domingo, outubro 12, 2014

Auto-engano e barbárie.










Auto-engano e barbárie.

por Leonildo Trombela






Quanto mais profunda se mostra a corrupção material do PT, mais profunda é a necessidade que seus eleitores em boas condições de vida parecem ter de se alienar da realidade e defender o partido com mais vigor. Em outras palavras, a corrupção material, quando praticada por um grupo visivelmente psicopata, parece incitar com igual teor a corrupção espiritual e psicológica. Isso é plenamente observável a cada nova denúncia de uma nova pilhagem que o governo pratica sobre o erário público.

É consideravelmente perceptível nesse grupo de eleitores a necessidade de se defender de um crime apontando ora a rotina da prática, ora a similaridade dela nos adversários do partido (vejam como os escândalos do PSDB são evocados para justificar os do PT, como se um crime expiasse o outro). Isso muito se parece com algum tipo de mecanismo de defesa psicológica que pretende restaurar uma suposta normalidade. Porquanto, admitir que se está votando de boa vontade em um partido que tem uma nítida agenda de destruição do país implicaria ter de admitir posições que seriam extremamente desconfortáveis psicologicamente.

Claro que essa fuga da realidade para ideologias políticas é algo vastamente disseminado hoje, de modo que inclusive o próprio pessoal peessedebista mais fervoroso tem mostrado sofrer, embora em grau menor que o petista, porém ainda considerável. (Por outro lado, é interessante notar que boa parte dos eleitores de mentalidade mais conservadora, tendem a evocar [ironicamente] os medicamentos antieméticos para o dia da votação, o que é uma atitude mais saudável psicologicamente se comparada à justificação do injustificável.)

Relativa a essa barbárie política de fuga da realidade [ou verdade] e aprofundamento na corrupção de si mesmo, há uma passagem interessante dita por Olavo de Carvalho no discurso Reparando uma injustiça pessoal (1999) que nos dá uma luz no assunto:

No século XIX, um homem chamado Napoleão Bonaparte descobre uma coisa terrível: a política, diz ele, é o destino inevitável dos tempos modernos. Tudo vai virar política e os homens não se ocuparão senão de política. Ele descobre a politização geral de tudo. E o que significa a politização geral? Significa que todos os conflitos já não poderão mais ser arbitrados pela análise dos conteúdos dos termos em questão, mas serão resolvidos sempre por um confronto de forças entre o grupo dos amigos e o grupo dos inimigos. Ou seja, terminou a civilização e começou a barbárie. A politização geral de tudo é simplesmente a barbárie, a violência institucionalizada, seja sob a forma de violência física, seja como a violência moral da mentira imposta como verdade obrigatória. [...] A politização geral da vida quer dizer que um garoto de quinze, de dezesseis anos, que mal está entrando na vida, que não tem a menor idéia do que se passa neste planeta, já está cooptado, já está inscrito no grupo dos amigos, cuja única finalidade é matar o grupo dos inimigos. 

Em vista dessa barbárie, seria até paradoxal citar o dito de Santo Agostinho: "Conheci muitos com desejo de enganar aos outros, mas não encontrei ninguém que quisesse ser enganado". Longe disso, hoje presenciamos um espetáculo horroroso de auto-engano que nada de bom inspira. As massas tornaram-se extremamente ariscas a qualquer contato civilizatório (i.e. moral, religião, leis, liberdade de expressão e outros meios que, segundo Aleksandr Zinoviev, servem para o indivíduo se proteger contra a força avassaladora das próprias massas ignaras); todos estão dispostos a enganar e se deixar enganar. Uma mentira para justificar a outra.



Leonildo Trombela Junior é jornalista e tradutor.

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