por Sonia Bloomfield Ramagem
Poucas palavras tem sido tão mal usadas e mal-entendidas quanto SIONISMO. Graças às manipulações dos agentes do anti-semitismo moderno ela tornou-se um sinônimo de opressão e violência. Nada mais enganoso!
SIONISMO é um termo composto por SION + ISMO. SION, ou Sião, é um monte em Jerusalém, e ISMO significa “modo de pensar”, ou seja, a palavra indica uma visão-de-mundo ligada a Sião, ou melhor, a Jerusalém e à Terra de Israel. O Sionismo é, em sua origem, o movimento nacionalista para o estabelecimento de uma nação judaica no mesmo local onde viveram os ancestrais do povo judeu (1), que foi iniciado como um movimento secular que re-criava as aspirações religiosas dos judeus de retorno a Jerusalém, e também como reação ao virulento anti-semitismo europeu, em especial na Rússia, Polônia e França (caso Dreyfus).
Atualmente o termo engloba, também, o apoio à existência do Estado de Israel (seja por judeus ou outros grupos), e a tarefa contínua de manutenção do Estado Judaico (como defesa e absorão de imigrantes).
O amor dos judeus por sua terra ancestral não é novo, mas o termo SIONISMO sim. A partir do século 18 cria-se, no mundo ocidental, um modo de pensar que legitima o controle político de uma unidade territorial com uma população de ascendência, biológica, linguística e cultural em comum, o NACIONALISMO (nasci + ismo). O nacionalismo é tanto um sentimento (o de pertencer a um grupo ligado a um território), quanto uma ideologia (que tem a nação-estado como forma política ideal, e que clama pela lealdade absoluta de seus cidadãos).
De forma resumida: o nacionalismo é a crença que cada nação tem o direito e o dever de se constituir como um estado político. Este fenômeno criou a reordenação do território europeu nos séculos 19 e 20, criou os atuais países das Américas, como o Brasil, e continua a operar na África e na Ásia.
Ao nacionalismo associou-se uma forma artística, o ROMANTISMO, permitindo a associação de uma intensa emotividade das massas a uma ação política concreta. O romantismo surgiu como reação à modernidade, em especial através da reação artística dos intelectuais alemães contra sua própria nobreza que, empobrecida pela Guerra dos Trinta Anos entre católicos e protestantes, os desprezava e tentava imitar a realeza francesa através do formalismo de sua etiqueta. Os franceses e ingleses, donos de grandes e ricas colônias nas Américas, Ásia e África, tinham uma visão-de-mundo cosmopolita e racionalista, e suas sociedades permitiam a inserção de membros da burguesia nos negócios dos estados.
Os ideais do romantismo pediam um retorno à natureza e à essência do ser humano em oposião ao racionalismo e o mecanicismo francês e inglês, era uma forma de resistência dos que não tinham contra os que tinham riquezas materiais.
Na atualidade dos países não ricos surge a nova roupagem do romantismo através da ecologia e da resistência cultural aos países ricos, em especial aos Estados Unidos. Neste fenômeno unem-se pensadores alemães e franceses, os primeiros pelas razões já mencionadas, os segundos pelo fracasso a longo prazo de seus ideais revolucionários frente aos resultados da Revoluão Americana, que regem a nova ordem mundial, e a resistência contra esta ordem tende ao maniqueísmo (2).
Os nacionalismos tardios do Oriente Médio, que surgem no momento em que a globalização avança, têm como referência emocional, romântica, a resistência aos EUA. Os nacionalismos mais antigos, dos paises pobres, idem. Os nacionalismos europeus que enfrentam a competição norte-americana para a hegemonia mundial, também. Através dos meios de comunicação de massa, políticos e intelectuais, que são em última hipótese quem criam os nacionalismos para terem esferas próprias de poder, associam o moderno antagonismo para com a potencia hegemônica, sem a qual não podem existir como entidades sociais, com o antiquíssimo anti-semitismo travestido de anti-Sionismo.
Ao demonizar-se os EUA, coloca-se o Estado de Israel, sionista, e os “mercadores apátridas”, conforme muitas vezes os judeus são denominados, como a razão para os problemas mundiais. Une-se então à velha teoria da conspiração, encontrada na falsificação intitulada “Os Protocolos dos Sábios de Sião”, ao anti-Sionismo, uma combinação explosiva, numa mostra da incrível capacidade de sobrevivência do anti-semitismo.
Notas:
(1) E onde sempre viveu uma considerável população judaica desde a época da expulsão pelos romanos.
(2) Em recente pesquisa divulgada pela Revista Veja os brasileiros são o segundo povo mais anti-americano do mundo, em que pese a fascinação brasileira com a língua, a cultura, e os artigos de consumo e com a liberdade individual norte-americana.
Sonia Bloomfield Ramagem é PhD e professora da Universidade de Brasília
Este artigo foi publicado originalmente em outubro de 2003 em uma versão antiga do PLETZ.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário