por Leandro Demori.
Titulo Original:Por cruz de madeira, João Paulo II desafiou os comunistas, publicado em 27/04/11(*)
Uma cruz de madeira assinalou o destino das relações entre João Paulo II e o regime comunista russo que se instalara na Polônia após o fim da Segunda Guerra Mundial. Reconhecido até mesmo por Mikhail Gorbachev como peça-chave para a queda da Cortina de Ferro, o Papa, que será beatificado no próximo domingo, comprou uma briga doméstica antes de pensar em mudar o mundo.
Em 1949, o regime soviético iniciou a construção de uma nova cidade a leste de Cracóvia, onde Wojtyla iniciou sua carreira religiosa. O local se chamaria Nowa Huta ("nova fábrica de ferro") por conta da concomitante construção de uma usina. Concebida para ser a cidade socialista ideal, Nowa Huta era ateísta por definição - varada por imensas avenidas e blocos monolíticos de apartamentos ao estilo do Realismo Socialista sem prever qualquer espaço para a construção de igrejas.
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Os russos calcularam mal a força da religião na Polônia, país onde 90% da população se declara católica. Durante anos, católicos liderados pelo então bispo de Cracóvia, Karol Wojtyla, entraram com requisições junto ao governo para levantar uma cruz em alguma das praças do mastodonte urbano que abriga ainda hoje 20 mil pessoas.
A permissão foi dada a Wojtyla em 1956, e a cruz, de madeira, logo construída. Apenas dois anos depois, o regime decidiu fazer uma escola no local designado aos fiéis. Em poucos dias, centenas de manifestantes foram às ruas de Nowa Huta para defender a cruz. Enfrentanto violentos conflitos, a polícia decidiu fechar a cidade: colunas de caminhões militares, carros armados, canhões e metralhadoras foram posicionados nas entradas das ruas de acesso.
"A única linha de comunicação entre as duas cidades eram os motoristas de táxi, que avisaram a população de Cracóvia que a revolução tinha começado em Nowa Huta", conta Wita Szybalski, 56 anos, taxista de Cracóvia que viveu em Huta após a queda do regime. A guerra pela cruz atingiu o pico em abril de 1960 quando quatro mil pessoas saíram às ruas e enfrentaram canhões d´água, bombas de gás e cães da polícia do regime. O número de mortos - em estimativa imprecisa feita à época - é de 800.
Contra as bombas, venceu a cruz, que ficou onde estava até 1970, quando atingiu estado avançado de degradação. Vigiada dia e noite por soldados do exército, ela não poderia ser substituída. Afinal, o bispo Wojtyla e seus seguidores havia pedido para construir 'aquela' cruz. "Todo mundo sabia que o regime queria deixar a cruz apodrecer e cair. Não deixavam ninguém chegar perto para reparar ou trocar a madeira", lembra Szybalski.
A engenharia da fé abriu mais uma rodada no xadrez de forças: uma nova cruz foi construída secretamente e, no dia 1º de maio, quando todos os oficiais do regime estavam longe de seus postos de guarda festejando o Dia do Trabalhador, foi fincada no lugar da antiga. Hoje, uma placa lembra a luta de Karol Wojtila pela monumento: "A João Paulo II, o defensor da cruz, a gratidão do povo de Nowa Huta".
(*) Leandro Demori - Especial para o Terra.com - direto de Nowa Huta - Cracóvia.
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Fragmentos de Entrevista de Dom Mariusz Frukacz, redator do semanário Niedziela ao pt.zenit.org em 11/02/2011
ZENIT: É verdade que os russos não invadiram a Polônia porque Wojtyla era o Papa?
Pe. Frukacz: Esta pergunta não tem uma resposta simples. Ainda não conhecemos todos os documentos do regime comunista, e pouco se sabe do período em que o general Wojciech Jaruzelski instaurou o estado de guerra, em que foram suspensos os direitos civis, em que os ativistas do Solidarność foram presos. Eu acho que alguns historiadores têm razão quando escrevem que os russos não invadiram a Polônia porque não queriam repetir a situação de 1968, quando invadiram a Tchecoslováquia. O general Wojciech Jaruzelski afirma que no dia 13 de dezembro de 1981 teve que instaurar o estado de guerra na Polônia porque, se não, os russos teriam invadido o país. Hoje sabemos que Jaruzelski não falou a verdade. Do ponto de vista de alguns documentos e com base em testemunhos, os historiadores da Polônia sustentam que o regime comunista, em especial Leonid Brezniev, o primeiro-secretário do partido comunista da União Soviética, queria que o general Jaruzelski e o regime comunista na Polônia resolvessem o problema do Solidarność com suas próprias forças. Sabemos também que, durante o estado de guerra na Polônia, João Paulo II mantinha estreitos contatos diplomáticos com o presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, e que escreveu a Leonid Breżniev para convencê-lo a não invadir a Polônia. Apesar disso, não podemos dizer com suficiente certeza que os russos não invadiram a Polônia porque o Card. Wojtyla era Papa.
ZENIT: O nazismo, primeiro, e o comunismo, depois, tentaram arrancar as raízes cristãs e apagar a fé católica do povo polonês. Por que não conseguiram?
Pe. Frukacz: É verdade que o nazismo e o comunismo tentaram arrancar as raízes cristãs e apagar a fé católica do povo polonês. E não conseguiram. Penso que o recurso decisivo que salvou a fé católica foram as famílias polonesas, que respeitaram e transmitiram aos filhos o patrimônio espiritual das gerações precedentes. Nas famílias cristãs polonesas, durante o regime nazista e depois no comunista, era vivo e forte o vínculo da fé com a cultura cristã e a cultura nacional. Para o povo polaco, a fé tem a sua importância também na vida social. Não é uma coisa privada. A fé tem uma dimensão social e nacional. Para os polacos, a fé é vinculada ao patriotismo verdadeiro, que é amor por Deus e pela Pátria.
Acho também que um grande papel para manter fortes as raízes cristãs na sociedade polaca foi desempenhado pelos movimentos e associações cristãs, como o Movimento Luz e Vida, do Servo de Deus Franciszek Blachnicki. Também teve muita importância o Clube da Inteligência Católica, a pastoral acadêmica e as semanas da cultura cristã, quando os artistas apresentavam e transmitiam nas igrejas a cultura e a literatura nacional para os fiéis.
Outro papel-chave foi do Card. Stefan Wyszyński, Primaz do Milênio. Foi ele que organizou os “Votos de Jasna Góra” em 1956, a novena pelos mil anos do cristianismo na Polônia (1957-1966). O Card. Wyszyński aprofundou e difundiu a “Teologia da Nação” para reforçar a identidade católica dos poloneses. João Paulo II também testemunhou a relevância e a grandeza da figura de Wyszyński quando disse: “Não teria havido um Pontífice polaco no trono de Pedro se não fosse pela fé do Card. Wyszyński”.
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