quarta-feira, janeiro 29, 2014

O Holocausto, em uma e em 6 milhões de palavras.







por Paulo Rosenbaum






Há 70 anos, chegava ao fim uma das batalhas mais dramáticas da Segunda Guerra. Após 900 dias de confronto, as tropas soviéticas derrotavam os nazistas e recuperavam o controle sobre a cidade de Leningrado.

A Organização das Nações Unidas declarou em 2005 o dia 27 de janeiro como o dia internacional em memória das vítimas do Holocausto. Dia 27 foi a data da libertação dos prisioneiros do campo de extermínio de Auschwitz. Será que houve algum exagero? Por que aquilo que já foi descrito como o “maior drama da história ocidental” deve estar sempre em pauta? Por que não passamos a borracha e vamos adiante? Afinal já faz 69 anos! Desolado, as vezes sinto que não há cabimento dar ouvidos a quem não não quer aprender com a história. Como alguém já escreveu, é mais do que evidente que vivemos uma era com déficit de alunos.

Pois recentemente, numa discussão via web deparei com argumentos revisionistas clássicos na boca de usuários ou muito ingênuos ou muito mal intencionados. Lá, dizia-se (sic) “que eles (a senhora tinha um sogro que pertenceu à SS) foram tão vítimas quanto os que sofreram” (sic) além do desfile de chavões como “esqueçamos as versões que lemos e procuraremos nos informar melhor, já que a história é sempre escrita pelos vencedores” (sic), diante dos quais, alguém como eu, neto de vítimas do nacional-socialismo alemão, só teria duas alternativas civilizadas, reduzir-me ao silêncio, fazer uma denúncia ou promover uma serena discussão sobre a natureza do absurdo.


Como sou um ser verbal não sereno e as denúncias todas caem no abismo comum das atrocidades substituídas por decurso de prazo, resta promover um debate sobre o absurdo da condição humana. Imaginei a história contada pelos derrotados. E os nazistas teriam muito a dizer? Um resumo poderia ser o seguinte: Um dia tudo será retificado. Não só não fomos os carrascos voluntários do  Führer como fomos injustiçados violentamente pelas potencias que nos ocuparam. Não só não esqueceremos da humilhação que sofremos em Versalhes como sempre soubemos o plano dos aliados. Na verdade, tudo não passou de uma conspiração da mídia internacional contra o povo alemão já que a doutrina de Hitler se não exatamente pacifista, usava a beligerância na justa medida contra povos que não aceitavam as evidencias científicas de que algumas raças devem prevalecer sobre outras”


Poderia imaginar muito mais, mas fiquemos com fatos. Há alguns anos, durante em encontro de especialistas na Alemanha, um professor de história da medicina me respondeu categoricamente quando lhe fiz uma pergunta. Minha dúvida: como era a educação nas escolas contemporâneas alemãs sobre o período nazista. Além de um momentâneo mal estar o catedrático, muito sincero, me disse: ‘”Colega, sabe de uma coisa? Acho que é excessiva. Não aguento mais meus filhos tendo aulas sobre o assunto!” . Na hora não o contestei — pelo que sinto e pelo material que circula pela web, fica-se cada vez mais convicto da obrigatoriedade de explicitar o que significou o holocausto e a política nazista para as minorias — mas me limitei a anotar sua cara contrariada, mais ou mesma que devo ter deixado escapar. O mal estar estava gerado.

Pois no último dia deste colóquio este mesmo gentil professor me levou a uma cidade vinícola, região histórica não bombardeada pelos aliados, a cerca de 40 kms de Stuttgart. Pois lá ele me chamou de lado para me que talvez estivesse enganado em nossa pequena “não discussão” do dia anterior. Curioso, perguntei o que o tinha feito mudar de ideia. Ele me conduziu até uma ponte. No final, havia uma placa. Ele apontou o dedo e esboçou uma tradução, a qual relato o teor aproximado: “Nunca esquerecemos dos nossos heróis, ainda sem liberdade em prisões estrangeiras”.

A data da placa? 1959.

O mais comum é que a memória das tragédias permaneça subestimada, por isso mesmo a amnésia é um amanhã de erros persistentes. Lembrar está para além das homenagens: é trazer à vida e fazer reviver quem foi calado pelo arbítrio, a tirania e o descaso dos outros.

Fonte: Pletz

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