por Flavio Gordon
Nenhuma palavra ou ideia — sobretudo ao se tratar de uma proposta política de mudança radical — deve ser analisada como se pairasse num vácuo. Em termos puramente ideais e abstratos, a noção de desmilitarização das polícias talvez até fizesse algum sentido. Afinal de contas, não é estritamente necessário (e, sob certas circunstâncias, talvez nem mesmo desejável) que um corpo profissional responsável por manter a ordem pública e o cumprimento da lei esteja organizado nos moldes de um exército, ou seja, para a guerra.
Mas é preciso ir além do significante “des-mi-li-ta-ri-za-ção” — cuja sonoridade, para muitos, parece trazer à mente a canção Imagine, de John Lennon, e as imagens idílicas de um mundo sem armas, sem violência, sem hierarquias; um mundo de paz, amor e campinas verdejantes — em busca do significado concreto assumido pela referida proposta na nossa presente situação (que, a propósito, não é das melhores).
É preciso lembrar, antes de mais nada, que estamos no Brasil, país campeão mundial em número absoluto de homicídios. País no qual os criminosos são mais “militarizados” que a maior parte dos exércitos do planeta. Vivemos, de fato, em estado de guerra, com estatísticas de guerra, e dramas humanos típicos de situações de guerra. Num tal contexto, nada mais normal que nossas forças policiais sejam regidas por uma lógica militar.
Em segundo lugar, e sobretudo, é preciso refletir profundamente sobre quem defende a desmilitarização no país, ou seja, sobre quais são exatamente os seus principais entusiastas.
Basta fazer a pergunta para constatar tratar-se da mesma turminha, tão nossa conhecida, que chama arrastão de “reação dos desfavorecidos contra a elite”. Que defende o psicopata Champinha contra a “loirinha de classe média alta com nome estrangeirado” (sic), sua vítima. Que acusa a polícia de ser racista e genocida. Que é contra o policiamento ostensivo e o encarceramento de marginais. Que pede “menos polícia e mais cultura”, como se uma coisa pudesse substituir a outra. Que acusa a vítima de assalto de ter cometido “crime de ostentação”. Que mobiliza mundos e fundos para defender black blocs. Que “é do Levante” e “está com Maduro”. Que sonha em meter uma bala na cabeça dos “conservadores”. Que invade e destrói a sala de um professor de que discordam, rabiscando na parede a frase “Stálin matou foi pouco”. Que cassa a palavra de um debatedor e em seguida o agride covardemente na base do 30 contra 1. Que xinga a dissidente cubana Yoani Sanchez de vendida e agente da CIA, esfregando-lhe notas de dólares no rosto. Que deseja abertamente o estupro da jornalista Rachel Sheherazade. Que mata cinegrafista com disparos de rojão. Que enfia crucifixos no ânus e quebra imagens sacras. Que vomita, berra e se debate quando contrariada. Que faz troça da expressão “gente de bem”, como se a diferença substantiva entre um trabalhador e um criminoso fosse mera criação ideológica da direita. E que conta com centenas de representantes na política, na academia, no jornalismo e no show business. São esses os defensores da desmilitarização.
Enfim, nenhuma discussão sobre desmilitarização pode ignorar o fato concreto de que os seus principais proponentes hoje no Brasil são extremistas políticos, muitos deles flagrantemente criminosos, cujo único interesse é semear o caos e a dissolução social, para daí colher dividendos político-ideológicos.
Se, por exemplo, os partidos e movimentos de extrema-esquerda já fazem o que fazem na educação, atuando politicamente por meio dos sindicatos para promover o caos em estados e municípios governados por partidos adversários, imaginem o que fariam em caso de desmilitarização das polícias. Imaginem um cenário de total sindicalização das forças policiais. Imaginem um sindicato de policiais controlado pelo PT, PSOL ou PC do B. Imaginaram? Pois é.
Por fim, uma palavra aos policiais militares, uma categoria de fato tão vilipendiada e desprezada pelas elites políticas e culturais do nosso país. Se é verdadeira uma pesquisa ora muito divulgada sobre a aprovação majoritária dos PMs à desmilitarização — e eu tenho razões para duvidar que o seja, tendo em vista o viés ideológico de seus autores —, resta concluir que os policiais não têm idéia de com quem estão lidando. Iludidos e manipulados, estarão apenas colaborando com o seu pior inimigo, com aqueles que desejam não apenas a desmilitarização, mas a completa desmoralização e extinção das polícias.
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