por Paulo Rosenbaum(*) –
O Rei Salomão já sabia, a vaidade é um osso duro. Ela pode se transformar num problema insolúvel, o narcisismo. E diante dos espelhos, aqueles que gozam de poder conseguem os melhores closes, acima dos demais mortais.
É universal, o poder obscurece a crítica. De qual outro modo constatar que cada líder – do síndico de prédio ao presidente — se acha o rei da cocada preta. Os avanços desde a redemocratização – projeto longe de estar consolidado – vão sendo enterrados pela enxurrada de acusações mútuas. Normal a troca de farpas, anormal é levá-la a sério.
A verdade incômoda é que sem FHC não haveria Lula. Sem o plano real não existiria estabilização e sem ela não viveríamos o ciclo atual. Mesmo não sendo tudo isso, parece unanimidade que o país melhorou do ponto de vista econômico. Tomara que a bolha perdure.
Estas duas últimas administrações federais são tão codependente e, de certa forma, integram um projeto de continuidade involuntário. O PSDB pode ter errado e continua errando, agora como oposição. Se houver insistência neste caminho — o desacertada opção em não enfrentar com força a popularidade do lulismo, a oposição terá dias ainda mais difíceis. E o preço desta afasia é que deixa o caminho aberto para grupelhos barulhentos que vociferam, apostando na paralisia do País.
O mérito do artigo de FHC que gerou a reação da presidente foi ter condensado numa única frase o pesado diagnóstico: a gula petista por hegemonia. Não é de agora. Isso vem lá de longe. O velho Brizola já sabia. Todos que acreditaram no partido refundado anunciado por Tarso Genro depois do escândalo do mensalão viram que nem uma só viga subiu. Não foram só as alianças espúrias e o desmantelamento do discurso da ética, que veio junto com a queda livre do hoje incomodo conceito. É a recusa em admitir os erros, seguindo o exemplo do chefe, tornou-se tática coletiva. O notável nessa convicta estratégia mitômana é a desqualificação da autocrítica, um dos poucos métodos para o aperfeiçoamento político.
Há um resultado prático que emerge da guerra insana entre o PSDB e o PT: elas catapultam oportunistas que surfam na perplexidade do eleitorado. O atual líder das pesquisas em São Paulo é uma espécie de prova empírica de que isso é bem real. Há uma crise de credibilidade generalizada que traz o eleitor para a mesma descrença do torcedor quando descobre que o jogador tem um seguro bilionário das pernas. Ninguém mais faz nada pela causa nem sua a camisa por altruísmo. Vamos encarar, essa é uma sociedade de consumo.
O doping não é proibido nas práticas esportivas? Pois o TSE poderia passar a entender marketing e propaganda política, do modo como estão atualmente dispostos, como tentativa de dopar e viciar eleitores. Assessores cochichando qual é a melhor forma de tergiversar, é o ópio infundido. A última palavra em falta de escrúpulos é o uso das mães como laranjas para favorecer os projetos políticos de governadores e ex-ministros. Até a mãe no meio eles colocam! O resultado geral é um ilusionismo, profissionalmente realizado, que destrói a possibilidade do eleitor discernir onde está e mesmo se há qualquer autenticidade nos candidatos.
Precisamos de novidades, não exatamente de caras novas. Aqui e ali esperanças correm por fora e o eleitor, diferentemente dos políticos profissionais, precisa exercer a critica na hora de votar e colocar mais exigência em suas escolhas. Temos que estudar o catálogo e riscar os supérfluos do menu. Vai sobrar quase nada.
Como estamos em uma sociedade segmentada e ainda não temos o voto distrital temos que nos contentar com segmentação dos votos. Cada um deve escolher candidatos de acordo com preocupações locais e que afetam diretamente sua comunidade. Alguém que transita entre literatura e medicina, por exemplo, escolheria prefeitos e vereadores que se preocupassem com a saúde das cidades. Isso é, que se propusessem junto com a população e demais partidos, torná-las mais habitáveis e acolhedoras. Claro que isso passaria pelos temas do meio ambiente e cultura, além das propostas práticas e criativas para dar ênfase a atenção primária à saúde incluindo técnicas e práticas integrativas (o que excluiria de cara os candidatos que querem solucionar tudo com hospitais).
Se quiser amadurecer a democracia, diferentemente dos bons vinhos, precisa ser agitada, exposta às intempéries e até mesmo surrada. Sem isso, vai para o vinagre.
Prefiro a utopia branda de John Lennon. Imaginem se funciona!
(*)Paulo Rosenbaum é médico e escritor. É autor de “A Verdade Lançada ao Solo” (Ed. Record)
Fonte: Pletz
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