemos, então, reescrever o texto do art. 1º usando a própria definição legal: o Decreto, na verdade, tem “o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e os movimentos sociais”.

Compreender o significado de “sociedade civil” no contexto do Decreto é essencial para se interpretar o resto do seu texto. Basta notar que a expressão é repetida 24 (vinte e quatro!) vezes ao longo do restante do texto, que se destina a detalhar os instrumentos a serem utilizados na tal “Política Nacional de Participação Social”.
“Mecanismos de participação social”


Ok, então: há uma política que visa a aproximar estado e “movimentos sociais”. Mas no que exatamente ela consiste? Para responder a essa questão, comecemos pelo art. 5º, segundo o qual “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta deverão, respeitadas as especificidades de cada caso, considerar as instâncias e os mecanismos de participação social, previstos neste Decreto, para a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de seus programas e políticas públicas”.

Traduzindo o juridiquês: a partir de agora, todos os “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta” (ou seja, tudo o que se relaciona com o governo federal: gabinete da Presidência, ministérios, universidades públicas…) deverão formular seus programas em atenção ao que os tais “mecanismos de participação social” demandarem. Na prática, o Decreto obriga órgãos da administração direta e indireta a ter a participação desses “mecanismos”. Uma decisão de qualquer um deles só se torna legítima quando houver essa consulta – do contrário, será juridicamente inválida. E, como informam os parágrafos do art. 5º, essa participação deverá ser constantemente controlada, a partir de “relatórios” e “avaliações”.

Os “mecanismos de participação social” são apresentados no art. 2º e no art. 6º, que fornecem uma lista com nove exemplos: conselhos e comissões de políticas públicas, conferências nacionais, ouvidorias federais, mesas de diálogo, fóruns interconselhos, audiências e consultas públicas e “ambientes virtuais de participação social” (pelo visto, nossos amigos da MAV-PT acabam de ganhar mais uma função…).

A rigor, todas essas figuras não representam nada de novo, pois já existem no direito brasileiro. Para ficar em alguns exemplos: “audiências públicas” são realizadas a todo momento, a expressão “conferência nacional” retorna 2.500.000 hits no Google e há vários exemplos já operantes de “conselhos de políticas públicas”, como informa este breve relatório da Câmara dos Deputados sobre o tema. Qual seria o problema, então?

A questão está, novamente, nos detalhes. Grande parte do restante do Decreto – mais especificamente, os arts. 10 a 18 – destinam-se a dar diretrizes, até hoje inexistentes (ao menos de uma forma sistemática), a respeito do funcionamento desses órgãos de participação. E nessas diretrizes mora o grande problema. Uma rápida leitura dos artigos que acabei de mencionar revela que várias delas estão impregnadas de mecanismos que, na prática, têm o objetivo de inserir os “movimentos sociais” a que me referi acima na máquina administrativa brasileira.

Vamos dar um exemplo, analisando o art. 10, que disciplina os “conselhos de políticas públicas”. Em seus incisos, estão presentes várias disposições que condicionam sua atividade à da “sociedade civil” – leia-se, aos “movimentos sociais”, como demonstrado acima. Por exemplo: o inciso I determina que os representantes de tais conselhos devem ser “eleitos ou indicados pela sociedade civil”, o inciso II, que suas atribuições serão definidas “com consulta prévia à sociedade civil”. E assim por diante. Essas brechas estão espalhadas ao longo do texto do Decreto, e, na prática, permitem que “coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações” imiscuam-se na própria Administração Pública.

O art. 19, por sua vez, cria um órgão administrativo novo (lembram do que falei sobre a inconstitucionalidade, lá em cima?): “a Mesa de Monitoramento das Demandas Sociais, instância colegiada interministerial responsável pela coordenação eencaminhamento de pautas dos movimentos sociais e pelo monitoramento de suas respostas”. Ou seja: uma bancada pública feita sob medida para atender “pautas dos movimentos sociais”, feito balcão de padaria. Para quem duvidava das reais intenções do Decreto, está aí uma prova: esse artigo sequer tem o pudor de mencionar a “sociedade civil”. Aqui já é MST, MPL e similares mesmo, sem intermediários.

Enfim, para resumir tudo o que foi dito até aqui: com o Decreto 8.243/2014, (i) os “movimentos sociais” passam a controlar determinados “mecanismos de participação social”; (ii) toda a Administração Pública passa a ser obrigada a considerar tais “mecanismos” na formulação de suas políticas. Isto é: o MST passa a dever ser ouvido na formulação de políticas agrárias; o MPL, na de transporte; aquele sindicato que tinge a cidade de vermelho de quando em quando passa a opinar sobre leis trabalhistas. “Coletivos, movimentos sociais, suas redes e suas organizações” se inserem no sistema político, tornando-se órgãos de consulta: na prática, uma extensão do Legislativo.
“Back in the U. S. S. R.”!


Esse sistema de “poder paralelo” não é inédito na História – e entender as experiências pretéritas é uma excelente maneira de se compreender o que significam as atuais. É isso que, como antecipei no início do texto, nos leva de volta a 1917 e aos “sovietes” da Revolução Russa, possivelmente o exemplo mais conhecido e óbvio desse tipo de organização. Se é verdade que “aqueles que não podem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”, como diz o clássico aforismo de George Santayana, é essencial voltar os olhos para o passado e entender o que de fato se passou quando um modelo de organização social idêntico ao instituído pelo Decreto8.243/2014 foi adotado.

Essa análise nos leva ao momento imediatamente posterior à Revolução de Fevereiro, que derrubou Nicolau II. O clima de anarquia gerado após a abdicação do czar levou à formação de um Governo Provisório inicialmente desorganizado e pouco coeso, incapaz de governar qualquer coisa que fosse.

Paralelamente, formou-se na capital russa (Petrogrado) um conselho de trabalhadores – na verdade, uma repetição de experiências históricas anteriores similares, que na Rússia remontavam já à Revolução de 1905. Tal conselho – o Soviete de Petrogrado – consistia de “deputados” escolhidos aleatoriamente nas fábricas e quarteis. Em 15 dias de existência, o soviete conseguiu reunir mais de três mil membros, cujas sessões eram realizadas de forma caótica – na realidade, as decisões eram tomadas pelo seu comitê executivo, conhecido como Ispolkom. Nada diferente de um MST, por exemplo.

A ampla influência que o Soviete possuía sobre os trabalhadores fez com que os representantes do Governo Provisório se reunissem com seus representantes (1º-2 de março de 1917) em busca de apoio à formação de um novo gabinete. Isto é: o Governo Provisório foi buscar sua legitimação junto aos sovietes, ciente de que, sem esse apoio, jamais conseguiria firmar qualquer autoridade que fosse junto aos trabalhadores industriais e soldados. O resultado dessas negociações foi o surgimento de um regime de “poder dual” (dvoevlastie), que imperaria na Rússia de março/1917 até a Revolução de Outubro: nesse sistema, embora o Governo Provisório ocupasse o poder nominal, este na prática não passava de uma permissão dos sovietes, que detinham a influência majoritária sobre setores fundamentais da população russa. A Revolução de Outubro, que consolidou o socialismo no país, foi simplesmente a passagem de “todo o poder aos sovietes!” (“vsia vlast’ sovetam!”) – um poder que, na prática, eles já detinham.

Antes mesmo do Decreto 8.243, o modelo soviético já antecipava de forma clara o fenômeno dos “movimentos sociais” que ocorre no Brasil atualmente. Com o Decreto, a similaridade entre os modelos apenas se intensificou.


Em primeiro lugar, e embora tais movimentos clamem ser a representação do “povo”, dos “trabalhadores”, do “proletariado” ou de qualquer outra expressão genérica, suas decisões são tomadas, na realidade, por poucos membros – exatamente como noIspolkom soviético, a deliberação parte de um corpo diretor organizado e a aclamação é buscada em um segundo momento, como forma de legitimação. Qualquer assembleia de movimentos de esquerda em universidades é capaz de comprovar isso.

Além disso, a institucionalização de conselhos pelo Decreto 8.243/2014 leva à ascensão política instantânea de “revolucionários profissionais” – pessoas que dedicam suas vidas inteiras à atividade partidária, em uma tática já antecipada por Lênin em seu panfleto “Que Fazer?”, de 1902 (capítulo 4c). Explico melhor. Vamos supor por um momento que o Decreto seja um texto bem intencionado, que de fato pretenda “inserir a sociedade civil” dentro de decisões políticas (como, aliás, afirma o diretor de Participação Social da Presidência da Repúblican este artigo d’O Globo). Ora, quem exatamente teria tempo para participar de “conselhos”, “comissões”, “conferências” e “audiências”? Obviamente, não o cidadão comum, que gasta seu dia trabalhando, levando seus filhos para a escola e saindo com os amigos. Tempo é um fator escasso, e a maioria das pessoas simplesmente não possui horas de sobra para participar ativamente de decisões políticas – é exatamente por isso que representantes são eleitos para essas situações. Quem são as exceções? Não é difícil saber. Basta passar em qualquer sindicato ou diretório acadêmico: ele estará cheio de “revolucionários profissionais”, cuja atividade política extraoficial acabou de ser legitimada por decreto presidencial.

A questão foi bem resumida por Reinaldo Azevedo, no texto que citei no início deste artigo. Diz o articulista: “isso que a presidente está chamando de ‘sistema de participação’ é, na verdade, um sistema de tutela. Parte do princípio antidemocrático de que aqueles que participam dos ditos movimentos sociais são mais cidadãos do que os que não participam. Criam-se, com esse texto, duas categorias de brasileiros: os que têm direito de participar da vida púbica [sic] e os que não têm. Alguém dirá: ‘Ora, basta integrar um movimento social’. Mas isso implicará, necessariamente, ter de se vincular a um partido político”.

Exatamente por esses motivos, tal forma de organização confere a extremistas de esquerda possibilidades de participação política muito mais amplas do que eles teriam em uma lógica democrática “verdadeira” – na qual ela seria reduzida a praticamente zero. Basta ver que o Partido Bolchevique, que viria a ocupar o poder na Rússia em outubro de 1917, era uma força política praticamente irrelevante dentro do país: sua subida ao poder se deve, em grande parte, à influência que exercia sobre os demais partidos socialistas (mencheviques e socialistas-revolucionários) dentro do sistema dos sovietes. Algo análogo ocorre no Brasil atual: salvo exceções pontuais, PSOL, PSTU et caterva apresentam resultados pífios nas eleições, mas por meio da ação de “movimentos sociais” conseguem inserir as suas pautas na discussão política. As manifestações pelo “passe livre” – uma reivindicação extremamente minoritária, mas que após um quebra-quebra nacional ocupou grande parte da discussão política em junho/julho de 2013 – são um exemplo evidente disso.

O sistema introduzido pelo Decreto 8243/2014 apenas incentiva esse tipo de ação. O Legislativo “oficial” – aquele que contém representantes da sociedade eleitos voto a voto, representando proporcionalmente diversos setores – perde, de uma hora para outra, grande parte de seu poder. Decisões estatais só passam a valer quando legitimadas por órgãos paralelos, para os quais ninguém votou ou deu sua palavra de aprovação – e cujo único “mérito” é o fato de estarem alinhados com a ideologia do partido que ocupa o Executivo.

Pior: a administração pública é engessada, estagnada. Não no sentido definido no artigo d’O Globo que linkei acima (demora na tomada de decisões), mas em outro: os cargos decisórios desse “poder Legislativo paralelo” passam a ser ocupados sempre pelas mesmas pessoas. Suponhamos, em um esforço muito grande de imaginação, que o PT perca as eleições presidenciais de 2018 e seja substituído por, digamos, Levy Fidelix e sua turma. Com a reforma promovida pelo Decreto 8.243/2014 e a ocupação de espaços de deliberação por órgãos não eletivos, seria impossível ao novo presidente implantar suas políticas aerotrênicas: toda decisão administrativa que ele viesse a tomar teria que, obrigatoriamente, passar pelo crivo de conselhos, comissões e conferências que não são eleitos por ninguém, não renovam seus quadros periodicamente e não têm transparência alguma. Ou seja: ainda que o titular do governo venha a mudar, esses órgãos (e, mais importante, os indivíduos a eles relacionados) permanecem dentro da máquina administrativa ad eternum, consolidando cada vez mais seu poder.
Conclusão


O Decreto 8.243/2014 é, possivelmente, o passo mais ousado já tomado pelo PT na consecução do “socialismo democrático” – aquele sistema no qual você está autorizado a expressar a opinião que quiser, desde que alinhada com o marxismo. Sua real intenção é criar um “lado B” do Legislativo, não só deslegitimando as instituições já existentes como também criando um meio de “acesso facilitado” de movimentos sociais à política.

Boa parte dos leitores dessa página podem estar se perguntando: “e daí?”. Afinal, sabemos que a democracia representativa é um sistema imperfeito: suas falhas já foram expostas por um número enorme de autores, de Tocqueville a Hans-Hermann Hoppe. É verdade.

No entanto, a democracia representativa ainda é “menos pior” do que a alternativa que se propõe. Um sistema onde setores opostos da sociedade se digladiam em uma arena política, embora tenda necessariamente a favorecimentos, corrupção e má aplicação de recursos, ainda possui certo “controle” interno: leis e decisões administrativas que favoreçam demais a determinados grupos ou restrinjam demasiadamente os direitos de outros em geral tendem a ser rechaçadas. Isso de forma alguma ocorre em um sistema onde decisões oficiais são tomadas e “supervisionadas” por órgãos cujo único compromisso é o ideológico, como o que o Decreto 8.243/2014 tenta implementar.

Esse segundo caso, na verdade, nada mais é do que uma pisada funda no acelerador na autoestrada para a servidão.

Autor: Erick Vizolli em Liberzone.